Um disco indispensável: Caravanas - Chico Buarque (Biscoito Fino, 2017)

Havia cinco anos que o nosso querido e amado compositor, dono das mais belas canções que já foram feitas no decorrer da história da música popular brasileira, e dono dos olhos azuis-esverdeados mais encantadores que já se existiu, fez sua última turnê promovendo seu último álbum lançado em maio de 2011, intitulado Chico, seu segundo trabalho para a Biscoito Fino, e depois ficou-se na expectativa um álbum de inéditas do velho Francisco, como é chamado volta-e-meia. É óbvio que no decorrer dos anos de 2012, 2014 e também de 2016 o nosso poeta querido estava envolvido de forma política, mas vamos deixar de lado as ideologias e manter o foco nesta análise sobre o Chico Buarque que todos preferem: o artista, o compositor, o gênio, o mito vivo da nossa MPB. E ainda teve o prazer de ter escrito em 2013 um livro sobre um irmão que o seu pai, o historiador Sérgio Buarque de Hollanda (1902-1982) escondeu durante um período quando morou na Alemanha, este livro chama-se O Irmão Alemão, e gerou enormes controvérsias sobre ter feito uma biografia, inclusive foi respondido através do escritor e biógrafo Ruy Castro, um dos autores que mas falou sobre a bossa nova, Garrincha, Carmen Miranda entre outros temas, inclusive sobre um perfil do Rio de Janeiro em especial. Mas, quanto ao disco novo, ele respondia que às vezes tinha tempo pra poder escrever algo novo, mesmo que fosse raro ele dar uma declaração dessas em plena década de 2010, uma vez que ele já estava mais para a literatura do que para a música. Porém, quando ele dá essas raras declarações, é óbvio que: 1 - ele está sempre com alguma coisinha nova para um material novo, 2 - a rotina de compositor dele não é mais a mesma de sempre já fazem uns 30 anos, 3 - Chico não vive mais totalmente na pressão de poder lançar coisas novas o tempo todo. Então é assim, os mestres da MPB estão acostumados desde muito tempo a lançar trabalho novo sem pressa, o muito que eles fizeram já está no passado - ali nos 50, 60, 70, 80 e por aí vai. Mas, na manhã do 28 de julho deste 2017, eis que surge uma novidade: um single! Uma música nova, os céus iluminaram nós, Chicólatras, que estávamos abençoados com sua canção intitulada Tua Cantiga, que o colocou em mais uma nova polêmica novamente - mas não envolve o fato de ele ser contra o governo de Michel Temer, e sim envolvendo machismo: num verso que será citado a seguir "larga mulher e filhos para seguir a amante" não foi visto pelas fãs com bons olhos, mas passou batido a polêmica. O novo trabalho do cantor e compositor carioca lançado no dia 25 de agosto, intitulado Caravanas, tem 7 das 9 faixas inéditas, segue com os arranjos e a direção musical de Luiz Cláudio Ramos mais a produção de seu velho parceiro Vinícius França, com quem trabalha desde o final da década de 1980. E o resultado não seria diferente, mostra um Chico afinado poeticamente e musicalmente, sem perder sua aura criativa nas canções ao decorrer das faixas - algumas feitas em outros projetos, outras novinhas recém-saídas do forninho (segura esse aí, Giovanna) que, se fosse pra dar nota, eu daria 1000 porque 10 pra mim é pouco.
Quando inicia-se o disco, você já sente que Tua Cantiga - feita com o pianista e ex-diretor musical entre 1984 e 1989 Cristóvão Bastos - é um tema de primor original, mostra o Chico que muitos amam dos versos e da voz: esqueça a polêmica que girou em torno da canção, apenas sinta essa energia que flui das melodias, que mesmo parecendo um jazz mais à brasileira, dão totalmente pro gasto; na sequência, temos aqui o tema Blues Para Bia, bem agradável para os ouvidos dos fãs - sem decepcionar a gente, como sempre, e também mostrando que mr. Buarque nunca deixou sua veia poética das canções morrerem nem depois dos 70 anos (agora ele tem 73); e como em seus últimos trabalhos, ele têm revivido alguma coisa que fez para teatros e balés, aqui ele traz uma parceria sua com o (quase) onipresente Edu Lobo, e é A Moça do Sonho, feita para o espetáculo de balé Cambaio (2001) de Adriana e João Falcão, e o arranjo desta música mantêm o equilíbrio no decorrer deste álbum; e mais uma vez, uma de suas maiores paixões segue a ser poetizado em suas canções, o futebol, e a pegada de sambinha em Jogo de Bola traz uma narrativa sobre uma partida com diversos termos do esporte e também referência ao húngaro Ferenc Puskas (1924-2007), que em 1954 chegou a ser campeão pelo seu país no Mundial na Suíça, uma vez que Pelé, Pagão e Garrincha já haviam sido reverenciados em um tema feito lá em 1989; no meio deste álbum, há um momento família, começando logo em Massarandupió, aonde divide a parceria com Chico Brown, seu neto e filho de Helena Buarque com o músico, percussionista e compositor Carlinhos Brown, e com um belo conjunto de cordas acompanhando mais outro tema que aqui se destaca e muito no repertório destas Caravanas do carioca paulista que voltou com tudo mesmo; mais em diante, outro tema que foi revisitado e ganho uma roupagem totalmente nova foi Dueto, que ele havia gravado no disco de Nara Leão (1942-1989) onde ela homenageava o amigo em Com Açúcar, Com Afeto (1980), e nesta versão de quase 40 anos depois, a voz feminina é de sua neta, também filha de Helena e de Brown, Clara Buarque: não passa batido e ganha um enorme destaque no repertório do álbum em geral e ainda têm citações a redes sociais, e eu confesso que ri do Chico falando do Google, do Facebook, Whatsapp e Orkut e Telegram, algo meio surpreendente pra um cara meio discreto quanto a isso; e aqui na próxima faixa já entra uma pegada mais romântica e caribenha, um Chico cantando em espanhol na latinizante Casualmente, e num espanhol perfeito, acompanhado por uma melodia de bolero, que lembra um pouco as canções de Cuba e do resto do Caribe em geral, aqui a parceria é dele com Jorge Helder, seu baixista, e o resultado é totalmente incrível de verdade; ainda sobra tempo para outras pérolas maravilhosas vindo deste homão da coisa toda que amamos de paixão, e os acordes do piano nos dão a orientação para a suavidade de Desaforos, aonde ele se declara ser "apenas um mulato que toca boleros" numa bossa com a pegada caribenha da faixa anterior que ganha uma atenção total da gente e chega a citar uma canção de 1969 do grupo Os Incríveis "Um vagabundo como eu" no meio da canção - quem entendeu a referência, beleza; o encerramento do disco aqui fica com uma faixa que une ele com a nova geração da música popular brasileira, e nós estamos falando de Rafael Mike - membro do conjunto de rappers/funkeiros e bailarinos Dream Team do Passinho - dividindo os vocais em As Caravanas, um tema que ganha nossos ouvidos, com suas referências geográficas e tudo mais, encerrando com chave de ouro esta obra de arte brilhante do nosso mestre Chico, que é como o vinho: quanto mais duradouro, melhor.
Set do disco:
1 - Tua Cantiga (Chico Buarque/Cristóvão Bastos)
2 - Blues Para Bia (Chico Buarque)
3 - A Moça do Sonho (Chico Buarque/Edu Lobo) 
4 - Jogo de Bola (Chico Buarque)
5 - Massarandupió (Chico Buarque/Chico Brown) - participação de Chico Brown
6 - Dueto (Chico Buarque) - participação de Clara Buarque
7 - Casualmente (Chico Buarque)
8 - Desaforos (Chico Buarque)
9 - As Caravanas (Chico Buarque) - participação de Rafael Mike

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