Revolver - The Beatles (Parlophone Records, 1966)

O ano de 1965 foi excelente demais para os Beatles, que começou com as gravações do filme Help! com cenas na Áustria e até mesmo nas Bahamas, o único país caribenho a receber a banda. Com as filmagens, também veio o álbum, com um repertório que agradou a muitos, diferente do filme, embora sendo colorido e com um pouco mais de destaque para a atuação de Ringo Starr, acabou não deixando de agradar os fãs. Dias depois da estreia do filme, um dos shows mais importantes na carreira da bamda e que ajudou a inovar no universo do showbusiness: o concerto no Shea Stadium na cidade de New York, em 14 de agosto de 1965 com uma plateia que varia de 55 mil a mais de 100 mil presentes - até hoje um dos momentos mais importantes do rock ajudando a construir o conceito de rock de arena que conhecemos até hoje. Eles ainda encontram-se com o grande Elvis Presley (à época, mais dedicado ao cinema) na sua mansão em Memphis, a famosa Graceland, mas nada registrado em imagem e som para nossa tristeza. Voltam aos estúdios com as mentes mais abertas para poderem experimentar o que quiserem com a ajuda do produtor e arranjador George Martin, ajudando eles nessa liberdade que foi além do que já haviam feito. E eles conseguiram fechar o ano de 1965 lançando aquele que se tornaria um dos álbuns mais inovadores e diferentes da carreira do grupo até então, com influências do folk, da música grega e da indiana, além de alguma coisa de bossa nova, o clássico Rubber Soul entrou para a história como um dos marcos da revolução sonora que seria propagada nos quatro anos seguintes. Movidos não somente a maconha, mas agora também pelo LSD, o quarteto de Liverpool foi com tudo em seu sexto álbum, e canções como Nowhere Man, In My Life, Michelle e até mesmo Girl provaram até onde a banda iria com suas novidades. Tanto que, quando o disco foi lançado, quem se surpreendeu mais ainda foi Brian Wilson, dos Beach Boys, que viajou nas ideias para poder compor um álbum tão rico musicalmente e poeticamente - assim surgiu a magnum opus Pet Sounds, lançado em maio de 1966, no meio de uma série de shows que John, George, Ringo e Paul estavam fazendo. O problema é que, se 1965 eles colheram os louros nos dois álbuns, em 1966 eles se situaram no olho do furacão em meio a tantas polêmicas. Em uma entrevista que estava fazendo para um jornalista, John Lennon soltou uma de suas declarações infelizes, na qual dizia que o cristianismo iria acabar e que os Beatles estavam mais populares que Jesus Cristo naquele momento, na Inglaterra não pegou a muitos, mas na América houve um furor e na última tournée da banda, eles mal sabiam o que estavam esperando. Com seu sétimo álbum já pronto, a banda seguiu estrada e fizeram shows no Japão, nas Filipinas - onde vivenciaram horas de tensão porque não estiveram em um encontro com o presidente Ferdinand Marcos, e nos EUA houve protestos contra a banda devido a polêmica de Lennon sobre a comparação. Foi preciso que um DJ de rádio chamado Tommy Charles incentivasse fãs a jogarem fora tudo que fosse da banda para que eles vissem em cada lugar durante os shows a reprovação dos estadunidenses com aquele circo armado. Houve até atentado da Ku Klux Klan em uma das apresentações no Tennessee, mais precisamente na cidade de Memphis, e encerraram a série de shows em 29 de agosto de 1966 no Candlestick Park, em San Francisco e dali um período de descanso da banda.
Ok, mas e o tal do sétimo álbum da banda? Pois bem, o sucessor de Rubber Soul acabou sendo um dos mais experimentais e psicodélicos trabalhos até junho de 1967. Levando o nome de Revolver, neste álbum a banda foi muito além mesmo do som que muitos estavam acostumados, e é a entrada definitiva do grupo na psicodelia. Com total liberdade para fazerem o som que quisessem nos estúdios Abbey Road, e tendo George Martin cuidando de tudo na produção e arranjos, eles juntaram sopros, cordas, efeitos e elementos de canções mais de marcha até a sonoridade indiana presente novamente aqui. Com uma das capas mais brilhantes da discografia, feita por um velho conhecido da banda dos tempos de Hamburgo, o artista plástico alemão Klaus Voorman, onde junta desenhos com imagens da banda numa colagem bem feita, e na contracapa uma imagem em preto-e-branco dos quatro rindo e todos usando óculos, clicados por Robert Whitaker, fotógrafo amigo deles. Vamos agora às faixas, a começar por uma contagem "One, two, three, four, one, two..." coml se as sessões fossem começar, e é assim que abre Taxman, composto e cantado por Harrison, fazia uma crítica aos altos impostos pagos pelos ingleses e com uma pegada bem hard rock, tem um solo que arrepia a gente só de ouvirmos de cara; já em seguida, uma história triste contada por Paul nos versos de Eleanor Rigby, uma jovem morta em uma igreja, com os quatro cantando no refrão e mais: a única faixa sem a banda tocando, pois são acompanhados por um octeto de cordas, o que faz parecer uma canção mais tradicional, clássica e que nos emociona por carregar uma tristeza a cada verso; como havíamos dito que nas faixas seguintes a banda estava super influenciada pelas drogas, a próxima canção I'm Only Sleeping parece falar sobre os efeitos do LSD, e com uma levada folk viajandona, não faz feio aqui não com uma dose ácida de psicodelia na sonoridade; ainda no lado A deste álbum nós temos mais um tema de George totalmente influenciado pela cultura hindu e pela música da Índia, em especial de Ravi Shankar, na faixa Love You To, que parece ser feita para animar nosso estado de espírito e nos conectando com a paz e a harmonia que desejamos, e uma parte instrumental que não faz feio, onde tabla e cítara mostram atingirem o nirvana de vez; em seguida uma suavidade na balada de Paul que marca presença neste álbum, Here, There and Everywhere - uma de suas melhores composições na banda, e a predileta dele, de Lennon e de Martin inclusive; na sequência um tema da dupla Lennon & McCartney feita para Ringo gravar, uma pegada infantil e psicodélica, a viagem sonora atinge um dos seus extremos em Yellow Submarine, com uma pegada totalmente de banda tradicional, com sons de bolhas soprando, motores, coro e teve presença de um Rolling Stone, o guitarrista Brian Jones e a namorada Marianne Faithful, além de Mal Evans, o motorista do conjunto Alf Bicknell, o engenheiro Geoff Emerick, o gerente de tournée Neil Aspinall, o empresário Brian Epstein e o produtor George Martin no coro do refrão da música que levou o nome de um filme animado envolvendo a banda dois anos adiante; na próxima música do álbum e que fecha o lado A, teria surgido de um diálogo entre John Lennon e o ator Peter Fonda durante uma viagem de LSD que levou o nome de She Said, She Said - uma das únicas músicas sem Paul nos baixos e vocais, uma vez que se desentendeu com John no estúdio e o baixo foi tocado por Harrison, que canta com Lennon, ambos os dois vindos a falecerem depois, um verso que diz "I know what is like to be dead" (Eu sei como é estar morto - tradução livre) com uma dose bem ácida nas guitarras quando escutamos; e abrindo o lado B deste álbum com um tema de atmosfera mais pop e vibrante, e em Good Day Sunshine ainda tinha aquele tom das canções mais influenciadas pelo blues, mas também pelo doo-wop, ao ouvirmos a melodia do piano que se destaca na faixa; e como a mente dos Beatles estava borbulhando de ideias, era provável que nós poderíamos ler nas entrelinhas algo relacionado às drogas, como no caso de And Your Bird Can Sing, que anos depois Lennon veio a ver com outros ouvidos esta música, com um solo duplo de guitarra que dá o tom e se destaca; em seguida, um tema que distancia do peso sonoro e das guitarras, recheado de suavidade no arranjo, For No One tem um solo de trompa e não conta nem com Lennon e nem com Harrison onde somente Paul canta sobre um amor que vai acabando, mas continua tendo uma esperança que se perde também; na época em que iniciaram a série de consumo de LSD, eles não notaram que muitos iam descobrir referências sobre a droga e uma destas canções que falava também disto era Doctor Robert, que se apontava para um dentista que colocou o ácido nos cafés de Lennon, Harrison e sua esposa Pattie Boyd e que John falava muito sobre ele ao longo da música; para fechar a cota de canções do Beatle quieto, temos aqui um de seus melhores temas já feitos na banda, I Want to Tell You, na qual ele fala sobre essa sensação de tentarmos nos expressar e se comunicar de certas coisas através de palavras, e George acertou em cheio na canção como podemos notar; e como temos mais uma música que surge por aqui, Got to Get You Into My Life, onde Paul supostamente estaria falando da sensação que é consumir a erva com uma base sonora que tem o acompanhamento luxuoso de metais, fazendo uma referência à soul music dos EUA - um belo arranjo neste álbum por sinal; e o encerramento desta grande viagem sonora maravilhosa fica por conta de um tema ousado, viajandão e experimental - falo de Tomorrow Never Knows, inicialmente chamada de Mark I e também de The Void, aqui Lennon mostra sua voz totalmente chapada e com a bateria de Ringo totalmente repetida em loop, juntamente de sons de gaivotas e uma guitarra alucinante fazem esta música parecer a pioneira da música eletrônica - Kraftwerk e Hancock ainda nem pensavam nesse troço antes, imaginem só. 
Para concluir esta resenha, se o grupo conseguiu atingir os extremos dentro do estúdio criando coisas impressionantes, damos os parabéns para eles, não somente na inovação sonora, mas também na forma como conseguiram criar algo tão original e revolucionário como este disco. É claro que só conseguiram mesmo atingir os limites, com um álbum superproduzido e totalmente mais inovador ainda com Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band, em junho de 1967, mas isto já é uma outra história. E, óbvio que Revolver não poderia ficar de fora de muitas listas, a Rolling Stone deu o 4° lugar na lista dos 500 Melhores Álbuns de Todos os Tempos e também marcam presença na dos 1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer, provando ser uma eterna viagem sonora daqueles quatro rapazes de Liverpool. 
Set do disco:
1 - Taxman (George Harrison)
2 - Eleanor Rigby (John Lennon/Paul McCartney)
3 -  I'm Only Sleeping (John Lennon/Paul McCartney)
4 - Love You To (George Harrison)
5 - Here, There and Everywhere (John Lennon/Paul McCartney)
6 - Yellow Submarine (John Lennon/Paul McCartney)
7 - She Said, She Said (John Lennon/Paul McCartney)
8 - Good Day Sunshine (John Lennon/Paul McCartney)
9 -  And Your Bird Can Sing (John Lennon/Paul McCartney)
10 - For No One (John Lennon/Paul McCartney)
11 - Doctor Robert (John Lennon/Paul McCartney)
12 - I Want to Tell You (George Harrison)
13 - Got to Get You Into My Life (John Lennon/Paul McCartney)
14 - Tomorrow Never Knows (John Lennon/Paul McCartney)

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