Um disco indispensável: Durazno Sangrado - Invisible (CBS Discos, 1975)

Em 1975 o rock era visto como coisa de outro planeta mesmo, pra definir bem o que se passava no cenário roqueiro daquela época e bandas aconteciam, canções dominavam o grandioso Top 100 e apareciam em programas televisivos, apareciam com imenso destaque nos cadernos de cultura em jornais e revistas de música, dando assim mais popularidade a cantores e grupos naquela época. E naquele ano, muitos discos fizeram a cabeça da galera, inclusive foi o ano em que saíram apenas discos bons. O rock argentino também estava em alta naquela época, com os grupos Vox Dei, Alma y Vida, Crucis, Polifemo, Pappo's Blues, Sui Generis e o Invisible dando sopa no circuito roqueiro argentino da época, ainda que o governo argentino estava num poder equilibrado, devido à rejeição dos militares pela gestão de Isabelita Perón no poder naquela época e no ano seguinte, perderia o poder devido a um golpe militar. As bandas estavam tentando driblar a censura por letras consideradas controversas, ousadas e que mostravam ser contra o governo e suas leis rígidas naquela época e muitos lutavam por mais liberdade de expressão que foi tirada de muitos jornalistas, artistas e escritores, além de cineastas e produtores de TV que tiveram ideias rejeitadas e alguns não se calaram, quanto outros foram presos, torturados e mortos ou mandaram desaparecer pra sempre do país, o que originou o movimento de mães e avós em busca de informações de seus entes queridos, o Madres De la Plaza de Mayo, até hoje na ativa todos os anos sempre buscando respostas pelos seus filhos e netos desaparecidos e/ou mortos. Além de muitos músicos terem sido alvos de críticas duras sobre seus trabalhos, alguns seguiram fazendo seu trabalho mesmo que estivessem sempre se aperfeiçoando a cada ano ou cada vez que lançavam um material, alguns críticos mais atuais naquela época davam valor até, quanto outros torciam o nariz para aquela geração e dando valor ao que era original e made in Argentina, como os grandes Astor Piazzolla (1921-1992), Mercedes Sosa (1935-2009) dentre outros, adeptos do cancioneiro do folclore e representantes do estilo.
Pomo Lorenzo, Machi Rufino e Luis Alberto Spinetta
(da esquerda para a direita): o trio Invisible em 1974
O Invisible, terceiro grupo que Luis Alberto Spinetta havia formado (leia o texto do primeiro disco aqui), estava num ótimo momento para o rock argentino, aonde discos tinham um repertório mirabolantes, cheios de arranjos maravilhosos e que mostram o perfeccionismo do rock nos anos 70 na época, com um pouco do progressivo e do fusion, além de blues e das bandas de hard rock, o mesmo tipo que se originou o punk rock e o heavy metal. Com Héctor "Pomo" Lorenzo na bateria e Carlos Alberto "Machi" Rufino na bateria, Spinetta sempre esteve bem acompanhado ao longo de sua carreira, e com estes dois formando uma bela cozinha musical não fez feio durante o período de quase três anos aonde se resultou em três discos, se separando quando já estavam em picos máximos de sua popularidade no começo do ano de 1977. A banda já se reuniu em 2009 para o lendário show especial Spinetta Y Las Bandas Eternas para tocarem 5 músicas, uma delas, do álbum que será falado neste blog e com temas inspirados em artes milenares orientais.
Logotipo que estampava o cartaz de divulgação do álbum
O segundo álbum do Invisible, Durazno Sangrando, lançado originalmente em setembro de 1975 e apresentado meses depois no Teatro Coliseo em Buenos Aires, têm como inspiração principal o livro tradicional chinês O Segredo da Flor de Ouro, livro taoísta sobre meditação e que foi difundida por Richard Wilhelm e Carl Gustav Jung no ocidente e uma das leituras de "Flaco". Há lendas aonde afirmam de que as músicas do álbum foram feitas em Capilla Del Monte, uma cidade da província de Córdoba, com base nas lendas daquela região. A faixa de abertura é Encandenando Al Ànima, uma atmosfera sonora de duas partes e completa com 15 minutos e 35 segundos de duração, com um poema do pai Luis Santiago Spinetta, músico de tango renomado, e com base nas teorias taoístas de vida e morte, destacamos também os solos de baixo de Machi Rufino, um dos melhores baixistas argentinos; a faixa a seguir é Durazno Sangrando, uma das melhores composições feitas por Luis Alberto Spinetta durante toda sua carreira, aonde o violão e levadas de pratos reinam na base soando bem acústica e que ainda carrega um solo de guitarra, além de mostrar versos, que se forem buscar melhor cada significado, estão muito relacionados ao taoísmo; na sequência tem o tema Pleamar de Aguilas, já bem aproximando com a levada acústica da faixa anterior, já com mais ritmo e também versos repletos de pura poesia "Lejos de aquí, atrás del mar donde la materia es luz y nada más" (longe daqui, atrás do mar onde a matéria é luz e nada mais - tradução livre); na sequência a música En Una Playa Lejana Del Ánimus, com aproximadamente 10 minutos e uma base instrumental impressionante com uma sequência rítmica sonora e aonde na parte final da música, a levada vai soando de uma forma tão desconstrutiva, que é como se fosse voltar ao começo de um simples jogo de tabuleiro; a última faixa tem uma pegada mais acelerada de progressivo, notando bem os acordes de Dios de Adolescencia, que já mostra também uma das melhores canções feitas pelo "Flaco" Spinetta e uma das melhores canções de Invisible. A capa do álbum foi concebida pelo fotógrafo e amigo de Luis Alberto, Eduardo Martí, com quem manteve amizade desde esse período, e autor do cartaz que promovia o álbum, censurado na cidade de Rosario pelo simples fato da imagem de um pêssego aberto pela metade parecer uma vagina sangrando, além desta cidade ter obrigado a censurarem Elementales Leches do show que foi realizado na época de seu lançamento. Atualmente, é um dos mais cultuados álbuns da banda e desta fase dos anos 70 de Spinetta, além de ter sido muito reverenciado por músicos grandiososos tanto na Argentina quanto fora do país e até pela crítica especializada em rock progressivo e rock latino dos anos 70.
Set do disco:
1 - Encandenando Al Ánima* (Luis Alberto Spinetta/Carlos Alberto "Machi" Rufino/Héctor "Pomo" Lorenzo)

2 - Durazno Sangrando (Luis Alberto Spinetta/Carlos Alberto "Machi" Rufino/Héctor "Pomo" Lorenzo)
3 - Pleamar de Aguilas (Luis Alberto Spinetta/Carlos Alberto "Machi" Rufino/Héctor "Pomo" Lorenzo)
4 - En Una Lejana Playa del Ánimus (Luis Alberto Spinetta/Carlos Alberto "Machi" Rufino/Héctor "Pomo" Lorenzo)
5 - Dios de Adolescencia (Luis Alberto Spinetta/Carlos Alberto "Machi" Rufino/Héctor "Pomo" Lorenzo)

*a segunda parte da música conta com um poema de Luis Santiago Spinetta, pai de Luis Alberto

Comentários

Mais vistos no blog