Um disco indispensável: Blue Train - John Coltrane (Blue Note Records,1958)

Não é preciso esquecer do enorme papel de John Coltrane enquanto saxofonista da banda de Miles Davis não, e não é difícil esquecer que ele teve um momento brilhante em sua carreira. Sim, o lendário saxofonista tenor teve atuado de meados de 1940 até sua morte em 1967 gravando discos considerados épicos. Filho de um alfaiate, o pequeno John William Coltrane cresceu no meio musical familiar, o pai tocava violino e ukulele e sua mãe cantava no coral da igreja, no colegial aprendeu a tocar clarinete mas sua paixão foi mesmo pelo sax alto após ouvir Johnny Hodgres na banda de Duke Ellington, e na adolescência perdeu seu pai, seus avós e tios no intervalo de um mês, sua mãe mais uma tia e um primo se mandaram para a Filadélfia e o próprio John teve que sobreviver trabalhando em uma refinaria de açúcar e nesse meio-tempo ele acabou cursando por um ano a Ornstein School of Music e em breve foi servir como militar no Havaí, voltando em um ano já. E com isso, conquistou o prestígio e a admiração do público o rapaz que tocava saxofone em bares e clubes da Filadélfia, o músico fazia de tudo para sobreviver e acabou caindo na heroína como muitos músicos da época. Coltrane desenvolveu um estilo de tocar jazz que acabou influenciando músicos e depois viria a se tornar notoriamente o free jazz e também falando do modal jazz, e passando por grupos de músicos como Dizzy Gillespie, Earl Bostic, ele viria a ser procurado por um pioneiro da linguagem jazzística para participar de seu quinteto, este era Miles Davis, que tinha recém se recuperado de seu vício em heroína e estava se recuperando fazendo um show no Newport Jazz, e esse novo conjunto teria além de Coltrane - que trocou o alto pelo tenor muito tempo antes, teria também o baterista Philly Joe Jones, o pianista Red Garland e o contrabaixista Paul Chambers e com este conjunto fizeram o tal show em 1955 e dali em diante viriam materiais como 'Round About Midnigt, Milestones e também o aclamado e sempre lembrado Kind of Blue, mas aí já é muita coisa pra falar. Nesse mesmo período, Coltrane preparava materiais como líder e decidira publicar seu primeiro material solo pela Prestige Records intitulado Coltrane, que contou com colegas da banda de Miles como o próprio Chambers e Garland além do trompetista Johnnie Splawn e também o baterista Albert "Tootie" Heath, velhos conhecidos da cena de Filadélfia deram uma canja em seu primeiro álbum individual lançado em fins daquele 1957 cujas sessões nos estúdios de Rudy Van Gelder ainda renderam sessões para outro disco que falaremos neste post.
John Coltrane em estúdio, meados de 1957. A foto da capa.
(Francis Wolff/Acervo Blue Note Records)
Em 1958 era lançado seu segundo trabalho solo, intitulado Blue Train, mas diferente do seu disco de estreia, aqui o músico conseguiu realizar em termos de música algo considerado grandioso que contribuíra para seu legado no jazz e na música, ao mesmo tempo em que era substituído por Sonny Rollins na banda de Miles e sendo obrigado a parar devido a problemas com drogas. Com os estúdios de Van Gelder à sua disposição e Albert Lion produzindo o disco, o que Coltrane gravou junto de Chambers, Jones, o trombonista Curtis Fuller mais o pianista Kenny Drew e o trompetista Lee Morgan o acompanharam nas sessões de Blue Train, que por pouco não foi lançado porque o gato de estimação do dono da Blue Note havia fugido e na época estava atuando como sideman também de Thelonious Monk, o problema é que ele jamais assinou contrato com o selo mesmo assim. O clique presente na capa do disco foi feita por Francis Wolff, que fez uma sessão fotográfica com o saxofonista, que estava em um tom pensativo, como se estivesse registrando o momento em que tivesse uma grande ideia aportando em sua mente, e virou uma das mais icônicas fotos de Coltrane que se conhece. Já o artista Reid Miles só tingiu de tons azuis e acrescentou o letreiro com o nome do disco em branco, o nome do artista em verde e o do selo em cinza, mantendo a fórmula de como os discos da Blue Note atraem o público com seu design mais sofisticado e eram o algo mais e por isso elas eram antológicas. Falando aqui do disco, cujas canções têm durações que passam dos 7 até os 10 minutos que acabam se tornando os melhores minutos da sua vida, isto é, se você tiver paciência para ouvir jazz. A começar falando sobre o disco aqui, vamos pela faixa que leva o nome deste, ou seja, Blue Train é aquela faixa que te dá um guia pelo universo das improvisações sonoras que fazem parte do álbum em mais de 10 minutos, e o que o quinteto de Coltrane faz é incrível, faz a gente viajar a um universo paralelo a cada acorde e não deixa nenhum momento ser desperdiçado; enquanto na faixa seguinte, intitulada Moment's Notice, carregada de solos expressivos, pode ser um momento em que o sax de Coltrane pinta e borda belas melodias que complementem todo esse bailado do disco e peguem bem o trompete de Morgan fazendo um solo que deixe-nos hipnotizar pelo som; e logo em seguida, temos aqui Locomotion, onde aqui um uptempo, algo bem mais acelerado e mais chacoalhante, e a cozinha acaba dando um resultado melhor do que se imagina e se for pedir demais, note que não há uma falha durante toda a canção; e como todo e qualquer disco de jazz que se preze, sempre há uma recriação moderna e diferente para standards, e com o tema I'm Old Fashioned, o improviso em cima desta música de Jerome Kern e Johnny Mercer, o grande momento aqui fica com o piano cristalino de Kenny Drew, que juntamente do saxofonista, proporciona uma experiencia sem igual neste blues de 12 compassos que faz parte do repertório deste trabalho; e o disco fecha de vez com a pérola Lazy Bird, que encerra este ciclo definitivo que complementa enfim o disco, com uma sutileza sem igual e mantendo toda a energia que o grupo conseguiu captar com John Coltrane dentro daquela que se tornou sua mais bela obra de arte da música, e o músico acabaria sendo também responsável brevemente por outros discos como Giant Steps (1960) pela Atlantic Records e pelo insuperável A Love Supreme (1965) deixando materiais vastosos e inéditos para o público até hoje.
Set do disco:
1 - Blue Train (John Coltrane)
2 - Moment's Notice (John Coltrane)
3 - Locomotion (John Coltrane)
4 - I'm Old Fashioned (Jerome David Kern/Johnny Mercer)
5 - Lazy Bird (John Coltrane)
FAIXAS BÔNUS DA EDIÇÃO REMASTERIZADA DE 1997/2003:
6 - Blue Train (John Coltrane) - take alternativo
7 -  Lazy Bird (John Coltrane) - take alternativo

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