Um disco indispensável: Kind of Blue - Miles Davis (Columbia, 1959)

No final dos anos 1950, o trompetista norte-americano Miles Davis tornara-se um exemplo de inovação para o jazz, e um dos mais respeitados nomes da música até hoje após 25 anos de sua morte e seu legado continua vivo, e isso é muito notável em sua discografia, desde registros que mostrem seus primórdios, ainda por volta dos anos 1940, e sendo pioneiro do som que manteria o jazz mais universal do que nunca, e sendo apreciado por gerações até hoje. Miles já tinha feito dos bebops compostos no final dos anos 1940 excelentes peças de arte jazzística, aprendeu com o lendário Elwood Buchanan o método de nunca usar vibrato nos seus sons executados em seu trompete, instrumento que Miles Dewey Davis III ganhara de seu pai na adolescência, embora sua mãe preferisse que ele aprendesse a tocar piano, já que ele era um excelente pianista de jazz e foi assistido por um de seus ídolos, o lendário Clark Terry, que o observou e relembrou um fato importante: que o jovem e ainda desconhecido Miles tremia toda vez que errava uma nota. E isso ficou como uma lição para toda a vida, e conseguiu fazer de seu estilo uma definição, gravando nesse período do final da década de 40 até o comecinho dos 50 pela Capitol um conjunto de singles, reunidos pela primeira vez em Birth of the Cool sete anos depois, e mais adiante, nos anos de 1950 a 1955 gravou materiais pela Prestige e também pela gravadora Blue Note Records, porém acabou completamente viciado em heroína e ficou trancafiado por doze dias no quarto da farmácia de seu pai e conseguiu dar a volta por cima em 1955 no lendário e clássico Newport Jazz Festival, realizado ainda nos dias de hoje. Ele tocou no show uma versão impressionante de 'Round Midnight, de Thelonous Monk e acabou agradando uma pessoa muito especial, George Avakian, que o levou para assinar com a Columbia, onde ficou por 30 anos e criara para acompanha rum sexteto acompanhado de um time de músicos, como Red Garland ao piano, o lendário John Coltrane no saxofone, Paul Chambers no contrabaixo, Philly Joe Jones na bateria e com essa formação fizeram o disco 'Round About Midnight, que iniciava a fase áurea do trompetista na casa.Foi naquela época estava tendo também uma parceria com o lendário Gil Evans, que rendeu discos como Miles Ahead (1957), Porgy and Bess (1958), Sketches of Spain (1960) e Quiet Nights (1963) - este último com um tom bem bossa nova e que fechou a parceria entre ambos depois. 
Da esquerda para a direita: John Coltrane, Julian "Cannonball" Adderley, Miles Davis
e Bill Evans ao piano nas gravações de "Kind of Blue" entre março e abril de 1959.
(Divulgação)
Com outros discos já na praça, dentre eles o insubestimável e também grandioso Milestones (1958), onde ele ainda teve inserido um pouco do bebop, do hard bop além do jazz modal e acrescentando para a banda o saxofonista Julian "Cannonball" Adderley para fazer o alto enquanto Coltrane fazia o sax tenor, e com a saída de alguns integrantes da banda após este disco, saía Garland e entrava o brilhante Bill Evans, e as baquetas agora tinham outro dono: Jimmy Cobb. Com essa banda, lógico, tendo também Chambers, Coltrane e Cannonball, o grande e brilhante Miles faria o disco que se tornara seu maior legado no jazz e na música em especial. Esse disco, gravado no período de março e abril de 1959 nos estúdios da Columbia Records, na 30th Street em New York teve um período bom para que o músico conseguisse colocar em estúdio um pouco de ideias fluindo para que Kind of Blue pudesse surgir instantaneamente. Na nota publicada na contracapa do disco, escrita por Bill Evans sobre a improvisação no jazz, e inicia comparando o trabalho dele ao de um artista visual japonês e que o resultado de uma pintura é complexo e cheio de texturas, e isso é o que se pode notar no som concebido por Davis, dando mais rumo à progressão harmônica e a liberdade de poder improvisar em cima das notas, deixando que a cozinha soe como precisa soar. Davis concebeu cada ambientação poucas horas antes das datas de gravação e chegou com vários rabiscos que indicavam definitivamente ao grupo o que deveria ser tocado e eles cumpriram à risca com os códigos de melodias que Miles passara ao conjunto e desse jeito, o lendário músico trouxe algo que fosse mais aproximado do que ele queria apresentar e que fosse muito mais diferente do que se estava esperando, onde Miles permitia uma liberdade nova e completamente cheia de atitude aos parceiros de gravação. No disco, a cozinha que fez parte do disco também teve Wynton Kelly, que gravou uma faixa apenas no lugar de Evans e teve a produção assinada por Irving Townsend e pelo onipresente Teo Macero, responsável pela produção de outros tantos discos de Miles no decorrer de sua passagem pela Columbia nos anos seguintes. Aclamado como um dos maiores discos do jazz, do próprio músico e da música em si, Kind Of Blue, lançado em 17 de agosto de 1959 é considerado um dos momentos mais importantes para o estilo, onde a linguagem deste disco fosse modal e própria ao mesmo tempo.
O álbum começa com a canção que daria o pontapé inical a Kind Of Blue intitulada So What, iniciado por uma sequência melódica feita ao piano e que vai ganhando cores e sons depois de meio-minuto no começo, e tente apenas sentir o ritmo e a suavidade da canção no decorrer dos nove minutos de canção, o baixo de Chambers e os saxofones de Cannonball e Coltrane conseguem construir acordes que nos deixam fascinar e aqui Miles deixa os seus melhores solos de trompete já feito em todos os seus anos na música; já em seguida, temos Freddie Freeloader, um blues de 12 compassos com uma melodia efetiva e uma simplicidade rítimica muito impressionante, se você conseguir notar melhor, aqui temos um desfile de metais fazendo um belo momento de melodias, e desta vez com Wynton Kelly desfilando acordes num piano sensacional - a única faixa em que não temos Evans por aqui, e que nesses quase 10 minutos a liberdade de improvisar em cima das notas soa como um prato cheio para nossos ouvidos degustarem; enquanto na faixa seguinte de nome Blue in Green, com 4 compassos na introdução, nos apresentam a um momento de não perder o rumo, aqui, o que podemos ouvir é uma sequência instrumental que mantenha-se aquela coisa de se libertar para criar melodias indescritíveis e aqui temos o flügelhorn reinando soberanamente em toda a canção, algo mais sofisticado do disco que você pode chegar é esta faixa; nos mais de nove minutos da próxima faixa, aqui notamos muita influência da música espanhola, é claro, com o nome de Flamenco Sketches, você queria mais o quê? Se delicie com a melhor tradução sonora que você pode ter do jazz e de músicas de vários cantos do mundo, não perca tempo e deixe que flua sobre os ouvidos, corações e mentes na primeira escuta de cara; mais em diante, temos All Blues, com seus mais de onze minutos, é um blues de doze compassos concebida em uma série de cinco escalas e com a marcação de 6/8 tempos, que fecha este álbum aqui com os melhores solos de sax e que traz um conjunto de melodias apaixonantes ao piano executadas por Bill Evans, encerrando o disco com chave de ouro e fazendo nos impressionar após a primeira escuta do que pode ser chamada de a magnus opum do jazz e da música contemporânea em especial. O disco ganhou vários méritos e críticas bem positivas, levando-o a figurar em várias listas consideradas importantes, como a dos 500 Maiores Álbuns de Todos os Tempos da revista norte-americana Rolling Stone, na qual figura na 12ª posição, considerando como um dos mais influentes, importantes e populares do gênero, e também aparece na lista definitiva dos 200 álbuns do Rock & Roll Hall of Fame e que também entrou em 2002 no Registro Nacional de Gravações da famosa Biblioteca do Congresso norte-americana, sendo então um dos tantos discos de jazz presentes a figurarem por lá, assim como na lista dos 1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer, provando o quão marcante foi esse disco para os rumos da música naqueles tempos. E nós aqui, da Discos Indispensáveis Para Ouvir, vamos seguindo em frente divulgando e enaltecendo a palavra do jazz e de Miles sempre que for preciso, pois este foi um gênio, um Pelé da música, que conseguiu unir o útil ao agradável e foi um dos mais influentes músicos do século XX e soa presente na música até hoje, apesar de ter morrido há muito tempo, seu som é eterno e moderno para muitos sempre.
Set do disco:
1 - So What (Miles Davis)
2 - Freddie Freeloader (Miles Davis) - com Wynton Kelly ao piano
3 - Blue in Green (Miles Davis/Bill Evans)
4 - Flamenco Sketches (Miles Davis)
5 - All Blues (Miles Davis/Bill Evans)
FAIXA BÔNUS DA REEDIÇÃO EM CD LANÇADA EM 1997:
6 - Flamenco Sketches (Miles Davis) - take alternativo

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