Um disco indispensável: Nevermind - Nirvana (DGC Records/Sub Pop Records, 1991)

Houve uma certa época em que o rock estava meio parado, meio igual, bandas usavam os mesmos estilos e visuais para estarem no mesmo paradigma em que os populares Poison, Bon Jovi e Motley Crue ou você acabava adotando estratégias de fazer algo mais pop como Cyndi Lauper, Madonna, Prince, Michael Jackson e até mesmo a dupla Hall & Oates para que estivesse entre os mais aclamados na década de 1980 até o início dos anos 1990. Mas tudo acabou sofrendo uma inversão de papeis logo no começo pois uma banda acabara invadindo e mudando esse cenário, trazendo de vez o rock alternativo para o mainstream e essa banda se chamava Nirvana, que significa na linguagem religiosa oriental a alta elevação espiritual, banda que surgiu em 1987 na cidade de Aberdeen quando dois rapazes chamados Kurt Donald Cobain (voz e guitarra) e Krist Anthony Novoselic (vocais, baixo e acordeão) se cruzaram durante os ensaios de uma banda muito popular da cena da época chamada Melvins e com Kurt já envolvido em outro projeto chamado Fecal Matter, acabariam se juntando e com Chad Channing na bateria, eles passariam boa parte de 1988 gravando algumas demos até que chegasse um contrato com a gravadora Sub Pop onde lançaram seu primeiro single intitulado Love Buzz, e mais adiante, foram gravar seu primeiro álbum intitulado Bleach, com um orçamento de US$606,17 oferecido por Jason Everman, que aparece como segundo guitarrista nos créditos mesmo sem ter tocado um acorde sequer. Este mesmo trabalho, contou com a produção de um produtor da cena local chamado Jack Endino, que brevemente viria a trabalhar com gente bem conhecida aqui como os Titãs alguns anos depois. E bem antes de estourarem, a banda tinha grande repercussão com a música Sliver em algumas rádios estadunidenses, nada de certo com a Sub Pop: enquanto a banda ia bem, a gravadora passava por dificuldades financeiras e isto levou a abrirem uma parceria com uma subsidiária de uma grande gravadora e foi quando a banda decidira cortar o intermediário e acontece algo imprevisível: no momento em que tudo parecia ficar pra baixo, eis que por várias indicações da baixista Kim Gordon, da banda Sonic Youth - que era cultuada pelos integrantes, a banda decidira partir para uma grande gravadora e esta era a DGC - David Geffen Company, ou também Geffen Records e já com um novo baterista, este que duraria até alguns anos quando um imprevisto acabaria com a banda: um jovem chamado David Eric Grohl, vindo de uma banda punk chamada Scream que impressionou nas audições para baterista substituto. Pronto, por 4 anos, aquela seria a banda que nós víamos a conhecer ao longo dos tempos e que viria a ser uma das mais influentes do rock, e foi com essa mesma formação que foi realizado aquele que viria a ser uma das maiores obras-primas da música contemporânea, dos anos 90, do rock and roll e de todos os tempos: o segundo álbum, intitulado Nevermind, com a produção de Butch Vig, indicado após várias sugestões do antigo selo do Nirvana e que tinha em seu currículo bandas como Killdozer e The Other Kids além de hoje ser o baterista da aclamada banda Garbage brevemente após ter produzido o clássico do Nirvana, um trabalho do qual ele têm um imenso orgulho até hoje por ter produzido.
Dave Grohl, Kurt Cobain e Krist Novoselic em 1993, à época
do álbum "In Utero", o sucessor da obra-prima "Nevermind",
o best-seller da banda Nirvana lançado dois anos antes.
(Divulgação)
As sessões iniciadas ainda em abril de 1990 ainda como contratados da Sub Pop e com o título provisório de Sheep, no Smart Studios, o estúdio de propriedade do próprio Vig em Madison, no Wiscosin e dali o processo seria mais longo do que se imaginava, com algumas canções preparadas ainda e com uma faixa contando com Chad Channing, a única que permaneceu das sessões de Wiscosin e dali partiram para Van Nuys, na Califórnia para que pudessem trabalhar em sessões mais vibrantes e já com Dave Grohl no comando das baquetas, e segundo uma entrevista de Novoselic, ainda que tenham assinado com a Geffen, e tentarem sugerirem outros produtores, a banda ainda queria trabalhar com Vig e assim foi feito. A partir dali, ainda em 1990, com as sessões agora no lendário Sound City, a banda decidira trabalhar em faixas onde houvesse sobreposições nas guitarras, Kurt trabalhava as vozes e os versos das canções muito antes das sessões encerrarem e isso foram rolando até maio e junho de 1991, quando após várias horas de ensaio e gravações onde ainda passaram por várias mudanças nos arranjos. Aí foi preciso surgir o processo de mixagem para que chegassem ao nome de Andy Wallace, que já trabalhara com a banda de thrash metal Slayer no disco Seasons of the Abyss e o trabalho deste acabara sendo aprovado por toda a banda. Já em agosto, com o disco masterizado, no The Mastering Lab por Howie Weinberg, que acabou mexendo em um detalhe que passara despercebido e que depois seria corrigido após Cobain avisá-lo por telefonema, visto muito nas prensagens posteriores que fãs e colecionadores de disco notaram. Em 24 de setembro, estava nas lojas o disco que se converteria na trilha sonora da geração X, e brevemente da música contemporânea do século XX, logo o próprio Nevermind, que estampava na capa a imagem de um bebê nu dentro de uma piscina que seguia uma nota de dólar como isca, e este bebê, que seria identificado como Spencer Elden, marcaria a imagem de uma das mais criativas capas de discos de todos os tempos. Além de termos também um macaco carregando algo nas costas estaria estampando o encarte do disco, que foi clicado por Cobain, creditado como Kurdt Kobain, que também contribuiu muito na arte do material. O disco viria a desbancar meses depois logo de vez Dangerous de um tal Michael Jackson aí que num outro disco rendeu mais de 50 milhões de cópias vendidas e 8 Grammys até logo e colocando o circuito alternativo no mainstream e bandas como Pearl Jam, Soundgarden, Alice in Chains e Mudhoney conquistariam as paradas de rádio e a MTV brevemente, sendo a catapultagem para a cena grunge de Seattle ao resto do mundo definitivamente.
Aproveitando o banho de pisciina feito para
as fotos promoconais do disco, 1991
(Divulgação/DGC Records)
Os acordes de guitarra que abrem o disco e a faixa Smells Like Teen Spirit fazem a gente ter vontade de aumentar o volume num paredão de som e fazer uma roda punk, é aquela canção que contagia totalmente nosso corpo e você sente a batida pesada de Grohl mais os riffs crus de Cobain e o baixo massacrante de Novoselic dão sentido quando você acaba ouvindo a letra, uma espécie de hino para a geração X que flui plenamente moderna nos dias de hoje; ainda podemos notar o excesso de agressividade nas guitarras de In Bloom, que têm um arranjo que dá pro gasto até, destacando-se muito ao longo do disco e com versos que nem parecem algo de uma banda qualquer, lógico; e tendo mais adiante Come As You Are no repertório, aqui fica bem claro onde a banda está cumprindo seu papel, e Kurt sendo ousado em versos como "and I swear, I don't have a gun" (e eu juro que não tenho uma arma) e com uma das mais fáceis introduções de guitarra, esquema de dedilhamento muito fácil até pra baixista se você imaginar; logo na sequência, temos mais peso sonoro por diante na faixa Breed, com refrão gritante, uma virada de bateria que parece ser um motor de carro aumentando a velocidade e que nos impressiona e que no final se desconstrói em questão de segundos o ritmo da música; a aura criativa de Cobain mostra seu ápice também em Lithium, uma letra onde mostra pura bipolaridade total, segundo o que diziam, o próprio sofria desse distúrbio e por isso haviam letras muito difíceis de entender, e tendo a bipolaridade como tema, aqui ganham poucos momentos em que a música grite nos arranjos, chegando a passar despercebido; e ainda temos uma das únicas músicas gravadas ainda em 1990 no Smart Studios que é Polly, entoada ao violão e com Channing tocando pratos logo no refrão, e com versos que fazem pessoas ficarem em dúvida se essa é uma música romântica dor-de cotovelo ou não, uma questão que ainda paira em nossas mentes até hoje; e no ritmo do disco ainda temos Territorial Pissings, uma canção onde você tem a barulheira garantida e críticas massacrantes sobre a forte manipulação da mídia, disputa por terriitórios e uma introudção com uma sacada irônica onde Krist fala algumas coisas como "Come on people now, smile on your brother..." (Venham agora pessoal, sorriam ao seu irmão...) numa das mais curtas canções desse disco; logo mais adiante em Drain You, onde temos corais harmoniosos e o ritmo da batera mantêm-se tribal ao longo da música e uma levada bem chapante antes de encerrar a música, meio shoegaze até com um tom mais ou menos psicodélico e cuja letra fala sobre o amor e de entrega total ao parceir@, seja hétero ou homossexual, a letra faz toda a diferença pra qualquer tipo de relação; ainda temos na sequência Lounge Act, de atmosfera mais ao melhor estilo bota-pra-quebrar, com uma pegada bem de leve que dá pro gasto e um final bem arrebatador, sem que faça perder o primor da sonoridade; e no repertório de Nevermind ainda temos Stay Away, que também é barulheira garantida e um ataque de Cobain a indústria da música, cujo o título seria originalmente Pay to Play (Pague para tocar, em tradução livre) e questionamentos sobre a nossa sociedade e como ela segue um modelo tipo robô "Monkey see, monkey do. I don't know why..." (Macaco vê, macaco faz. Eu não sei porquê... - tradução livre) e um verso que soa autobiográfico "I'd rather be dead than cool" (Eu prefiro estar morto do que popular) e virando uma frase dos últimos capítulos da vida de Cobain anos depois; logo em diante temos uma outra pedrada, nem tão ensurdecedora, que é On A Plain, com vocais bem harmoniosos e um destaque também pra introdução que carrega um feedback de guitarra bem arrepiante até, além do fade instrumental que deixa apenas os vocais se destacando no final da canção parecendo ser algo mais acapella e que fica bem gostoso em canções como esta; o encerramento do disco fica por conta de Something in The Way, que traz um violoncelo bem melódico e que faz , pelo fato de trazer um ar melancólico e desesperançoso e deixando a gente se cortar os pulsos de vez, e após 10 minutos de silêncio, nós contamos com mais barulheira - é a hidden track que só esteve presente em algumas prensagens chamada Endless, Nameless, sendo uma espécie de bis para o disco, que fecha todo esse trabalho brilhante que é Nevermind, o capítulo de uma geração que fez muito barulho ao longo dos tempos.
Brevemente vindo a desbancar os figurões do pop, como Michael Jackson e tendo o videoclipe de Smells Like Teen Spirit como um dos melhores da história e dos mais lembrados da MTV, o power trio de Aberdeen conseguiram sair de um cenário visto como raro para os críticos musicais. Estando em todas as listas sobre os melhores álbuns da década e dando um status de o último grande herói do rock para Kurt Cobain, que viria a se suicidar em 5 de abril de 1994, mas não viu Nevermind figurar em listas como a dos 1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer do jornalista Robert Dimery, e também a célebre lista sempre citada aqui dos 500 Maiores Álbuns de Todos os Tempos da aclamada revista especialista em cultura pop Rolling Stone. É, pra muitos, a barulheira de Nevermind nem parece ter sido de 1991 e soa muito moderna para a gente 25 anos depois de seu lançamento.
Set do disco:
1 - Smells Like Teen Spirit (Kurt Cobain/Krist Novoselic/Dave Grohl)
2 - In Bloom (Kurt Cobain)
3 - Come As You Are (Kurt Cobain)
4 - Breed (Kurt Cobain)
5 - Lithium (Kurt Cobain)
6 - Polly (Kurt Cobain)
7 - Territorial Pissings (Kurt Cobain)
8 - Drain You (Kurt Cobain)
9 - Lounge Act (Kurt Cobain)
10 - Stay Away (Kurt Cobain)
11 - On A Plain (Kurt Cobain)
12 - Something in The Way (Kurt Cobain)/faixa escondida: Endless, Nameless (Kurt Cobain/Krist Novoselic/Dave Grohl)

Comentários

  1. Magnífico esse álbum. Simplesmente a assinatura do grunge, no seu melhor estilo. O ritmo das canções, irreverência das letras e tudo mais fazem deste um trabalho único. Que pena que Kurt tenha ido tão cedo, mas com certeza sua obra deixou muitos admiradores.

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    1. Esse disco é uma bíblia do grunge, basicamente, através deste disco que a cena alternativa ganharia mais força e visão da crítica e do público. É, uma pena mesmo que o Kurt tenha ido tão cedo, mas deixando um legado marcante para o rock.

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