Um disco indispensável: Highway 61 Revisted - Bob Dylan (Columbia Records, 1965)

A estrada, cheia de automóveis e outros transportes passando e devorando asfalto, a mesma que separa o estado de Minnesota até o delta do rio Mississippi, testemunhou muitas cenas, inclusive as várias vezes que um jovem chamado Robert Allen Zimmerman, que fugiu de casa várias vezes e que sempre voltava, inspirou ele a compor músicas que influenciaram uma nova geração de poetas, músicos oriundos do folk, blues, country e do rock também. O disco leva o nome dessa tal estrada mas quanto a Robert Allen Zimmerman, mais fácil seria chamá-lo de Bob Dylan, judeu influenciado pela poesia beatnik e pela linguagem dos cantores de folk surgidos ao longo do século XX e que decidira pôr a viola no saco e tocar a sua própria vida ainda jovem, já tinha um talento para compor mas queria ser ouvido e assim foi. Eis que, já aclamado, com quatro discos lançados, decide mudar tudo, desde o seu estilo de fazer canções até abandonar o violão e conseguiu fazer algo indescritível para muitos, naquele 1965 fervoroso. Vamos, aos poucos, contando o que aconteceu no ano em que ele largaria de fazer canções ao violão e colocar uma guitarra, o que lhes custou várias vaias, críticas negativas e acabou em um acidente motociclístico, rendendo vários boatos de morte, sendo que ele estaria se recuperando em uma casa na região de Woodstock, no estado de New York com a mulher e os filhos recém-nascidos, mas aí já é outra história. No decorrer de março, o músico estava com seu quinto elepê, intitulado Bring It All Back Home nas praças e com canções sendo uma espécie de novos manifestos para a juventude, como a profética Blowin' in the Wind, a crítica se opondo a guerra do Vietnã em Masters of War (ambas do álbum de 1963, intitulado The Freewheelin'), além de Mr. Tambourine Man, Subterranean Homesick Blues, On The Road Again e também Maggie's Farm eram temas que deram uma visão nova para a juventude que respirava o rock and roll, compostas por um jovem magrelo que vinha do sul dos Estados Unidos e chegou a ser consagrado como o legado de Woody Guthrie (1912-1967), influência enorme na carreira de Dylan durante toda sua carreira. O músico decidiu então virar a mesa de vez no palco de um popular festival de folk em Newport, na noite do dia 25 de julho quando ele, no palco, com uma Fender Stratocaster em punho e acompanhado por Al Kooper no órgão, Mike Bloomfield na guitarra, Jerome Arnold no baixo, Sam Lay na bateria e Barry Goldberg no piano: após algumas músicas, eles deixaram o palco e ele voltou, para tentar amenizar a situação, desta vez com um violão e tocando duas músicas, dentre elas Mr. Tambourine Man e em seguida, fechando com It's All Over Now Baby Blue, sendo aplaudido e vaiado: por desgosto, o mito se tornou elétrico e depois foi chamado de Judas brevemente num show em Manchester no ano seguinte. Um mês e cinco dias depois, era lançado aquele disco, que faria parte da "trilogia elétrica", fase em que ele introduziu instrumentos mais pesados, que começou lá em Bring It All Back Home e que teve sua continuação em Highway 61 Revisted, lançado no dia 30 de agosto e que viria a mudar o rumo de uma geração, com as sessões iniciadas nos dias 15 e 16 de junho, resultando-se no tema clássico principal deste disco (logo Like a Rolling Stone que estou me referindo) tendo Tom Wilson na produção destas e que só seriam retomadas em seis dias, de 29 de julho a 4 de agosto, desta vez com outro produtor, Bob Johnston e que resultaria em uma série de nove canções que desfilam nesta obra-prima do Dylan.
O bardo, convertendo o folk em algo muito além de
simples canções ao violão, responsável por
mudanças que chocaram crítica e público.
Já que estamos falando sobre Highway 61 Revisted, o disco que iniciara uma parte da revolução sonora na década e seria a trilha sonora de uma década, vamos lembrar também de que este trabalho foi essencial também para abrir a cabeça de muitos músicos de folk, que se sentiram impressionados com o que fez Bob Dylan com sua poesia e sonoridade folk, mas sem abandonar solos de gaita como sempre. Aqui, o disco abre com o clássico que antecipou este disco, com mais de seis minutos, Like a Rolling Stone, cuja introdução rítmica parece ser um pontapé nos nossos traseiros levando a outro patamar, dona de uma poesia incomparável, na qual se observa que a letra tratava de uma história contada meio vingativa, como se uma pessoa totalmente protegida ia ser atirada em um mundo cruel, e há até sobre quem ele deveria estar falando: a socialite Edie Sedgwick (1943-1971), do círculo de amigos do artista Andy Warhol, apaixonada por Bob e que chocou ao saber que ele se casou secretamente com Sara Lownds no final do ano, tendo destaque para Al Kooper com seu solo de órgão bem rocker nesta canção; já a próxima faixa é Tombstone Blues, que lembra um pouquinho o som de Chuck Berry dos anos 50 e também a levada original do country, meio Hank Williams (1923-1953) que nos traz uma série de personagens ao longo desta história como Jack o Estripador, o cavalo de Paul Revere, Belle Star além de uma família urbana sem esquecer de falar sobre o Vietnã em certos momentos da música, até o título, que significa "blues da lápide", não deixando os nossos ouvidos se estranharem ao longo da canção; já em It Takes a Lot to Laugh, It Takes a Train to Cry carrega um pouco daquele estilo fiel do blues de raiz nos arranjos, aquele canto triste, num tom bem pra baixo, com um arranjo totalmente clássico e que traz um timbre vocal bem direto de Dylan e é um dos melhores temas pra se ouvir deste disco; em seguida temos aqui uma música inspirada em Berry chamada From a Buick 6, onde o poeta de Minnesota aqui pega essa ideia de falar sobre carros velozes e liberdade, mas a pegada é um pouco mais antiga, soando como um blues de Robert Johnson eletrificado também, o que não soaria ruim demais; na sequência, temos mais um personagem de Dylan imortalizado numa canção: The Ballad of a Thin Man, na qual temos a história sobre um certo Mr. Jones, que guarda mistérios sobre sua origem e seu nome, o que deixa isso em dúvida nas nossas mentes, carregado de uma levada bluesy ao piano, deixando a gente se encantar por cada verso entoado ao longo da canção; logo em diante, temos Queen Jane Approximately, que soa uma suposta canção sobre drogas, em especial sobre a maconha, porém, aqui é uma crítica a vida da família tradicional, cheia de modos e de etiquetas que consideram-se sem sentido, e mesmo com uma sonoridade meio morna, dá pro gasto; ainda temos na íntegra a faixa que dá nome ao disco, logo Highway 61 Revisted, onde Dylan fala sobre a estrada que vai de sua Duluth até o Mississippi com direito a referências bíblicas, um blues mais embalante e um arranjo de astral bem pra cima, onde há um apito que lembra as famosas sirenes policais e destacando-se muito no disco pelas suas sacadas poéticas que não nos decepcionam de forma nenhuma; logo mais adiante temos Just Like Tom Thumb's Blues, uma canção sobre uma passagem por uma cidade de fronteira, tornando interessante a história sobre um sujeito moderno, que possivelmente, estaria buscando valores espirituais que só seriam encontradas procurando num breve passado, como sugere um acadêmico que estudou as canções de Dylan há anos atrás; e, terminando de vez o disco, ainda temos para complementar a faixa Desolation Row, com seus onze minutos de duração, para nós soaria como uma história de cinema, cheia de tons irônicos e sarcásticos deixando alguns rastros e até umas visões pra frente nessa canção de uma obra-prima do gênio, do poeta, do bardo elétrico do folk, Bob Dylan, que segue a fazer coisas brilhantes nos deixando encantados até hoje.
O disco tornou-se tão clássico que acabou sendo uma das grandes influências da época para grupos como os The Byrds, e também os próprios Beatles que seguindo as cartilhas deste disco conceberam Rubber Soul, lançado em dezembro daquele mesmo 65, Revolver e em seguida Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band, que usa a imagem de Dylan na capa (procure ele na capa, mais precisamente no topo e você sabe onde ele está) como uma homenagem possivelmente pela sua influência. O disco tornou-se indispensável para fãs e admiradores do seu trabalho como Bono (U2), Neil Young, Tom Petty, Bruce Springsteen e até mesmo brasileiros como Caetano Veloso, Raul Seixas, o pessoal do Clube da Esquina e também Zé Ramalho, que interpretou Like a Rolling Stone em português num disco em 2008 com outras canções de Bob. E não importa qual tipo de lista de discos haja por aí, saiba que Highway 61 Revisted sempre vai estar lá (ACHOU QUE EU ESTAVA BRINCANDO????), como na dos 500 maiores álbuns de todos os tempos da norte-americana Rolling Stone dominando a 4ª posição e de outras como NME, MOJO, The Guardian e por aí vai, mas pegue a rota 61 que leve ao som desse disco e entenda o Dylan elétrico através deste trabalho 
e de Blonde on Blonde, lançado em 16 de maio de 1966 que fecha esse ciclo
Set do disco:
1 - 
Like a Rolling Stone (Bob Dylan)
2 - Tombstone Blues (Bob Dylan)
3 - It Takes a Lot to Laugh, It Takes a Train to Cry (Bob Dylan)
4 - From a Buick 6 (Bob Dylan)
5 - The Ballad of a Thin Man (Bob Dylan)
6 - Queen Jane Approximately (Bob Dylan)
7 - Highway 61 Revisted (Bob Dylan)
8 - Just Like Tom Thumb's Blues (Bob Dylan)
9 - Desolation Row (Bob Dylan)

Comentários

Mais vistos no blog