Um disco indispensável: Transformer - Lou Reed (RCA Victor, 1972)

Se pudesse definir o melhor momento de Lou Reed nos anos 70 pós-Velvet Underground, seria nos seus dois álbuns Transformer e Berlin, lançados em 1972 e 1973 e ambos produzidos por um nome importante, que o ajudaria na sua carreira e acabou se tornando um grande amigo: o camaleão David Bowie, que fora influenciado pelo seu trabalho no Velvet e sua forma de fazer música influenciaria mais gerações futuras. "Lou Reed é um compositor fascinante, suas letras trazem a pura realidade das ruas de New York", disse Bono, do U2 a respeito da importância de Reed para a música, "Na época, tentávamos compor coisas ao estilo do Velvet e Lou Reed era a base principal para canções daquele estilo", recordava Joey Ramone a respeito da influência de sua poesia na cena punk, e também do jeito de cantar e fazer tudo ao seu estilo, um pouco de tudo, vai da psicodelia ao punk e do blues ao metal, inclusive uma pasagem geral pela vanguarda e rock experimental. O álbum do qual falaremos, Transformer, traz um pouco da linguagem e da vida noturna de New York que poucos já viram e é negada pela sociedade americana, como travestis, bêbados, prostitutas e viciados na madrugada. O disco deu a ele uma guinada na sua carreira, na qual ele fugia do que já tinha feito no Velvet Underground, desta vez apela para um rock mais cru, crítico, realista, cheio de referências que vão do blues ao rock de vanguarda, e com ares mais retrógrados que chegam a nos impressionar pelo seu estilo e sua forma de usar as palavras em suas canções, retratando a verdadeira cara da maior metrópole do mundo e acabou conseguindo alcançar o topo das paradas americanas e ganhar de vez o status de ídolo clássico do rock n' roll através deste disco, produzido pelo seu maior fã, um já aclamado cantor e ídolo pop naqueles tempos (David Bowie) e contou com alguns músicos da banda The Spiders from Mars, como o guitarrista Mick Ronson colaborando no seu material e um belo conjunto de orquestrações, presente em várias canções deste disco, além de Bowie e Ronson fazendo cozinha com ele. O disco foi lançado oficialmente em 8 de novembro de 1972, sete meses depois do lançamento de seu primeiro disco solo (Lou Reed) e dois anos depois de ter deixado o seu antigo grupo, Velvet Underground, e também conta com algumas de suas composições feitas originalmente na época do seu antigo grupo.
30 anos depois, em 2003: Lou Reed e David Bowie. O Camaleão, de fã do líder
do VelvetUnderground a produtor de seu ídolo, o Camaleão fez bem ajudar
Reed a conceber uma de suas maiores obras do rock
Para começar a falar de Transformer, o tema que abre o disco chamado Vicious é uma extrema levada hard rocker dançante e com uma letra falando sobre violência da mulher pra cima do homem e a forma de ser cruel e também com referências a travestis; já em Andy's Chest, na qual Reed consegue ir mais pro lado sexual e selvagem de um amor, com uma introdução sem bateria e vocais de Mick Ronson e do Camaleão "pa pa pa pa paaaa..." dando uma canja muito mais do que especial; agora, o tema que abrilhantou de vez o disco foi Perfect Day, uma das mais belas canções de amor que Reed já fez, com orquestração e arranjos que soam como uma balada pop da época de 70 e que já foi regravada por muita gente, que vai do próprio Bowie (isso em registros ao vivo) e até o seu outro mais ilustre fã, Bono; a porrada retorna com Hangin' Round, um belo exemplo de visão crítica sobre a juventude mimada e cheia de luxúrias e seus outros lados, com acordes distorcentes e batidas arrebatadoras; já a principal faixa que virou single e o maior sucesso no topo das paradas, a vulgar Walk On The Wild Side, a verdadeira imagem da noite de New York e seus personagens, os michês e aventuras vividas, também inspirou várias canções e ter sido citado por Cazuza, anos depois na canção Só As Mães São Felizes do disco de estreia Exagerado (1985); já em Make Up, o baixo de Herbie Flowers é substituído por uma tuba (não, você não leu errado isso) e com versos muito picantes, uma espécie de canção feita especialmente para uma amada; a alienação e o romancismo de Reed combinam-se na canção Satellite of Love, mais outra balada sem muita guitarra, com mais piano e no mesmo estilo que Perfect Day, mas que também lembre um pouco o que viria a ser soft-rock e o pop melódico de hoje; enquanto em Wagon Wheel, o que se pode ver também é muito a diversão garantida nos versos "Yeah, you got to live yeah your life and make a point of having some fun" (Yeah, você tem de viver a vida, sim e garantir que tenha um pouco de diversão) com os Spiders From Mars fazendo uma cozinha acompanhando o ex-Velvet Underground e com uma letra possivelmente feita por Bowie - responsável pela bastante influência do disco; e ainda sobra algumas mancadas, como em New York Telephone Conversation, aonde as fofocas e os boatos da cidade são o foco principal deste tema e ainda Reed agradece por terem telefonado "Oh, I'm glad to hear you all" (Oh, fico feliz que todos tenham ligado - tradução livre); já para complementar mais, em I'm So Free, ele se mostra cria da Mãe Natureza e prova que nasceu para ser completamente livre (daí a possível inspiração para o Oasis ter composto em 1994 a canção Whatever) e com um solo não tão precioso de Ronson; o encerramento do disco é digno de um final marcante, em Goodnight Ladies, a mesma tuba que soava em Make Up, numa levada jazzística e que Frank Sinatra poderia ter gravado, é como se estivesse fechando as portas ou como uma despedida de alguém na noite ou de fãs no final de um show.
O resultado do disco é absolutamente impressionante de canções e arranjos, nada que seja tão repetitivo ao que se fazia até então, com um supertime ajudando o poeta americano, inclusive o engenheiro e produtor Bob Ezrin pilotando a máquina de som no Trident Studios em Londres e com faixas compostas na época do Velvet, mas nunca gravadas antes como Goodnight Ladies, que era só apresentada ao vivo, Satellite of Love New York Telephone Conversation e Andy's Chest, que foram gravadas em registros de 1969 e 1970. Na edição de aniversário dos 30 anos do disco em 2002, a RCA e a BMG Music acrescentaram duas faixas bônus, que são demos com versões acústicas de Hangin' Round e Perfect Day e uma faixa escondida, que incluía um anúncio de lançamento do disco, comum naquela época. É o que se pode apreciar por muito e muito tempo a verdadeira obra do legado de Reed, que morreu em decorrência de problemas de saúde no final de outubro 2013.
Set do disco:
1 - Vicious (Lou Reed)
2 - Andy's Chest (Lou Reed)
3 - Perfect Day (Lou Reed)
4 - Hangin' Round (Lou Reed)
5 - Walk on The Wild Side (Lou Reed)
6 - Make Up (Lou Reed)
7 - Satellite of Love (Lou Reed)
8 - Wagon Wheel (Lou Reed/David Bowie)
9 - New York Telephone Conversation (Lou Reed)
10 - I'm So Free (Lou Reed)
11 - Goodnight Ladies (Lou Reed)

faixas bônus da reedição de aniversário 30 anos (2002)
12 - Hangin' Roud - demo acústica (Lou Reed)
13 - Perfect Day - demo acústica (Lou Reed)


















abaixo, as versões acústicas de "Hangin' Round" e "Perfect Day", presentes na edição "30th Anniversary", demos feitas na época do disco



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