Um disco indispensável: Rugby Japonês - Amandinho (Transtorninho Records, 2015)

Barulho sem fim, guitarras altas, tudo isso parece que veio de um disco do Sonic Youth, do Fugazi ou até mesmo de uma garagem ou de um porão sem acústicas perfeitas mas tudo isso veio mesmo é do Nordeste: sim, um som bem cabra da peste! Vamos falar aqui de Amandinho, uma nova sensação do rock brasileiro. Aí vocês me perguntam, o nome é Amandinho por quê? É o cara que canta reggae? É aquele tio do bandolim? Não, não e não! Amandinho (sem o "r" mesmo) se trata de uma banda formada por músicos de Recife e de Maceió (Alagoas) surgida em 2014 conta com Felipe Soares na voz e guitarra, João Eduardo (bateria), Danilo Galindo (baixo) e Smhir Garcia (guitarra) trazem para o Brasil e para o mundo um som totalmente doido e barulhento, ensurdecedor e que nos agrade muito de verdade. Felipe vindo de Alagoas, terra muito bem representada culturalmente, esteve nos princípios de sua trajetória junto de Givly Simons - hoje com sua lambada brega-retrô do Figueroas que já rendeu o ótimo Lambada Quente, do qual nós já falamos aqui (confira a resenha neste link) - em uma banda chamada Sticky Garden, e também o Gatas & Sorvetes, enquanto ainda estava em Alagoas. Além de participar junto de seu pai de uma banda na qual interpretava canções da banda Beatles, o conjunto Os Besouros, até que decide se mandar para Recife e por lá ele iniciaria uma nova jornada e assim começou com um selo independente chamada Transtorninho Records, um dos principais selos que representam a nova cena alternativa-underground brasileira que hoje se cultua muito por aí. Passados três anos depois, Felipe e o restante da Amandinho conseguem se mostrar verdadeiros representantes do novo cenário brasileiro, formado por bandas como Ombu, Raça, Talude, Rei Pelicano, os cariocas do gorduratrans entre outros com um álbum que promete não decepcionar os seus ouvidos e prepare-se para o nome deste álbum, pois embora soe bizarro, acabará no seu agrado: o álbum se chama Rugby Japonês e a produção fica a cargo da própria banda, que assume ter gravado todo o disco de forma caseira e lançado meses depois do EP que marca a estreia discográfica da banda, Coisas Novas São Assim, com algumas das faixas que viriam a complementar o repertório do álbum. O título deve-se ao fato de a banda ter assistido na casa de um amigo ao campeonato de rugby e tendo-se sagrado como campeão o "tímido" Japão, vencendo a África do Sul na estreia, e também segundo uma release publicado por Fred Zgur que está na página da Transtorninho Records na Bandcamp "uma morte ao falso metal, a sagração de que o punk torna todas as coisas possíveis, não importando se você tem grana ou não, nem se você sabe tocar" e conclua com o tradicional lema independente "faça você mesmo", modo que Ian Dury utilizou nos anos 70 para pioneirizar ainda mais a liberdade artística que começaria a ganhar vitalidade a partir dos anos 80 e que vêm ganhando mais e mais força da parte de bandas que tentam manter-se um pouco distante do mainstream, do espaço comercial que esquece um pouco o que há de original e criativo e Amandinho é um dos tantos exemplos do que há de underground, puro, original e pode acreditar: eu não menti em nenhuma linha escrita sobre a banda e o Rugby Japonês até agora.
Da esquerda para a direita: Felipe Soares e João Eduardo (agachados),
Danilo Galindo e Smhir Garcia (de pé). Eis a banda Amandinho, que não
tem nada a ver com o regueiro mas faz um barulho pra caramba.

O disco começa com uma pedrada que o nome já diz tudo: Lacrou, e o disco mal começa e já nos traz todo o gás que a galera sente ao ouvir ainda os primeiros acordes, mas já é um cartão de visita para o que vem mais adiante em meio a tanta barulheira que nos remete um pouco aos anos 80 e 90 pra complementar; enquanto na agitada e crua Dias de Moda, que tem um sample com a antiga vinheta da Playstation já nos orienta também ao barulho que vem pela frente, guitarras berrantes e que nos remete um pouco aos anos 70 e 80 pela sonoridade e o refrão diz sobre tudo que "é demais pra aguentar" e uma sequência de fuzz nas guitarras convertem-se na peça ideal de um quebra-cabeça que complementa toda a loucura que há dentro do som da banda; a faixa seguinte se chama Bike, uma letra com ares cinematográficos e que nos remete um pouco ao grunge, inclusive pelo hardcore e sem deixar de soar atual; já na longuíssima e aventurosa Heavy Metal 2, aqui nada parece soar comum, são mais de 8 minutos de puro fuzz, solos delirantes e a voz de Felipe Soares não deixa passar batido por cada verso que entoa, ou seja: essa música é o motivo para entender o álbum em si e que se destaca muito, também é uma das faixas que carrega a melhor tradução para a sonoridade da banda total; depois dos mais de oito minutos de puro barulho, voltemos a canções rápidas e pegajosas, como Bill Murray (sim, a música leva o nome do ator de Ghostbusters mesmo), de originalidade poética no verso "Faz tempo que você não vem, nem tudo pode acontecer, nem tudo é normal, não me faça mal, meu amor" mostrando que ainda há um pouco de filosofia contemporânea nas bandas do underground brasileiro sim; a próxima faixa é Sereias, recheada de acordes melódicos que quase nos remetem a uma delicadeza que ainda deixe os acordes mais equilibrados, transformam qualquer coisinha simples em uma canção grandiosa que se destaca no repertório do álbum; o título da música pode ser Rei da Paquera, mas não é nada similar ao filme homônimo de 1987, pois aqui fala sobre os dramas típicos dos adolescentes, tentar um amor pela terceira vez, todo aquele ciclo que enfrentamos na fase "aborrescente" como muitos podem entender; já a faixa seguinte de nome Get Away pode parecer um nome de uma canção de banda semiobscura de punk, hardcore ou emo e alternativo dos anos 80 ou 90 que foi redescoberta e nos remete um pouco aos Ramones como referência sonora com a letra toda em inglês e não decepciona a gente por aqui; na sequência, a faixa Não Seja Besta carrega uma boa dose de niilismo, vários fatos corriqueiros e outras coisas que conceituam por si "a angústia de quem tem 20 e poucos anos" e também uma das melhores canções do disco que se destaca não só pela energia captada no som mas pelo refrão, aonde a banda pede repetidamente "Seja besta" no refrão como se a bestialidade fosse um modo de vida para curtir e apreciar de forma livre e simples, musicalmente soando como Marque Moon do Television pela melodia, uma boa referência sonora para a música; já em Gruta de Lourdes, com um ambiente cinematográfico que dá um caldo forte nos versos e ainda temos para completar tudo isto, mas não se descontente se achar o tema redundante ou chato demais, Felipe Soares começa a trazer um momento mais apoteótico que traz mais visceralidade ao tema, o que é muito ótimo de verdade, por sinal; o final fica por conta de uma canção trilíngue, intitulada Smile in Spanish aonde Felipe canta a música em três idomas, o nosso português mais o inglês e o espanhol quase como se a letra soasse alguma canção de pop latino  sucesso comercial com 3 idiomas , e que aqui ganha uma forte atenção para os ouvidos do público. 
Set do disco:
1 - Lacrou (Felipe Soares) 
2 - Dias de Moda (Felipe Soares) 
3 - Bike (Felipe Soares) 
4 - Heavy Metal 2 (Smhir Garcia)
5 - Bill Murray (Felipe Soares) 
6 - Sereias (Felipe Soares) 
7 - Rei da Paquera (Felipe Soares) 
8 - Get Away (Felipe Soares) 
9 - Não Seja Besta (Felipe Soares) 
10 - Gruta de Lourdes (Felipe Soares) 
11 - Smile in Spanish (Smhir Garcia)


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