Um disco indispensável: Jorge Ben - Jorge Ben (Philips/CBD Phonogram, 1969)

Os anos 60 estavam terminando, a bossa nova já tinha outros rumos depois do estouro de João Gilberto, Tom Jobim, Sérgio Mendes e outros nomes acabaram fazendo sucesso nos Estados Unidos a partir de 1962, a Jovem Guarda de Roberto, Erasmo, Wanderléa, Os Incríveis, Renato & Seus Blue Caps, Eduardo Araújo e Reginaldo Rossi daria um rumo bem diferente que se tornaria a música popular, ou música brega (dando exceções a alguns artistas), o Tropicalismo de Caetano, Gil, Gal e Os Mutantes acabou sem muito brilho após a prisão dos dois primeiros em dezembro de 1968, e retornariam à Bahia na Quarta-Feira de Cinzas de 1969 antes de dizerem adeus ao país do qual sempre lutaram pela cultura, liberdade de expressão e por mais acesso ao que estava fazendo sucesso no mundo, já que demorava meses para sair os grandes discos, as revistas que divulgavam quem eram as figuras carimbadas no cenário musical, como Iron Burrerfly, Pink Floyd, Bob Dylan, Jimi Hendrix, Rolling Stones e os Beatles em um período sem shows e só fazendo divulgações e gravando discos naquela época. Chico Buarque estava tentando deixar a imagem de bom moço, "o Noel Rosa da nova geração" como o chamavam naquela época, tentando ser direto contra a ditadura militar, teve que se exilar na Itália antes de que seja preso e nunca mais pudesse cantar o que ele escrevia e mostrava para o público, o caso de "Sabiá" que foi composto com Tom Jobim e acabou levando um prêmio grande, o III Festival Internacional da Canção, no qual um certo Geraldo Vandré, que era o favorito, levou um 2º lugar e seu tema "Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores" acabou sendo um hino de resistência contra a ditadura. Elis e Nara seguiam fazendo sucesso como sempre, lançando disco atrás de disco e gravando novos compositores, deixando de lado os padrões de samba e bossa nova que dominavam em 1965 e apelando pro som do Nordeste e acrescentando guitarras elétricas, órgão e sonoridade baseada na música feita nos Estados Unidos. Mas, e Jorge Ben, como é que fica aquele jovem também chamado como Babulina, que teve aulas de música com Tim Maia e junto dele, faziam um som com Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Edison Trindade e outros amigos que formavam a lendária Turma do Matoso, de 1957 até 1959? Bem, Jorge já era um músico de nome,  já tinha como 20 músicas de sucesso nas rádios, botava seus shows pra lotar e ainda conseguia ajudar alguns artistas dando suas letras para gravarem, mas em 1967 gravou um disco fora da sua casa, a Philips, intitulado O Bidú/Silêncio no Brooklin, na época em que vivia na cidade de São Paulo, no bairro do Brooklin e acabou sendo uma figura constante no bairro, mas o disco foi um fracasso não só porque não era da Philips, e sim por uma gravadora chamada Beverly, mas também pela fraca divulgação e pela tentativa de um amuleto da sorte, tipo o boneco Mug do amigo Wilson Simonal (1938-2000), só que na versão do Babulina do Rio Comprido, era um ratinho de borracha chamado Bidú. E depois de 1967, acaba compondo uma música chamada A Minha Menina e vira sucesso quando um grupo de jovens de São Paulo, que seriam sucesso rapidamente, chamado Os Mutantes e a partir de então, Jorge seguiria fazendo o seu som com levadas de bossa e samba, desta vez com um acompanhamento de peso, que marcaria os anos de 1969 a 1972, o Trio Mocotó, formado por Fritz Escovão, João Parahyba e Neneu Gargalo seriam um suporte de longos e bons anos que resultaram em shows, quatro discos e um destes, o disco que trazeria um mérito ao grande compositor e músico carioca que ainda tem muito reconhecimento pelo fato de ter clássicos que jamais sairão de moda até hoje. Tudo começou quando Jorge e o Trio Mocotó decidiram gravar mais um LP, desta vez com um produtor diferente dos quais Jorge já trabalhou, e é quando Armando Pittigliani, que o trouxe para a Philips, o convidando a voltar para a gravadora e o disco seria produzido por Manoel Barenbein, o mesmo produtor dos três primeiros discos de Chico Buarque de Hollanda e dos discos de Gil, Caetano e dos Mutantes, além dos arranjos de Rogério Duprat e de José Briamonte para complementar a base de Jorge e do Trio Mocotó, o que acabaria se resultando em um belo disco cheio de suingue e de canções que ainda embalam fãs de todos os quatro cantos do mundo até hoje.
Começando o disco com uma levada de samba no violão em Criola, já dando ares de que é o mesmo Jorge de sempre, falando sobre uma musa negra, exaltando a personagem do disco, que são as negras e citando o amigo Gil, já no exílio em Londres e com o Trio Mocotó fazendo os vocais para ele; na sequência vem Domingas, que é uma homenagem a sua esposa e companheira de shows, com assovios e corais ao estilo Os Cariocas, mas com aquele estilo mais romântico e suave para agradar a amada em forma de canção; Cadê Tereza é um samba impossível de ficar parado, é um daqueles sambas dançantes que só Jorge sabe fazer; Barbarella é o nome da mais ilustre personagem de cinema de Jane Fonda, musa do cinema e dos vídeos de atividades físicas nos anos 80, mas também acabou virando nome de uma música deste disco que estamos falando, com base no filme protagonizado por Fonda; o tema mais marcante deste disco é País Tropical, composta especialmente para o repertório de um show de Gal Costa, mas que acabaria sendo sucesso na voz de Wilson Simonal, que utilizou apenas as primeiras partes da palavra "mó num patropi abençoá po Deu e boni po naturê", e acabou sendo uma das melhores canções feitas sobre o Brasil e eleita uma das 100 melhores canções nacionais pela Rolling Stone em 2009; Take It Esy My Brother Charles é uma letra cheia de mensagens pra pegar leve, e tudo cheio de suingue e samba; os arranjos do maestro tropicalista Rogério Duprat em Descobri Que Sou Um Anjo acabam dando um pouco da mistura musical que já é notável nos discos dos tropicalistas Gil e Caetano; outro dos tantos temas do disco que embalam tanto pra dançar quanto pra cantar é Bebete Vãobora, que também acabou virando uma de suas tantas musas, como Domingas, Rita Jeep, Tereza e entre outras tantas; a letra com o nome mais longo acabou virando um sucesso despercebido Quem Roubou A Sopeira de Porcelana Chinesa Que a Vovó Ganhou da Baronesa?, com uma história bem simples, movida apenas pelo título da música e alguns versos dando mais simplicidade nos arranjos e com uma levada bem de samba, que soa como uma homenagem para as avós; os desabafos amorosos seguem em Que Pena, que tem o subtítulo Ela Já Não Gosta Mais de Mim, carrega ares de samba-jazz nos arranjos, algo que se tinha nos seus primeiros discos, pra reviver os tempos áureos da bossa nova e do estilo; pra encerrar, Charles, Anjo 45 é puxada por gritos de público e pelo som da cuíca, o nome foi extraído de um codinome utilizado por Avelino Capitani, que era 2º Tenente Reformado da Marinha e acabou se refugiando fora do país na época da ditadura e voltou para participar dos atos da esquerda contra os militares e acabou indo morar em Porto Alegre, onde reside-se até hoje, o ambiente de fundo é de um show, possivelmente de alguma performance de um festival que ele tenha participado apenas para fazer show, a música seria regravada mais tarde por Gal Costa, Caetano Veloso e até pelos Paralamas do Sucesso, mas aí já é outra história.
O disco acabou ganhando um bom lugar na lista de prediletas dos fãs, inclusive de gente como Marcelo D2, Fred ZeroQuatro (Mundo Livre S.A.), Mano Brown (Racionais MC's), Thaíde, Alcione, Pedro Luís e até por um tal de Will.i.am (Black Eyed Peas) entre outros, não só pelas músicas, mas também pela presença de muita cadência do samba nas músicas e as letras que acabaram caindo no gosto do povo. A capa têm um pouco do que se define Jorge Ben naquela época, mais sambista do que tropicalista, e também uma definição do País Tropical (na arte e na música) pelo artista plástico Albery, o responsável da capa, que acrescentou aves, mulatas, o sol, o verde das matas e uma das maiores paixões do cantor: o time Flamengo, que já foi homenageado várias vezes por um dos seus ilustres torcedores. Enfim, um disco como vários outros, cheio de suingue e de histórias que Jorge sabe contar do seu jeito.
Set do disco:
1) Criola (Jorge Ben)
2) Domingas (Jorge Ben)
3) Cadê Tereza (Jorge Ben) 
4) Barbarella (Jorge Ben)
5) País Tropical (Jorge Ben)
6) Take It Easy, My Brother Charles (Jorge Ben)
7) Descobri Que Eu Sou Um Anjo (Jorge Ben)
8) Bebete Vãobora (Jorge Ben)
9) Quem Roubou A Sopeira de Porcelana Chinesa Que a Vovó Ganhou da Baronesa? (Jorge Ben)
10) Que Pena (Ela Já Não Gosta Mais de Mim) (Jorge Ben)
11) Charles, Anjo 45 (Jorge Ben)
































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