Um disco indispensável: Canta, Canta Minha Gente - Martinho da Vila (RCA Victor, 1974)

Bom, é a primeira vez que estamos falando de um disco de samba, ainda mais de um ídolo nacional do nosso samba brasileiro, Martinho da Vila, que tem muito mais história do que qualquer cantor atual, que faz sucesso rapidamente de uns anos pra cá (falo isso porque sempre gostei mais do samba de Martinho, Noel, Cartola, Adoniran, Beth, Clara e Alcione por causa de minha mãe, o samba mais original) e acabam caindo no ostracismo. Mas, deixando de lado todo esse blah blah blah, vamos falar de um dos maiores discos do samba, lançado em 1974 pelo selo RCA, Martinho já tinha presença em vários programas televisivos, sucessos em cada disco, desde o seu primeiro álbum homônimo (1969), passando por Meu Laiáraiá (1970), Memórias de Um Sargento de Milícias (1971), Batuque na Cozinha (1972) e Origens - Pelo Telefone (1973), até chegar ao seu maior disco de sucesso, lançado há 4 décadas (40 anos, quem não entendeu) pelo selo RCA Victor, o selo por onde se consagrou desde que lançou o seu primeiro álbum, em 1969, e permaneceu até 1987, quando decide trocar a "casa do samba" - apelido da RCA brasileira por ter abrigado grandes nomes do samba - pela CBS/Columbia, lar de Roberto Carlos, o maior vendedor de discos da gravadora. O álbum foi completamente gravado em 1974 e só meses depois, o resultado viria a ser grandioso, um ótimo motivo para gostar do bom e velho samba, que ainda permanece vivo nas rodas do Brasil afora, traz uma volta daquele samba de raiz, que havia surgido na casa de Tia Ciata, na área chamada Pequena África, situada na Praça XI no Rio de Janeiro e ali estavam presentes Donga, João da Bahiana e Pinxiguinha dentre outros colaboradores do samba, tudo isso no começo do século XX, o gênero que definiria o Brasil a partir das reuniões na casa de Tia Ciata, passando pelas festas de rua, onde o povo se fantasia e canta temas alegres, uma festa do povo chamada Carnaval, uma das mais alegres festas brasileiras do povo até hoje. O disco, conta com temas imperdíveis, dentre eles a música Canta Canta, Minha Gente, o tema que leva sempre multidões ao delírio, um samba ao estilo dos velhos sambas feitos pelos precussores, com um pouco da poesia moderna do samba, algo que muita gente, como o grupo Fundo de Quintal e o cantor Zeca Pagodinho e até o pessoal do grupo Só Pra Contrariar; seguindo de Disritmia, um samba romântico, mais íntimo, com um pouco de sensualidade na letra; Dente Por Dente, já é um samba mais ao estilo de Martinho, com uma linguagem amorosa mais sutil e delicada; enquanto Tribo dos Carajás (Aruanã Açu), traz referências aos índios e à sua cultura indígena, baseado um pouco na história do Brasil, também um dos motivos de existir tantas letras com conteúdos um pouco históricos, revelando um Brasil de riquezas, nos tempos de colonização e império; o samba-canção Malandrinha, feita por Freire Júnior, parece ser feito na década de 30 ou de 40, pela forma de soar também um pouco como samba-seresta, com uma levada de bossa nova e de chorinho; enquanto Renascer das Cinzas, é um pagodão simples, mas o destaque mesmo fica com os primórdios do samba, que são revividos em Patrão, Prenda Seu Gado, um samba feito por Donga, Pixinguinha e João da Bahiana, os pioneiros no surgimento do samba, e também, influências de Martinho, que fez uma bela versão; Nego, Vem Cantar é um dos sucessos de sua carreira que não pode faltar nas favoritas de quem curte o seu trabalho, além de ter uma belíssima letra, citando um pouco das praias e do verão; o forró-samba, que mais é um Calango Vascaíno, que Martinho faz com um pouco de um jeito cômico, até com uma levada de forró e calango, puxada pelo acordeom de Chiquinho e pela euforia de Martinho querendo ver o Vasco campeão; o samba de Sérgio Cabral e do músico e produtor Rildo Hora, Visgo de Jaca, é uma letra mais simples, bucólica, e com uma citação à lendária "Canção do Exílio" de Gonçalves Dias, já no ritmo mais bossa nova, o que deixa a música mais perfeita ainda; a lenta Viajando, parece ser um samba mais bucólico, com orquestras, mas também com uma letra simples, além de uma orquestração mais simples, com um solo de gaita do produtor Rildo Hora; o final fica por conta de Festa de Umbanda, uma adaptação de um tema clássico para exaltar os orixás, com uma introdução de sinos que parecem ser gospel-cristão, mas é mais do candomblé mesmo, com coros bem familiares e o mesmo se pode dizer sobre as baitdas, o tema teve seus direitos autorais doados ao órfãos do Lar de Santa Bárbara e de São José.

O disco é uma obra por completa, nada do que se pensa deste samba de hoje, voltar mais para os anos em que o samba era mais original, mais autêntico, além de uma riquíssima mistura de ritmos brasileiros relacionados ao samba, com um pouco do que já tinha feito no resto de seus discos anteriores. A capa de Elifas Andreato é uma obra à parte, um pouco mais de azul deixando que reinasse na imagem, e esta capa do álbum foi a que utilizamos como foto de perfil na nossa página do Facebook, para quem não se lembra. O samba também está trazendo muitos discos indispensáveis para qualquer apreciador de boa música ouvir, basta conhecer um pouco mais do que já foi feito no samba brasileiro.
Set do disco:
1 - Canta Canta, Minha Gente (Martinho da Vila)
2 - Disritmia (Martinho da Vila)
3 - Dente Por Dente (Martinho da Vila)
4 - Tribo dos Carajás (Aruanã Açu) (Martinho da Vila)
5 - Malandrinha (Freire Júnior)
6 - Renascer das Cinzas (Martinho da Vila)
7 - Patrão, Prenda Seu Gado (Donga/Pinxiguinha/João da Bahiana)
8 - Nego, Vem Cantar (Martinho da Vila)
9 - Calango Vascaíno (Martinho da Vila)
10 - Visgo de Jaca (Rildo Hora/Sérgio Cabral
11 - Viajando (Martinho da Vila)
12 - Festa de Umbanda (tema tradicional do candomblé, adaptado por Martinho da Vila)