Um disco indispensável: Neil Young - Neil Young (Reprise, 1968)

Dizem que, com o passar do tempo, nós ficamos como o vinho: quanto mais maduros, melhor, o gosto fica mais agradável ao nosso paladar. Pois bem, um exemplo de comparação ao vinho, são as músicas de um canadense muito querido e popular na música, atravessou diversas fases, foi do rock ao folk, do country ao jazz e inclusive à eletrônica e até mesmo ao grunge. Estamos falando dele mesmo, Neil Young Mello (tira o Mello, zoeiras à parte), um dos caras mais ativos do rock e que têm uma vasta e grandiosa carreira e discos que soam como obras de arte, e que mesmo sendo um artista mais visionário nessa coisa, que se abre para falar de vários temas, até porque ele é um dos especialistas em debater sobre política, amores e ecologia, e por isso que é considerado um dos fodões da música. Nascido na populosa cidade de Toronto no dia 12 de novembro de 1945 como Neil Percival Young, quando criança se mudou com a mãe, separada, para Winnipeg, no estado canadense do Manitoba, e aos dez anos se impressionou com aqueles moços fazendo um som diferente, barulhento, pesado, originado do blues e do country e caiu de cabeça no rock n' roll como todos outros caíram naquele tempo. Já no começo dos anos 1960, ele se juntou com alguns amigos e depois de passar por algumas bandas, ele se fixaria com a sua primeira grande banda, a The Squires na qual era vocalista e guitarrista, banda com a qual gravaram uma canção de nome The Sultan, que obteve alguma divulgação mas esperava muito mais disso. Depois disso teve a banda The Mynah Birds ao lado do baixista Bruce Palmer e mais em diante, deixaria as terras canadenses para tentar a sorte grande, seria mais um em busca de realizar seu "american dream", como os latinos e outros tantos que cruzam a América. E ali se instalou definitivamente, se juntou com os integrantes do Buffalo Springfield em 1966 e nessa banda se reencontrou com Stephen Stills e dali nasceu uma parceria que dura até hoje e que já rendeu outros grandes projetos no futuro. Neil afirmou que a amizade com Stills ajudou muito em sua instalação no país e inclusive a se enturmar com algumas pessoas, apesar de ter sido uma banda que ganhava destaque a cada dia que passava, pelo som folk-rock, de ares bucólicos, mas também com pés no country e nas raízes musicais americanas durante aquele período em que paz e amor eram agora o novo barato da juventude e curtir a vida em um mantra de sexo, drogas e rock and roll agora ditava nas cartilhas daqueles loucos anos 60. Após dois bem-sucedidos álbuns, e a saída de Stephen Stills que se dedicou a outros projetos, a banda se viu em queda e decidiram lançar o terceiro disco, considerado o "canto do cisne" do grupo, intitulado Last Time Around, em 30 de setembro de 1968, e depois daquele disco, Neil tomou uma decisão séria. Partiu em carreira solo e uma das mais bem-sucedidas de todos os membros da Buffalo Springfield, sendo aclamado mundialmente e nos presenteando somente com discos ótimos e que já nasceram com cara de clássicos. Mas basta de conversa e vamos ao assunto principal, seu primeiro disco, lançado no dia de seu 23º aniversário, que leva o seu próprio nome, e que teve como parceiro na produção David Briggs, seu mais presente produtor em sua discografia mais os músicos Jack Nitzsche e Ry Cooder dando uma canja.
Neil em ação após lançar seus dois primeiros discos: a popularidade
cresceu rápido e o colocou de vez na história da música.
Pra começo de conversa, quando se ouve este disco, a gente acaba partindo para um universo de canções que nos trazem histórias de lugares, personagens que soam realistas ao sair de sua voz e o perfil de contador de histórias e romances soa perfeito com seu estilo narrativo de sempre. Tal como os poetas-cantores da época, como Bob Dylan e Leonard Cohen, seu contemporâneo, o próprio Neil conseguiu demonstrar afeto, raiva, amor em várias de suas canções. O disco abre com The Emperor of Wyoming, uma instrumental que já nos leva ao rumo certo do que Neil ia nos proporcionar musicalmente, e o som é maravilhoso de vez, uma pegada de ares folk e country ao mesmo tempo com cordas que mantêm essa essência do som de Nashville na abertura do disco; a faixa seguinte, ele apresenta o que ele conta nas suas histórias, The Loner um folk bem elétrico e narrando a história de um personagem, o solitário, um sujeito que nada se sabe, mas que este sabe de tudo, dos passos de alguém e conhece as pessoas, um de seus clássicos do cancioneiro; na sequência, o cara se apaixona perdidamente por uma mulher e fica em dúvidas sobre conquistá-la: eis que aparece If I Could Have Her Tonight, uma canção que soa como um desejo que não acontece, um amor não-correspondido, para ser mais claro; enquanto isso, é muito presente o lirismo na canção I've Been Waiting For You, temos uma breve passagem melancólica, porém esperançosa e com um belo arranjo que se destaca nos termos de som, a voz de Young carrega uma potência em certos momentos também; enquanto isso, a pegada mais cool e tranquila ganha uma atenção de nossos ouvidos, e a história de The Old Laughing Lady, com um coral no estilo gospel americano complementa assim toda a canção, e com arranjos de cordas que nos surpreendem, mas que soa agradável e se torna uma peça-chave deste trabalho; entre uma música e outra há uma instrumental, mais precisamente uma música de mais de um minuto chamada String Quartet From Whiskey Boot Hill, de Jack Nitzsche (1937-2000), pianista e um dos parceiros de arranjo e produção no primeiro álbum de Neil, e responsável por esse tema que chega a passar batido; e com a faixa seguinte, o cantautor canadense não nos decepcionaria e nos apresenta Here We Are In The Years, uma boa dosagem de psicodelia poética misturada com realismo: uma volta ao tempo, em uma cidade simples do interior, mas começa a mudar tudo e a ambição e fama começa a rodar nesse universo, numa pegada country baladista com ares bem a cara do famoso Nashville Sound (joga no Google primeiro pra saber o que é), unindo o roots com o plugado sem medo; os desabafos e lamentos seguem e o desfile de canções cheias de melancolia, a exemplo de What Did You Do to My Life? que não deixa nos decepcionar até, e que traz até um riff chapante de guitarra nesta música que dá pro gasto pelo menos - o que não é ruim pelo jeito; o disco ainda mostra que está com o pique todo através de I've Loved Her So Long, e aquelas histórias de amor com tons meio tristes de sempre, mas, ele vê a esperança e não desiste aqui, e a sonoridade mantendo a essência que habita musicalmente este disco do qual estamos falando; e para fechar, uma história cantada em mais de nove minutos e que envolve personagens diversos, como motoristas de táxi, cantores de folk e um senhor de 87 anos que derrubava palmeiras, intitulada The Last Trip to Tulsa, intimista no som: voz-e-violão, somente Neil ali cantando e tocando, como se fosse a jam de um homem só, terminando aqui o primeiro registro solo de um dos mais importantes letristas do século XX que já se viu e ouviu falar.
Basicamente, o disco foi lançado no final de 1968, mais precisamente em seu aniversário, porém foi apenas em janeiro do ano seguinte que ganharia uma edição "definitiva" podemos dizer assim, pois havia uma mixagem com o sistema Haeco-CSG, que tentava fazer que materiais em estéreo fossem compatíveis em aparelhos monofônicos - o que só piorou mais ainda. E o disco sofreria uma remixagem no verão daquele ano, período em que Neil já estava com seu Everybody Knows This Is Nowhere - seu segundo álbum e a estreia da banda de longa data Crazy Horse - nas lojas, e com essa versão a capa sofreria um baque, uma grande faixa branca com o nome do cantor e o logo da Reprise Records, depois do que sobrou do estoque original e por causa desse mixes fracos de 1969, muitas cópias da primeira versão são consideradas raridades e disputadas a tapa entre colecionadores e amantes do vinil. Recentemente, o disco foi recolocado com a capa original, sem o nome, especialmente para o box Neil Young Archives Original Release Series, com remasterização no sistema HDCD e conservando a sonoridade original do disco. No mais, o disco também é raro de encontrar em listas importantes, como nas dos maiores discos dos anos 60, mas só para constar que este trabalho marcava a trilha sonora do fim de um período delirante do século XX e colocava aqui um cantor que tinha muito o que colocar de canções boas ao público, sendo também um responsável por expor temas sobre consciência do meio-ambiente, questões sobre política e a humanidade em si que hoje não são mais tabus para nós cidadãos do mundo contemporâneo. O bom e velho Neil segue a cantar as mesmas coisas de antes à sua maneira, pela estrada afora colocando a galera pra sacudir no alto de seus 71 anos bem vividos e cheio de histórias pra contar, e não importa se está velho demais para o rock and roll, porém jovem demais para morrer (Jehtro Tull é uma boa referência pra falar do cara), enquanto estiver entre nós, vai se divertindo e vivendo no melhor estilo que se possa imaginar. Long live to eternal Young, Neil Young!
Set do disco:
1 - The Emperor of Wyoming (Neil Young)
2 - The Loner (Neil Young)
3 - If I Could Have Her Tonight (Neil Young)
4 - I've Been Waiting For You (Neil Young)
5 - The Old Laughing Lady (Neil Young)
6 - String Quartet From Whiskey Boot Hill (Jack Nitzsche)
7 - Here We Are In The Years (Neil Young)
8 - What Did You Do to My Life?  (Neil Young)
9 - I've Loved Her So Long (Neil Young)
10 - The Last Trip to Tulsa (Neil Young)

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