Um disco indispensável: Usuário - Planet Hemp (Superdemo/Chaos/Sony Music, 1995)

1995, o ano que o rock brasileiro voltaria a emplacar como nunca depois do que foi o boom do rock nacional com grandes bandas - conhecidas até hoje - na década anterior e que na virada dos 80 para os 90 perdeu o total espaço na mídia para o sertanejo, axé, pagode e música popular (ou melhor dizendo, brega na melhor tradução livre) e as bandas ficariam por um bom tempo fazendo shows com pouco público em tempos de crise e governo Collor, porém em 1993, o rock ganharia potência já com a MTV instalada no Brasil em outubro de 1990 e apoio de festivais independentes como o Juntatribo e o Superdemo (que durou de 1993 a 1999), além de apoio de críticos musicais e da revista BIZZ. Tudo aconteceu com o estouro dos Raimundos e Chico Science & Nação Zumbi, além da chegada do Pato Fu e mais tarde boa parte da cena abrindo espaço mais ainda e originando a expressão MPopB para as bandas que faziam rock com uma linguagem mais pop e com influências da MPB e com CDs que vendiam feito água em pleno começo de Plano Real com algumas letras recheadas de palavrões, expressões bem vulgares mas que caíam no gosto do público brasileiro e apareciam até em programas de auditório na televisão, apesar de terem clipes que não paravam de serem reexibidos na MTV e shows lotados, dando assim muita popularidade a estas bandas e um exemplo desta banda que falaremos neste post, o Planet Hemp, surgido originalmente em 1993 no Rio de Janeiro com Marcelo Maldonado Peixoto - ou melhor - Marcelo D2 nos vocais, Formigão no baixo, Rafael Crespo na guitarra, Bacalhau na bateria e Luís Antônio, mais conhecido como Skunk, nos vocais incluindo também outro nome do rap carioca: BNegão. Porém, em 1994 acontece a morte de Skunk, em decorrência da AIDS, chegando a banda a quase parar definitivamente e para isso, BNegão decidiu assumir os vocais que eram do companheiro e após terem gravado uma fita demo e participarem dos feistivais Juntatribo em Campinas (SP) e Superdemo, no Rio, a banda consegue através de Elza Cohen, coordenadora do festival carioca, um contrato com uma gravadora com a qual a Superdemo havia um projeto, a Chaos
Da esq. para a dir.: Skunk (o primeiro parceiro de banda), Rafael,
Formigão,  BNegão e Marcelo D2 (de camisa xadrez aberta)
A primeira formação do Planet Hemp em 1993, Skunk morreria
meses depois, em 1994, em decorrência do vírus HIV
A Chaos era um selo distribuído pela Sony Music e que no Brasil havia um elenco de bandas e artistas novos com pretensão de estourar nacionalmente: Gabriel o Pensador e Chico Science & Nação Zumbi eram nomes que a Chaos botava muita fé e o Planet veio para fazer parte deste selo mostrando suas letras na qual faziam referências à maconha, sobre legalização da droga e com um som que lembrava um pouco Rage Against The Machine e Cypress Hill, Public Enemy e bandas americanas que faziam um som bem hardcore punk naquela década de 90.  O nome e a banda surgiram quando D2, usando uma camiseta de uma banda hardcore, se cruzou com Skunk, um artesão e vendedor de camisetas de bandas e começaram a trocar ideias sobre bandas e foi quando Marcelo D2 botou na cabeça a vontade de ter uma banda: começou ali uma amizade que, segundo D2, marcou a sua vida toda e procurando ideias, a banda que era para ser mais de rock, e muitos não tinham conhecimento nos instrumentos e aí que foi quando pegaram o estilo rap como base principal. Após lançarem uma demotape, a banda cairia na estrada Brasil afora, ocorre a morte do melhor amigo de D2 e o contrato com um selo da Sony Music que viria a mudar o rumo da banda: sucesso, presença constante na MTV e a prisão por apologia às drogas em novembro de 1997 e mais alguns álbuns até a separação definitiva em 2003, além da reunião em 2010 para um evento da MTV e uma turnê em 2011 e que durou até 2013 com uma homenagem a Chorão (1970-2013), outro grande amigo de D2 e vocalista da banda Charlie Brown Jr., na segunda edição brasileira do festival Lollapalooza e falecido dias antes do festival, que rolou em um clima de luto para as bandas brasileiras.
Marcelo D2 nos anos 90, auge do Planet Hemp: shows que
foram proibidos para menores de 12 anos hoje em dia
não são mais dor de cabeça para o rapper de nome no Brasil.
O disco começa com uma canção bem ao estilo RATM, cheio de levadas hardcores e versos canábicos em Não Compre, Plante! e mostrando que não tem mesmo papas na língua pra falar sobre maconha e com uma base instrumental misturando funk, soul e elementos afro com a pegada de rap e hardcore e BNegão solta os versos que abre; enquanto isso, a polícia sofreu muitas críticas com o passar dos tempos nas canções do Planet e Porcos Fardados é uma das músicas que deu tanta dor de cabeça aos próprios militares nos shows e pra quem seguia a reclamar da banda; o tema Legalize Já virou hino pela aprovação do consumo de maconha e já levou muita reprovação do público conservador, mas acabou ganhando o público através dos versos e do sampler que encerra a faixa, Legalize It, do lendário ícone do reggae e ex-Wailers Peter Tosh (1944-1987), música que inspirou o grupo a fazer a letra; em Deizdasseis, aqui D2 faz uma rima em menos de 50 segundos com direito a beat-box e a participação do rapper Black Alien nos versos, uma espécie de embolada mais moderna; em Phunky Buddha, se pode notar muito as claras referências sobre a cidade do Rio de Janeiro e as duras críticas sobre o livre consumo e a relação dos consumidores com a polícia; já em Maryjane, a banda ataca num inglês bem solto e usando a expressão da Maryjane, que é uma expressão inglesa para marijuana (ou, traduzindo melhor: gíria para maconha) e a guitarra matadora de Rafael Crespo colocando riffs pra deixar mais pesadão o som; outra vinheta que se pode ouvir nesse disco é Planet Hemp, com o baixo de Formigão abrindo a faixa e o nome da banda sendo repetindo na voz de D2 com uma base bem punk rock; em Fazendo a Cabeça, a banda dá uma visão do Rio de Janeiro, sobre o lado obscuro da vida carioca e quem não concorda com todos, acaba no maior vacilo; com uma levada de samba, começa a música Futuro do País e que aos poucos vai ganhando muita força e acaba ganhando uma parte bem heavy na guitarra; o tema Mantenha o Respeito, apesar de já ter levado uma péssima reputação de mídia e público ao ter sido lançada, segue sendo uma das canções do grupo que jamais deixou de ter um papel forte toda vez que se trata sobre a legalização da maconha, assim como a outra faixa, Legalize Já; e não só tratando de maconha, o Planet Hemp chega a ser machista em P.. Disfaraçada, aonde só dispara pedradas (literalmente) na mulher e chamando-a de "puta" (por isso as reticências depois do "P" no título da música); Speed Funk é uma instrumental na qual a porrada aqui é total e isso se pode ver o ritmo do som na levada do baixo de Formigão, os riffs de Rafael Crespo e a batida de Bacalhau e soa como uma jam improvisada até pelos acordes; o inglês aqui retorna em Muthafuckin' Racists (tradução livre: filhas da puta racistas) na qual Black Alien aqui faz uma canja especial soltando os cachorros contra as discriminações raciais; outro clássico da banda que aparece aqui é a clássica Dig Dig Dig (Hempa), que apesar de ter menos de dois minutos, ainda tem uma citação a clássica Zumbi, de Jorge Ben Jor, lançada antes em A Tábua de Esmeralda (1974) e ressurgida dois anos depois em África Brasil (1976); a homenagem ao primeiro parceiro de D2 acaba sendo uma música apenas instrumental chamada Skunk, com a base da banda fazendo uma coisa bem funk-rock com hardcore; pra seguir com a aventura chapante do grupo, o grupo aqui procede com as duras críticas sobre o consumo em A Culpa É De Quem?, na qual o grupo arma um debate tentando saber sobre quem culparmos sobre o consumo de maconha: o povo ou a sociedade; pra encerrar total, a banda encerra com Bala Perdida, aonde fala sobre a favela e sob os perigos sobre caminhar e se cruzar com uma bala perdida, o que já matou muita gente em favelas cariocas nos últimos anos, mas... o final mesmo fica depois de 02:32 e após um silêncio que soberana até os 8:31 quando só se pode ouvir a base da banda (Formigão, Rafael Crespo e Bacalhau) fazendo um sonzinho de leve nos últimos acordes que ainda se podem ouvir. E depois de duas décadas, o povo ainda segue gritando Legalize Já, Não Compre Plante!, Mantenha o Respeito e o som do Planet Hemp ainda segue Fazendo a Cabeça de muita gente que, sendo ou não usuário da Cannabis sativa, gosta e valoriza o que os caras fizeram há 20 anos, tendo assim levantado a moral para a carreira de Marcelo D2 e BNegão serem as mais bem-sucedidas do rap brasileiro.
Set do disco:
1 - Não Compre, Plante (Marcelo D2/Rafael Crespo)
2 - Porcos Fardados (Marcelo D2/Rafael Crespo)
3 - Legalize Já (Marcelo D2/Rafael Crespo)
4 - Deizdasseis (Marcelo D2/Black Alien)
5 - Phunky Buddha (Marcelo D2/Rafael Crespo)
6 - Maryjane (Marcelo D2/Rafael Crespo)
7 - Planet Hemp (Rafael Crespo)
8 - Fazendo a Cabeça (Marcelo D2/Rafael Crespo/Formigão/Bacalhau)
9 - Futuro do País (Marcelo D2/Rafael Crespo)
10 - Mantenha o Respeito (Marcelo D2/Rafael Crespo)
11 - P... Disfarçada (Marcelo D2/Rafael Crespo)
12 - Speed Funk (Rafael Crespo/Bacalhau/Speed Funk)
13 - Muthafuckin' Racists (Marcelo D2/Black Alien/Rafael Crespo)
14 - Dig Dig Dig (Hempa) (Marcelo D2/Rafael Crespo/Formigão/Bacalhau)
15 - Skunk (Rafael Crespo) 
16 - A Culpa É De Quem? (Marcelo D2/Rafael Crespo)
17 - Bala Perdida (Marcelo D2/Rafael Crespo/Formigão/BNegão)


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