Um disco indispensável: Os Mutantes - Os Mutantes (Polydor/CBD, 1968)
Contracapa do álbum de estreia, com ilustrações feitas pelos próprios integrantes e as suas assinaturas. |
Isso é bem notável pelos primeiros acordes de Panis Et Circenses, que soa bem psicodélico e conta com as influências da música Penny Lane dos Beatles, com uma história que trazia uma linguagem cinematográfica, falando sobre as pessoas na sala de jantar e no final, vidros quebrando e conversas aleatórias encerravam a mais psicodélica das canções brasileiras; a música seguinte, chamada A Minha Menina, composta pelo músico e compositor Jorge Ben trouxe um pouco a antecipação do samba-rock, samba-soul com Jorge arranhando as cordas do violão e Sérgio eletrificando o samba com a guitarra elétrica e tornou-se um clássico instantâneo da música popular brasileira, Jorge até regravou num medley do seu álbum intitulado 10 Anos Depois (1973) pela Philips, comemorando uma década de carreira e de gravadora; já em O Relógio, a voz doce da jovem Rita Lee e a melodia de uma canção delicada ao estilo pop francês (chanson), acaba se transformando em uma total viagem sonora e com uma parte bem mais pesada e elétrica; na sequência vem o Nordeste sendo representado em Adeus, Maria Fulô, clássico de Sivuca e imortalizado por Carmélia Alves e por Miriam Makeba, famosa naquela época devido ao seu hit Pata-Pata, uma espécie de reaproximação da música nordestina com o resto do Brasil e isso se deve também aos tropicalistas Gil e Caetano; enquanto Caetano seguia sendo regravado por vários artistas, como Claudette Soares e até por um jovem Billy Bond, argentino nascido na Itália, o trio também reinterpretava o velho baiano com a canção Baby, clássico que foi imortalizado por Gal Costa no disco Tropicália ou Panis Et Circensis e depois pelos Mutantes nessa versão, psicodélica e cheia de guitarras alucinantes; o doowop e o charleston, junto dos antigos standards do jazz formam a base principal para a canção Senhor F, cujo piano foi executado pela mãe de Sérgio e Arnaldo, dona Clarisse Leite, e cuja letra fala sobre as tecnologias de comunicação em massa, como a rádio e a televisão já estarem presente na maioria dos lares de classe média aqui no Brasil naqueles tempos, encerrando completamente o lado A do vinil, com sopros e risadas ao estilo mutante.
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O trio em Cannes (França) em janeiro de 1969, se preparando para a performance brasileira no famoso MIDEM, na qual cantaram a música "Caminhante Noturno" em inglês, |
O disco acabou sendo um dos mais influentes na Música Popular Brasileira e causando choque nos mais puristas da classe conservadora da MPB, ao verem que estavam eletrificando e estereofonizando o mais puro som feito no país, porém estavam querendo mudar a situação ao lado de Caetano Veloso, Gilberto Gil e Rogério Duprat (1932-2006), o eterno maestro tropicalista, além de ter sido 1968 o ano em que os Mutantes roubaram a cena não somente através deste disco, mas de sua presença em festivais (já falamos isso no post sobre o segundo álbum da banda, de 1969, leia aqui) e conseguirem ter reconhecimento mundial mais tarde graças aos seus mais famosos fãs, dentre eles o ex-Talking Heads, David Byrne, Sean Lennon (filho do eterno beatle John) e até de um ídolo da garotada de hoje e dos anos 90 chamado Kurt Cobain, que declarou ser muito fã da banda durante sua estadia por aqui no festival Hollywood Rock, um ano antes de sua morte. Mas aí, já é outra história pra contar! Vale lembrar de que este álbum é muito presente em listas importantes, só a recém-fechada filial brasileira da revista Rolling Stone colocou em 9° lugar na lista dos 100 Maiores Álbuns de Música Brasileira, enquanto a revista Al Borde destacou esse álbum nos 250 Mejores Álbumes del Rock Latino com a posição de número 21 e a Mojo colocou em 12° entre os 50 discos mais experimentais de sempre, à frente de nomes como Beatles, Pink Floyd e Frank Zappa - é mole? E tem mais: além de aparecer entre vários álbuns de 1968 na lista dos 1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer, é o disco brasileiro que nos enche de orgulho em uma lista de peso da Pitchfork dos 200 Melhores Discos dos Anos 1960, com o 51° lugar - resumindo, Os Mutantes são demais!
Set do disco:
1 - Panis et Circenses (Gilberto Gil/Caetano Veloso)
2 - A Minha Menina (Jorge Ben) - participação especial de Jorge Ben (violão)
3 - O Relógio (Rita Lee/Sérgio Dias/Arnaldo Baptista)
4 - Adeus, Maria Fulô (Humberto Teixeira/Sivuca)
5 - Baby (Caetano Veloso)
6 - Senhor F (Rita Lee/Sérgio Dias/Arnaldo Baptista) - participação de Clarisse Leite (piano)
7 - Bat-Macumba (Gilberto Gil)
8 - Le Premier Bonheur du Jour (Frank Gérald/Jean Renard)
9 - Trem-Fantasma (Caetano Veloso/Rita Lee/Sérgio Dias/Arnaldo Baptista)
10 - Tempo no Tempo (Once Was a Time I Thought) (John Philps/versão em português: Rita Lee/Sérgio Dias/Arnaldo Baptista)
11 - Ave Genghis Khan (Rita Lee/Sérgio Dias/Arnaldo Baptista)
Olá, gostei da resenha sobre este disco dos Mutantes, excelente. Muito bem explicado sobre a banda e as faixas. Abraços
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