Um disco indispensável: Coisa de Louco II - Graforréia Xilarmônica (Banguela Records/Warner Music, 1995)

Em tempos que bandas de rock como Engenheiros do Hawaii, Nenhum de Nós, De Falla, Os Replicantes, TNT e Cascavelletes dominam boa parte das rádios e conseguiam atravessar o Mampituba na década de 90, surgiam grupos bem preparados para o que passasse por eles, desde as rádios e a televisão até mesmo festivais da época, como o SuperDemo, o JuntaTribo, o M200 Summer Festival e os eternos Hollywood Rock e Monsters of Rock, que acabaram colocando esses grupos a um nível nacional de sucesso, como estavam os Engenheiros e o Nenhum de Nós, estourando um sucesso atrás do outro a cada disco e seguem sendo cultuados por quem sempre vai segur curtindo e compartilhando essa banda com gente que descobre velhas novidades. E uma dessas bandas que seguem sendo (re)descobertas é Graforréia Xilarmônica, banda surgida na cena roqueira de Porto Alegre no meio dos anos 80, formada por Frank Jorge no baixo e voz principal, Marcelo Birck na guitarra e o irmão Alexandre Birck na bateria e mais Carlo Pianta na guitarra, o último a entrar no grupo, sendo que o primeiro guitarrista foi Tasso Ferreira até a saída de Marcelo no início dos anos 90, quando formara o projeto paralelo Aristóteles de Ananias Junior e que Frank não tenha participado muito dos primeiros tempos da banda, mais pelo fato de estar fazendo parte dos Cascavelletes até 1988 do que pelos irmãos Birck mais Pianta seguirem com a banda até que Frank parte para o Graforréia de vez e começam a trabalhar no primeiro material da banda, que era nada menos que a demotape chamada Com Amor, Muito Carinho, na qual contou com temas que estariam nos próximos álbuns, e um deles é o álbum que estaremos falando, o clássico Coisa de Louco II, lançado em maio de 1995 pelo selo Banguela Records, um selo independente fundado pelo jornalista gaúcha Carlos Eduardo Miranda e pelo grupo Titãs, embora nunca tenham lançado álbum sequer pelo selo que eles fundaram.

A banda em 2005, da esquerda para a direita:
Frank Jorge, Carlo Pianta e Alexandre "Ograndi" Birck, a formação que
durou desde antes das gravações do "Coisa de Louco II" até 1997

O Banguela contava com grupos independentes que Miranda, enquanto jornalista e colaborador da revista BIZZ, descobria e colocava as indicações para o público, dentre elas os Raimundos, que acabaram ganhando popularidade nacional após as 100 mil cópias do primeiro álbum em 1994, ano que o Banguela ganhou vida e abriu portas para mais outro grupos, como os pernambucanos do Mundo Livre S.A (eles mesmo, começaram na Banguela), o Kleiderman, projeto paralelo dos titãs Branco Mello e Sérgio Britto, o pessoal do !Pravda, grupo de Brasília que estourou com o hit Sangue Bom em 1995, o pessoal do Maskavo Roots (que depois virou só Maskavo) e o Graforréia Xilarmônica, representando bem a cena gaúcha pela Banguela Records com o álbum Coisa de Louco II, gravado no final de 1994 e no início de 1995 com Miranda e o grupo no comando das mesas de som dos estúdios ACIT em Porto Alegre, capital gaúcha e lar da efervescência cultural no estado que rolava solta naqueles anos de pós-redemocratização, no Rio Grande do Sul e no Brasil. Enfim, o GX estaria ganhando sucesso de vez pelo Brasil quando no começo dos 90, a banda estava parada e Jorge, mais Marcelo e Alexandre chegaram a tocar como um trio, sem Carlo e logo Marcelo iria para o Aristóteles de Ananias Junior, projeto paralelo que estava preparando sua primeira demotape em 1993 e Carlo partiria de vez para o grupo e assim estava formado o trio que gravaria Coisa de Louco II, álbum clássico do rock gaúcho.
A banda, mais Marcelo Birck (de camisa azul e gravata) no Palco Butantã
da 2ª edição do Lollapalooza Brasil em 2013, na Chácara do Jockey (São Paulo)
O álbum trouxe ao público uma sonoridade que vai do rock sessentista dos Beatles, Rolling Stones, passando pela nossa Jovem Guarda e pelo brega e com ares cômicos nas canções, diferente do conjunto do momento Mamonas Assassinas, já com referências mais ao Sul e as expressões do momento, e algumas elaboradas pelo próprio grupo, como os "patês agasalhados" que colocaram o Graforréia como uma das bandas que influenciaram e muito o novo rock gaúcho e bandas como Bidê ou Balde e os punks do Tequila Baby. A faixa Literatura Brasileira inicia o álbum com uma pegada de forró com rock, com citações até mesmo a Dick Vigarista (????!!!!), personagem da Corrida Maluca, clássico desenho animado da Hanna-Barbera; seguido de Bagceiro Chinelão, já com um tom de sacanagem e crítica ao mesmo tempo, movido por um final na guitarra matador de Carlo Pianta; já a breguice psicodélica em Você Foi Embora cairia bem numa novela global, pelo fato de ter cara de hit, as desilusões amorosas foram bem retratadas pela voz de Frank Jorge e pela guitarra de Carlo Pianta, ambos autores da canção que teve um videoclipe muito exibido na MTV naquela época; já Tive Teu Nome leva uma nostalgia de romance e sarcasmo que segue soberanamente na música; a melodia inicial do clássico Ritmo da Chuva, de Demétrius, aparece aqui em formato de Grito de Tarzan, uma mistura do clássico de Edgar Rice Burroughs com uma levada de rock lenta dos anos 60; enquanto Frank sente saudades de um amor em Empregada, o amigo Wander Wildner a regrava mais tarde em sua estreia solista no álbum Baladas Sangrentas de 1997; o infantilismo em Minha Picardia é algo que a gente acha que é bem sem-graça, mas é o jeito Graforréia de fazer rock; e o tema Patê é uma sacanagem à parte com a garota trocar por uma mulher e não querer sentir agasalhada por um patê (o que é patê? é de comer ou de vestir, hein Frank?); o humor sarcástico em Twist, na qual a letra soa como se fosse dos anos 60 ainda num estilo dos grupos de 1962 a 1966 ou 67; o regionalismo entra com tudo em Amigo Punk, clássico da banda (e por que também não dizer do rock gaúcho?) composto por Frank Jorge e pelo Marcelo Birck vai soando como uma canção de atmosfera cinematográfica, e acaba sendo o sucesso destaque da banda; o romantismo ao estilo Jovem Guarda na canção Nunca Diga leva ao nível de dor-de-cotovelo, com direito a um piano melódico; já em Hare, uma brincadeira também com uma parte Happy Christmas (War is Over), de John Lennon, com direito a mais brincadeiras com as expressões hinduístas; logo em Dênis, o caso de desamor entre o personagem principal e a sua amada Inês, um amor que não aceitou beijar, um amor tipo incompreendido; já Benga Velha Companheira carrega a linguagem do GX ao mesmo nível de sarcasmo e referências ao rock dos 60 que segue nas canções; enquanto Se Arrependimento já segue a mesma linha de sempre, embora já seja outro possível hit, com solo de guitarra bem matador de Pianta numa levada quase samba-rock, com direito a citação de O Samba do Arnesto, de Adoniran Barbosa; o humor e a ironia continuam em Eu Digo Sete, na qual a história da Branca de Neve e dos Sete Anões ganha uma versão mais cômica e narrativa, além da ironia com a Bruxa Malvada querendo acabar com a sua vida, algo do tipo uma previsão; já os desamores em Se Você Não Quis ganham uma levada punk-rocker, mas ainda com referências a sonoridade sessentista; já o convite para um Rancho contou até com citações ao craque Bonamingo e a rainha dos baixinhos Xuxa, e os acordes finais já parecem encerrar de vez o disco.
O jornalista e atual jurado de programas do SBT, Carlos Eduardo Miranda,
criador/produtor do selo Banguela Records, que trouxe bandas como
!Pravda, Maskavo Roots, Raimundos, Little Quail and The Mad Birds e Graforréia Xilarmônica

O álbum hoje é raro consegui-lo no formato físico pelo fato de a gravadora se preocupar em lançar bandas interessantes e mais do que trabalharem nos lançamentos, devida a estrutura do Banguela (fechou logo no final de 1995) e por isso houve bandas que ficaram somente nas primeiras tiragens, e mesmo que tenha as prensagens originais e que esteja a um preço muito caro nos sebos virtuais, mas muitos fãs novos vêm descobrindo o Graforréia Xilarmônica pela internet e surgiram mais fãs ainda após ouvirem o trabalho solo de Frank Jorge ou após terem ido ao show do Graforréia Xilarmônica ao Lollapalooza Brasil em 2013, realizado em São Paulo no Jockey Club lotado iniciando o 2º dia do festival, que não fez feio e levou o Palco Butantã ao delírio. E depois desse show, quem viu o GX no Lolla já foi atrás da discografia, óbvio, para cairem de vez na onda irônica e jovem-guardista do grupo gaúcho, este que até hoje segue fazendo shows atravessando o Mampituba. Um detalhe a mais: segundo o músico e compositor da banda, Marcelo Birck Patê era apelido de um amigo comum entre o pessoal do grupo e tentando usar uma expressão em voga meio que sem sentido e daí veio o nome Patê, o Aero-Willys também é apelido deste mesmo amigo em comum dos integrantes. Coisas de louco mesmo.

Set do disco:
1 - Literatura Brasileira (Frank Jorge/Marcelo Birck)
2 - Bagaceiro Chinelão (Frank Jorge/Marcelo Birck)
3 - Você Foi Embora (Frank Jorge/Carlo Pianta)
4 - Tive Teu Nome (Frank Jorge)
5 - Grito de Tarzan (Frank Jorge/Marcelo Birck)
6 - Empregada (Frank Jorge)
7 - Minha Picardia (Frank Jorge/Marcelo Birck)
8 - Patê (Frank Jorge/Marcelo Birck)
9 - Twist (Marcelo Birck)
10 - Amigo Punk (Frank Jorge/Marcelo Birck)
11 - Nunca Diga (Frank Jorge)
12 - Hare (Frank Jorge/Marcelo Birck)
13 - Dênis (Frank Jorge/Marcelo Birck)
14 - Benga Velha Companheira (Frank Jorge/Leandro Blessmann)
15 - Se Arrependimento Matasse (Frank Jorge/Marcelo Birck)
16 - Eu Digo Sete (Frank Jorge/Marcelo Birck)
17 - Se Você Não Quis (Frank Jorge/Marcelo Birck)
18 - Rancho (Frank Jorge/Marcelo Birck)


Comentários

Mais vistos no blog