Um disco indispensável: Gil e Jorge - Ogum Xangô - Gilberto Gil e Jorge Ben, Philips/Phonogram, 1975

1ª capa, versão simples e curta
O ano era 1973 e o Palácio do Anhembi em São Paulo era o palco de um festival realizado pela Phonogram chamado Phono 73 onde artistas do elenco da gravadora mostravam para o público não para competir, mas para fazerem bonito. Artistas de todos os tipos, como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Jorge Ben, Chico Buarque, Maria Bethânia, Elis Regina, Gal Costa, Fagner, Toquinho e Vinícius, Odair José, Jards Macalé, Os Mutantes, Rita Lee & Lúcia Turnbull, Luiz Melodia... eram tantos artistas do cast, que só ficaram de fora do festival o eterno maestro Tom Jobim e o então maior vendedor de discos da gravadora Tim Maia, que não deu motivos para dizer porque não quis participar. Gil estava  pronto, mas para levar um susto da censura que estava perseguindo mais a Chico Buarque do que ele, que sofria por vetarem todas suas letras e Gil sofreu enquanto os dois cantavam Cálice e sempre mandavam abaixar o volume do microfone ou cortaram o som do Chico. Gil se segurou bem e se aprofundou com seu grande clássico "Meio de Campo" e em um dueto com Elis Regina em "Ladeira da Preguiça". O mais apoteótico momento foi no mesmo dia, 11 de maio de 1973, o mesmo dia em que Gil sofreu com Chico mas conseguiu se salvar com Elis, foi quando Gilberto Gil encerrou a noite ao lado de Jorge Ben tocando Jazz Potatoes e Filhos de Gandhi, cuja música inédita foi apresentada no festival. Dali foi selada uma parceria pós-Phono 73, que faria os dois entrarem em estúdio por volta de 1975 e saírem dali com um grande disco pronto: intitulado Gil e Jorge: Ogum Xangô, que é o disco que estamos falando nesta publicação. O disco foi gravado no início de 1975, quando após terem feito turnê juntos (Gil volta e meia fazia tour com Gal Costa e com Jorge Ben) e terem feitos bons discos naquela época: Gil gravou dois bem-sucedidos Ao Vivo (com apenas seis músicas (????!!!!) e outras cinco que ficaram de fora, só estariam no relançamento de 1998 para o box Ensaio Geral) e outro com Caetano e Gal chamado Temporada de Verão - Ao Vivo na Bahia que vendeu muito. Jorge acabou 1974 "sempre rindo e sempre cantando" como seu colega de álbum diria em uma certa música sua, pois o disco A Tábua de Esmeralda foi um sucesso nacional, botando este disco ao lado de outros na lista dos maiores álbuns da MPB. No início de 1975, após uma visita de Cat Stevens e Eric Clapton às terras tupiniquins oferecida por André Midani, então presidente da gravadora - e na qual "God" se impressionou com a habilidade de Jorge no violão, os dois foram para os estúdios da Phonogram, na Barra da Tijuca (Rio de Janeiro) acompanhados pelo baixista Wagner Dias e pelo lendário percussionista Djalma Corrêa e foi um dos álbuns duplos mais experimentalistas da MPB, começando pela duração das faixas, cujas quatro têm mais do que 10 minutos e algumas músicas inéditas. Começando por Meu Glorioso São Cristóvão, que falava do padroeiro dos motoristas e o foco é mais em Jesus Cristo (Meu glorioso mártir/Portador de Cristo/Intercedei por nós) e os timbres vocais de Gil e Jorge, seguido pelo revival de um clássico de Gil Nêga (Photograph Blues), lançado originalmente em 1971 no álbum que Gil gravou ainda no exílio em Londres, onde passou longos anos com Caetano Veloso e suas respectivas esposas Sandra Gil e Dedé Gadelha. Jorge também recupera pepitas interpretadas como Quem Mandou (Pé na Estrada), gravado pelo seu velho amigo e então colega de Philips/Phonogram Wilson Simonal, de quem já havia interpretado País Tropical, em 1973, mas antes desta música, vêm seguido de Jurubeba, que têm linhas de improviso incomparáveis na qual Gil e Jorge imitam anunciantes de rádio, como se estivessem incentivando a tomar um medicamento mágico. Os improvisos podem não ser movidos a quinze minutos de fama, mas Taj Mahal poderia até ter passado dos tais "15 minutos de fama", só que não chegou lá com seus quatorze minutos e cinquentas segundos. Assim como Taj Mahal, a música Morre o Burro, Fica o Homem veio do álbum Ben (1972) e ganharam versões bem extendidas e recheadas de swing e canto, com algumas alterações nas bases e alguns timbres acrescentados, numa levada bem forrozeira, totalmente nordestina. Gil apresenta Essa é Para Tocar no Rádio, que tinha sido feita para um álbum duplo abortado intitulado Cidade do Salvador (1973/1974), álbum que seria lançado só em 1998 e tem uma levada de samba, de bossa, de ritmos nordestinos e um pouco de música flamenca, mas a música encontraria enfim uma casa no disco Refazenda, lançada meses após o "Gil & Jorge: Ogum Xangô", mas gravada de forma diferente. O álbum mostra seus últimos suspiros com uma viajandona canção chamada Filhos de Gandhi, que tem uma versão diferente da que foi apresentada no Phono 73 e com uma letra mais parecida com o que Gil futuramente faria nas canções de seus discos, falando de orixás, de santos e até de entidades de umbanda e também falava de um grupo do qual Gil até hoje faz parte: dos Filhos de Gandhi, que está presente no carnaval da Bahia desde sempre. A vinheta Sarro não é o que não importa tanto, apesar de ser apenas regado apenas a improvisos vocais de Gil e Jorge, soa como o canto do cisne do disco marcando o fim do espetáculo.
2ª capa do disco, a versão dupla e extendida
Lembrando que há duas versões do disco: a que tem a capa dos dois no estúdio é vinil simples, cujas músicas (exceto Sarro) não passam de quatro minutos, e já a versão disco duplo é o disco que têm as músicas mais longas e as quatro músicas (Jurubeba, Taj Mahal, Filhos de Gandhi e Nêga (Photograph Blues) com mais de dez minutos de duração e as outras acima de seis minutos, o que não muda (preciso repetir de novo?!) é a vinheta Sarro. Após o disco, Jorge lançaria "Solta o Pavão" e mudaria sua forma de fazer música, apelando para um pouco mais de suingue e Gil começaria a "trilogia Re" com "Refazenda" e futuramente uma turnê com Caetano Veloso, Maria Bethânia e Gal Costa: quatro baianos unidos no show Doces Bárbaros.
Mas isso já é outra história!
Set do disco:
1 - Meu Glorioso São Cristóvão (Gilberto Gil/Jorge Ben)
2 - Nêga (Photograph Blues) (Gilberto Gil)
3 - Jurubeba (Gilberto Gil)
4 - Quem Mandou (Pé na Estrada) (Jorge Ben)
5 - Taj Mahal (Jorge Ben)
6 - Morre o Burro, Fica o Homem (Jorge Ben)
7 - Essa é Para Tocar no Rádio (Gilberto Gil)
8 - Filhos de Gandhi (Gilberto Gil/Jorge Ben)
9 - Sarro (Gilberto Gil/Jorge Ben)

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