Um disco indispensável: The Piper at Gates of Dawn - Pink Floyd (EMI/Columbia, 1967)

Em 1965 surgia na cena uma das bandas que agitaria de vez a cena roqueira nas terras de Londres e com uma proposta totalmente diferente, uma banda de rock que nasceu com variados nomes, dentre eles Sigma 6, Tea Set, The Megadeaths, The Architetural Abdabs, The Screaming Abdabs ou simplesmente The Abdabs e essa banda contava com o guitarrista e então estudante em um curso de Arquitetura na Cambridge George Roger Waters (nascido em Surrey no dia 6 de setembro de 1943) ou simplesmente Roger Waters, o baixista Clive Metcalf, o baterista Nicholas Berkeley Mason (nascido em Birmingham no dia 27 de janeiro de 1944) ou simplesmente Nick Mason, e o tecladista Richard William Wright (Londres, 28 de setembro de 1943 - 15 de setembro de 2008) mais os vocalistas Juliett Gale e Keith Noble, Gale se casou com Wright e abandonou o grupo, em seguida Noble e Metcalf deixam a banda na sequência. Para essas substituições instantâneas, procuram Bob Klose que ocupa o lugar de Waters na guitarra e este parte para o baixo, o outro guitarrista seria Roger Keith Barrett (Cambridge, 6 de janeiro de 1946 - 7 de julho de 2006) futuramente conhecido artisticamente como Syd Barrett, e novamente como Tea Set, a banda seguiria em frente - mas outras baixas aconteceriam no grupo. Primeiro, o novo vocalista Dennis foi chamado para o serviço militar britânico pela Royal Air Force e na seguida Klose abandonaria também o barco logo em seguida após ter gravado uma única demo junto deles, e para piorar, já existia uma outra banda também de nome Tea Set. Eis que a brilhante mente de Syd acaba tendo uma brilhante ideia que poucos teriam até então e traz para Mason, Wright e Waters o nome alternativo The Pink Floyd Sound, uma homenagem a dois nomes do blues, o primeiro seria Pink Anderson (1900-1974) e o outro seria Floyd Council (1911-1976), por um breve tempo usaram o Sound no nome até que eles seguissem usando o nome The Pink Floyd - como era creditado nos primeiros singles da banda. Logo após essa formação definitiva, o The Pink Floyd era conhecido na cena britânica e Barrett começava a escrever canções influenciado pela música psicodélica estadunidense e também pela inglesa, além da surf music, o som da banda tinha referências que iam do jazz ao experimental e isso acabava nos fazendo ir para outras galáxias, para outras atmosferas e o público que assistia seus recitais em lugares como o UFO Club e também no lendário Marquee, onde já se consagrou os Rolling Stones entre outras bandas. Isso acabou chamando a atenção de gente que se interessara pelo som e conseguiram de cara um contrato com a gravadora EMI Records ainda em fevereiro de 1967, gravando um compacto com a faixa Arnold Layne - que falava sobre um travesti cleptomaníaco, e assim, uma repercussão além da cena underground britânica que ajudaria em levar o grupo ao estrelato rapidamente.
O conjunto com Barrett (abaixo) em 1967
Mas, nem tudo são flores para uma banda que começava naqueles tempos. As gravações que foram de fevereiro a maio de 1967 tiveram passado por situações que envolviam o single de Arnold Layne, o total controle de Barret como frontman e seus problemas com drogas, que resultaram em uma montanha-russa de altos e baixos durante essa fase. Mas, apesar do clima tenso e dos shows que girava em torno da banda, o grupo conseguiu unir forças e com Norman Smith - engenheiro de som dos Beatles - como produtor, conseguiram fazer um disco que transbordasse essa magia psicodélica "alucicrazy" com Barrett trazendo visões doidas que caberiam no ambiente poético das canções que recheiam The Piper at Gates of Dawn - título originalmente extraído de um capítulo do livro O Vento Nos Salgueiros (The Wind in the Willows - título original), a estreia em disco do grupo, com a produção de Norman Smith, que trabalhava como engenheiro de som dos Beatles, que ajudou muito na concepção de som do álbum, lançado originalmente em 5 de agosto de 1967 fazendo a banda entrar definitivamente no mainstream. Para começarmos a falar deste clássico, vamos com a faixa de abertura, Astronomy Dominé, um exemplo de como a mente de Syd Barrett consegue transpirar pura lisergia musical, com uma energia delirante vinda da guitarra, um ritmo hipnotizante e que começa com o manager Peter Jenner fingindo-se de torre de comando de um controle espacial e começa a ler um livro de astronomia aberto em qualquer página - ou seja - como se fosse uma narrativa à la Jules Verne com tons futuristas que já nos mostram para que esses caras vieram de verdade; em seguida, temos Lucifer Sam que aparenta uma atmosfera sonora bem viajante, com um riff de guitarra incrível e o órgão de Wright emitindo acordes dissonantes com uma breve influência do rock praieiro estadunidense pelo que se pode notar a levada e nos levando a um imaginário através dos versos cantado por Syd; mais adiante, o grupo apresenta Matilda Mother, recheada de batidas delirantes à la Tomorrow Never Knows, e o baixo se mostra muito forte na canção, carregando uma energia delirante; na sequência, já em Flaming, o começo é bem escuro, mas acaba ganhando cores - em termos de letra e música, e se você não entndeu muito, lamento, mas você não sabe o que está perdendo dessa sonzeira; e por adiante, vamos, com Pow. R. Toc. H., uma espécie de viagem lisérgica para as selvas, na qual cada integrante imita um animal, com um teclado bem pegado ao jazz e uma batida marcante - a pulsação da batida nos deixa em sintonia com a natureza de forma alucinante e muito diferente, no bom sentido; para complementar, temos também um tema de Waters que fecha a primeira parte do disco, com Take Thy Stethoscope And Walk, com uma guitarra que parece ter tomado diversos ácidos e feito um som que impressiona a gente, com vozes dizendo "Doctor! Doctor!" como se fosse um grito de socorro; o lado B do álbum já começa com uma senhora viagem sonora deste disco, a mais longa faixa do disco, que é Interstellar Overdrive, composta pela banda, e que consegue ir próximo a uma linhagem do free jazz carregado de impressionantes versos e uma conexão forte de cada integrante no decorrer da canção com quase 10 minutos viajantes que se destacam no disco inteiro; enquanto na próxima faixa, que é The Gnome, a poesia lisérgica de Barrett ganha um forte destaque aqui e já não é coisinha fraca, para quem buscou diversas referências musicais dentro de uma banda à época, a base vibra e a voz de Syd deixa a gente impressionado; e existem grandes referências literárias nas canções da banda, uma delas é Chapter 24, inspirada basicamente no capítulo 24 do livro I-Ching, e aqui temos as vozes de Barrett e Waters parecem soar como se tivessem elevado o ponto mais alto do Nirvana, assim como o teclado de Wright, que soa como uma poesia para os ouvidos plenamente; mas, como ainda não estávamos no fim da jornada psicodélica que este disco nos oferece, ainda temos Scarecrow, que complementa o mesmo conceito, seja poético-sonoro ou apenas um dos dois, de The Gnome, e aqui trazem uma crítica sobre a visão autoritária dos pais em forma de um espantalho - algo que impressiona nossos ouvidos de cara; e, para fechar o disco, temos Bike, recheada de surrealismo musical que nos faz sentir o fim da viagem sonora que ainda dura para muitos fãs da banda e fãs de música, e que fecha com sons inventados em estúdio.
Para muitos, a jornada viajante do grupo não acabou, seus discos soam mais atuais do que nunca, apesar de Syd ter pulado fora após uma temporada de shows na qual já havia o guitarrista David Gilmour, que permaneceu na banda até o encerramento das atividades, em 1996. O disco obteve um legado enorme do próprio "Crazy Diamond", que chegou a reencontrar seus velhos integrantes oito anos depois de sua saída durante as sessões de Wish You Were Here (1975) e na qual ninguém o reconheceu no primeiro instante, embora já tinha gravado faixas para A Saucerful of Secrets (1968) e depois feito discos solos que mostravam seu estado extremo de alucinação. Barrett faleceu em junho de 2006, bem a tempo de ver seu disco com a antiga dupla aparecer em listas dedicadas aos anos 60 da Mojo, New Musical Express e também Rolling Stone - na qual aparece na 347ª posição dos 500 Maiores Álbuns de Todos os Tempos, a lista mais importante de todas, depois da famosa listinha dos 1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer, aonde também marca presença. Enfim, a viagem delirante de Barrett que fala por si só.
Set do disco:
1 - Astronomy Dominé (Syd Barrett)
2 - Lucifer Sam (Syd Barrett)
3 - Matilda Mother (Syd Barrett)
4 - Flaming (Syd Barrett)
5 - Pow R. Toc H. (Syd Barrett/Nick Mason/Roger Waters/Richard Wright)
6 - Take Up Thy Stethoscope and Walk (Roger Waters)
7 - Interstellar Overdrive (Syd Barrett/Nick Mason/Roger Waters/Richard Wright)
8 - The Gnome (Syd Barrett)
9 - Chapter 24 (Syd Barrett)
10 - The Scarecrow (Syd Barrett)
11 - Bike (Syd Barrett)


Comentários

Mais vistos no blog