Um disco indispensável: Splish Splash - Roberto Carlos (CBS Discos, 1963)

O mundo parecia que ainda não havia escutado com tanta vontade a voz do jovem capixaba Roberto Carlos Braga, nascido no dia 19 de abril de 1941 em Cachoeiro do Itapemirim, parece que nasceu com o dom divino da voz, uma voz que encantaria e segue encantando gerações até hoje. Aos seis anos, perdeu parte da perna direita em um acidente de trem - isso se deve ao fato de vermos sempre ele de calças. Mas isso não impediria o sonho do pequeno Zunga (apelido dele na infância) de poder cantar e encantar as multidões ao redor do mundo com sua preciosa voz cristalina e aos 9 anos ganhou seu primeiro concurso e isso o levou a cantar em programas de rádio ainda na sua querida Cachoeiro, e na juventude acompanharia mais de perto a era dos cantores de rádio que estava em voga e sem perder o primor. Em 1956, já no Rio de Janeiro, se junta a dois garotos mais o integrante principal: um gorducho simpático chamado Tião Marmita para participar de um conjunto que fazia um som considerado tendência na época: o rock and roll. E em 1957 estreiam como o conjunto musical The Sputiniks, porém todas as atenções estavam voltados na voz preciosa de Roberto enquanto Tião era um pouco chutado pra fora. Apesar disso, os dois seguiram amigos e anos depois Tião Marmita, recém-deportado de uma prisão nos EUA viraria Tim Maia e se tornava o pioneiro do soul no Brasil. Enquanto isso, o Roberto conseguia a grande chance - de gravar um compacto pelo selo Polydor, e com uma ajudinha de Carlos Imperial: seu primeiro grande empresário e investidor na sua carreira, queria que ele fosse visto como o próximo nome da bossa nova, porém nada adiantou com as faixas Fora do Tom e João e Maria, feitas com Imperial e que mostravam um timbre no estilo João Gilberto, nome em voga naqueles tempos. Porém, a investida foi pouca e Roberto foi até aos prédios da Columbia na Cidade Maravilhosa após ouvir o temido "não" de outras gravadoras, inclusive a RCA Victor. E, mais uma vez, viu seus compactos não deslancharem de vez, seguia vivendo de uns shows pra tentar uma divulgação e apesar disto tudo, os executivos ainda viam potencial em lançá-lo como um cantor de diversos gêneros, e em 1961 saía seu primeiro disco intitulado Louco Por Você, que tinha desde boleros até rocks - quase todos de Imperial, e que hoje é um disco renegado pelo próprio cantor pela forma como foi feita. Em 1962 gravara mais dois compactos e mesmo assim não havia grandes resultados que o colocassem em um patamar de cantores como Demétrius, Ronnie Cord, Wilson Miranda, Celly & Tony Campello, Sérgio Murillo - este que até então era o ícone máximo da juventude desde o final da década de 1950 até esse período, quando partira para uma carreira na América Latina inteira. E não é que 1963 foi o ano para Roberto, era só ele lançar um disco com novo parceiro que tudo mudaria de vez: um velho conhecido de Clube do Rock que sabia fazer versões de canções em inglês ofereceu uma de suas versões para ele gravar e em troca escreveriam um hit juntos. Este versionista era Erasmo Esteves, que adotou o sobrenome Carlos e se tornou o maior parceiro do Rei e o mais presente até hoje. Duas composições da dupla Erasmo & Roberto e uma adaptação do futuro Tremendão iriam compor a lista de faixas do segundo álbum que estampava o nome do cantor, mas também conhecido por Splish Splash - que aparece na capa junto de mais onze músicas e leva também esse nome por ser destacável em letras maiores, outro motivo essencial.
O disco era a chance do executivo e faz-tudo da gravadora, Evandro Ribeiro, de lançar um grande nome não só na boca da galera definitivamente após mais de dez compactos e um disco morno, eis aí que tudo começa a mudar de rumo literalmente, mas sim de lançar o maior nome da música brasileira e latina (imagina só). Com arranjos de Astor Silva, e a presença dos músicos do grupo Renato & Seus Blue Caps do qual Erasmo fez parte neste período, e que se lançaria tempos depois como artista individual. O álbum já abre com um estouro nos nossos ouvidos: sim, um estouro! Mas ruídos de carros que invadem os primeiros segundos do disco dando entrada para o sucesso Parei na Contramão, a história de um jovem apaixonado na estrada, que acaba levando multa de um guarda de trânsito após acabar tentar chamar a atenção pelo carro, numa levada bem twist que é feita pelo Blue Caps que o acompanham nesta maravilhosa canção; um coro puxa no início a marcha nupicial - assim inicia a faixa Quero Me Casar Contigo, uma doce e singela declaração amorosa do nosso Rei para sua futura noiva e perguntando a Deus o que será dele: mesmo soando bobinha demais, dá até pro gasto; a faixa traz um som de beijo e de cara temos o hit que Erasmo versionou de Bobby Darin, Splish Splash: mostrando que o Rei era um excelente cantor de rock e que tinha perfil para interpretar como um Elvis à brasileira, e Erasmo um letrista e tradutor que ganharia seu respeito pelo público; em seguida, outra música dá o clima romântico deste disco, com orquestra de cordas é Só Por Amor, uma belíssima e plena canção que transborda melodias típicas para as canções daquele tempo e não faz feio aqui no disco de jeito nenhum; e um dos temas que merece destaque aqui é Na Lua Não Há, escrita por Helena dos Santos, com um pouco mais de aceleração no ritmo, que lembra um pouco twist e rockabilly, a base acaba ganhando uma atenção enorme, a guitarra e o sax fazem uma perfeita união sem igual por aqui; o lado A deste disco fecha com uma bossa da dupla: É Preciso Ser Assim, que mantém a leveza e a batida - até reouvirmos e ver que parece uma bossa jovem, mais suingada, que dá totalmente pro gasto aqui; o disco já nos proporciona na segunda metade um melodramatismo poético-musical na faixa Onde Anda o Meu Grande Amor, com vocais líricos de fundo que complementam a base que lembra a de Só Por Amor ao ouvir de cara; já na faixa seguinte, uma pegada meio country elétrico acaba nos oferecendo Nunca Mais Te Deixarei serve como uma peça musical deste quebra-cabeça do disco sem muita firula - se é que me entende; na sequência, temos adiante um tema mais típico da época - em especial pelo título e pela composição, Professor de Amor é uma versão de I Gotta Know e RC dá a deixa "presta atenção, brotos" como se ele estivesse a lecionar sobre o amor (e isso ele é muito especialista no assunto); ainda temos outro tema que é quase despercebido, intitulada Baby, Meu Bem - não soa fraca, apesar de ter sido lado B de um compacto da faixa-título do disco, o arranjo é ótimo e não deixa a gente se estranhar muito; aqui no disco também temos lamento em tom gospel: é Oração de Um Triste, onde Roberto pede perdão a Deus por duvidar de sua existência, e não entende o porquê dele ser um homem tão triste - narativa religiosa que acaba mexendo com a gente de cara; e o final fica com Relembrando Malena, uma espécie de continuação da faixa lançada em compacto no ano de 1962, com tons românticos que mostram o Rei ainda no começo da expansão de seu sucesso, anos antes de estourar com o programa Jovem Guarda e enfeitar nossas noites de final de ano na televisão.
Set do disco:
01 - Parei Na Contramão (Roberto Carlos/Erasmo Carlos)
02 - Quero Me Casar Contigo (Carlos Alberto - Adilson Silva - Cláudio Moreno)
03 - Splish Splash (Bobby Darin, versão em português de Erasmo Carlos)
04 - Só Por Amor (Luiz Ayrão)
05 - Na Lua Não Há (Helena dos Santos)
06 - É Preciso Ser Assim (Roberto Carlos/Erasmo Carlos)
07 - Onde Anda o Meu Amor (Hélio Justo/Erly Muniz)
08 - Nunca Mais Te Deixarei (Paulo Roberto/Jovenil Santos)
09 - Professor De Amor (I Gotta Know) (Matt Wlliams/Paul Evans
, versão em português de Marcos Moran)
10 - Baby, Meu Bem (Hélio Justo - Tito Santos)
11 - Oração De Um Triste (José Messias)
12 - Relembrando Malena (Rossini Pinto)

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