Um disco indispensável: The Great Escape - Blur (Food Records/Parlophone, 1995)

Negar um pouquinho o fato de Blur ser até bem melhor que Oasis não é mole não, embora sempre existisse a rixa entre as duas bandas, e as comparações dos irmãos Gallagher, Noel e Liam com Damon Albarn, o principal gênio do Blur, são até ridículas demais, embora Albarn sempre esteja com mais projetos paralelos do que os dois irmãos (Gorillaz, The Good The Bad and the Queen etc.) e tendo um bom reconhecimento, às vezes dá para dizer que o Blur ganha de goleada nos álbuns. Eles estavam na crista da onda quando lançaram em 1993 o álbum Modern Life is Rubbish, considerado o grande divisor de águas na carreira de Damon Albarn (voz e guitarra), Graham Coxon (guitarras), Alex James (baixo) e Dave Rowntree (bateria) aonde iam da psicodelia ao grunge e louvavam os Kinks, banda cultuada de rock britânico liderada pelos irmãos Dave e Ray Davies - à época, nos últimos anos de atividade, mas também mostravam-se apegados às tendências do pop naquele momento. Demorou um pouco para que o Oasis chegasse ao cenário com Definitely Maybe, um álbum que alcançou o mainstream instantaneamente. E ali iniciava-se a tal rivalidade entre as duas bandas, que foi durando até o ano de 2000, quando o Blur lançou uma compilação com boa parte de seus grandes sucessos. Meses antes da estreia do Oasis, a turma de Albarn lançava um de seus melhores álbuns na carreira, intitulado Parklife, o terceiro e excelente trabalho da banda que ajudava muito a manter o reconhecimento da banda. E, sem esquecer o fato de tema que ajuda e muito nesse sucesso da banda foi Girls & Boys, bem dançante e que não media esforços para colocar eles no centro das atenções, afinal, o cenário britânico começava a se recriar naquela década. O grunge tinha atingido seu auge nos anos 90, bandas como Pearl Jam, Nirvana, Soundagrden, Alice in Chains dentre outras e Seattle era a nova capital do cenário roqueiro dos anos 90 - mas, com o suicídio inesperado de Kurt Cobain, o movimento morria ali, mesmo com diversas bandas se mantendo na ativa ,e, na época, Parklife havia sido editado em menos de 20 dias depois da morte de Cobain e as esperanças de algo novo no rock seguiam se renovando: é aí, meus caros leitores e minhas caras leitoras, que o britpop ajuda a avalancar conjuntos novos na terra da rainha e berço do futebol: claro, que, com essas duas bandas dando sopa (Blur e Oasis), os críticos americanos queriam descobrir mais novidades de lá, uma vez que Radiohead já tinha acontecido um ano antes com a música Creep e seu álbum Pablo Honey, e eles não seguiriam a mesma estética musical nos seus discos seguintes, fomos descobrindo também The Verve, Pulp, Supergrass entre outras, as minas (e o mano) do Elastica - mas o principal foco eram as duas principais representantes do britpop. Ao mesmo tempo em que levavam 4 estatuetas do Brit Awards com a consagração de Parklife - que venceu na categoria de melhor álbum e ainda levaram as categorias de melhor vídeo com a faixa-título, a mesma também por melhor single e o Blur eleito a melhor banda, é pedir muito? Comemorando a consagração, ainda puderam achar tempo entre janeiro a maio de 1995 para gravarem o seu quinto álbum ao lado do produtor Stephen Street em estúdios diferentes, primeiro em Fulham no lendário Maison Rouge e em Londres no Townhouse Studios, e, por pouco, ele chega a ser uma espécie de continuação do Parklife, pois, durante uma entrevista feita para a Radio 1 da BBC, Albarn declarou que chegaram a incluir Life no possível nome - Wifelife ou Darklife e até Nextlife chegaram a ser os tais títulos provisórios, mas nada ajudaram a agradar nesta ideia, até que chegaram ao nome definitivo de The Great Escape, editado em 11 de setembro de 1995 novamente pelo selo Food Records, com distribuição da Parlophone, e abrindo a disputa britpop do ano com o Oasis. 
Resumindo bem do que se trata The Great Escape antes que você aí leitor e leitora pense que estou apenas enrolando, este é um álbum conceitual, pois, se nós formos ler cada verso de dez das 15 faixas, suas letras ambientam solidão e indiferença, e o próprio Damon veio a revelar mais tarde que este álbum narrava um pouco de sua situação na época, e conseguiu retratar seus sentimentos nestas canções. Vamos começando a falar deste álbum por Stereotypes, que abre o disco, nada mal, uma melodia até boa por demais, e dá para entender que é uma história sobre uma certa mulher de meia-idade que por fora parece saudável, mas que esconde fantasias sexuais sobre trocas de esposas - em uma guitarra que carrega muito a levada do grunge ao ouvirmos; agora vamos à faixa que ajudou este disco a ser um grande sucesso e bateu de frente contra Roll With It, do Oasis - estou falando de Country House, na qual Albarn conta a história de David Balfe, fundador do selo Food Records do qual o Blur fazia parte, e incorporado à EMI Music após ele mesmo vender quando a banda emplacou Girls & Boys em 1994, trocou tudo por uma vida mais serena, rural - com uma levada de ska que parece influência de Specials e de Madness, um hit que já nasceu dando certo; em seguida, aparece uma música calma e de toques sofisticados, e Best Days parece ser algo bucólico pela sonoridade, mas aqui ela têm uma letra na qual fala sobre a melancolia da vida, o cinismo de muitas pessoas - basicamente uma confissão pessoal de Albarn como vamos ver em algumas músicas; mais adiante, o álbum ainda apresenta um tema que fez muito sucesso também, e Charmless Man não decepciona a gente na escuta, apesar de às vezes a gente não entender sobre quem seria - Brett Anderson, do Suede ou o próprio Morrisey - uma vez que este título nos remete a This Charming Man, do primeiro álbum dos Smiths (1984) - a sua antiga banda, o legal dessa música é a levada pop rock e os corinhos de "uuuu" ou "nanananana" que complementam a música e dão um toque especial, agradando a quem estiver ouvindo; agora a gente entende que a banda não quer nos decepcionar a gente, nem mesmo na próxima música, que é Fade Away, aonde ouvimos um início de toque bem pop, e depois migra para uma levada bem pesada de ska, dando pra ouvir até os metais a darem esse toque que lembre a sonoridade jamaicana, a letra tenta explicar a complicação da rotina de duas pessoas, uma vez que se entende o fato dos dois não amarem de verdade ao entendermos o significado - vale destacar aqui o trombone de J Neil Sidwell, que faz uns solos bem incríveis ao escutarmos; e ainda contamos com mais uma música que traz um pouco de bucolismo devido ao tom acústico com algumas guitarras elétricas é Top Man, que traz uma letra debochando os jovens descolados da classe média inglesa, o que faziam de costume muito nesta fase de Parklife e deste disco; mais adiante, um tema que nasceu ainda em Parklife como um ska, mas ganhou ares de um rock sinfônico, com influências de Burt Bacharach e possivelmente da música A Day in the Life dos próprios Beatles, esta é The Universal, com um arranjo totalmente belíssimo e bem no estilo Beatle, a letra é uma visão construída pela banda sobre o século XXI - este que nós estamos vivendo - de um futuro em que as pessoas usem uma droga universal para acharem que o mundo está completamente bem, e destaco muito o videoclipe da banda em que eles estão de branco no estilo Laranja Mecânica (1971) filme de Stanley Kubrick, com um monte de gente enquanto a banda toca e um monte de pessoas ao redor dos alto-falantes, algo bem conceitual o vídeo, um clássico da videografia dos anos 1990.
Seguindo aqui, ainda temos Mr. Robinson's Quango, mais outra letra em que Albarn, Coxon, James e Rowntree decidem satirizar os quangos (quasi-autonomous, non-governmental organisation - organização não-governamental quase autônoma) um órgão britânico que tem uma pequena quantidade de poder que é lhe devolvida pelo Parlamento - geralmente uma questão ou área específica, e tecnicamente os caras fornecem cargos para amigos ou doadores dos políticos - uma crítica necessária a estes tipos com uma sonoridade bem diferenciada, ora para um rock mais pesado, ora para algo de ska/reggae como estamos a ouvir nesta faixa que termina com um órgão que lembra música de circo ou parque de diversões de cara; e uma parte desse órgão vai até o começo de He Thought of Cars, que fala sobre solidão e isolamento em meio aos avanços científicos e tecnológicos na época, e ainda parece ser uma auto-confissão de Damon sobre uma crise e um jeito de sair dela, que por mais que dirija a qualquer lugar, ele nunca acha companhia e não importa sobre isso, o arranjo acaba ajudando muito aqui; em seguida, temos uma outra letra em que a banda acaba brincando poeticamente e musicalmente, esta que é It Could Be You fala sobre a sorte e a Loteria Nacional Britânica e satiriza essa vontade de muitos encontrarem a felicidade ganhando dinheiro fácil, algo muito concreto de explicar; na sequência temos aqui uma canção com ares de música clássica e vaudeville servindo como fundo para a história de Ernold Same, com apenas dois minutos aonde se fala da mundanidade da vida moderna, o título lembra muito Arnold Layne, o primeiro single do Pink Floyd e tem muita presença de orquestração de cordas e acordeon na parte musical; e já nas próximas faixas com uma coisa mais rock mesmo, totalmente noventista o estilo, a banda acaba por investir nessa pegada em Globe Alone, na qual fala sobre um cara que faz banalidades pelo simples fato de ter visto estas nas propagandas de TV fazendo o protagonista da história confundir desejos materiais e extremos de amor, e ele acaba negligenciando a construção de relacionamentos reais com os outros, visto como uma paranoia até; na sequência ainda temos também Dan Abnormal - na qual resume um pouco dos temas abordados no disco, pessoas normais, pessoas solitárias, conformidade e cultura e tratava um pouco no relacionamento de Damon Albarn sobre estes temas específicos, uma vez que Dan Abnormal era um anagrama do seu nome, e aqui a sonoridade caminha para algo bem pop rock ao escutarmos a base da música; mantendo essa essência pop das canções nos arranjos, ainda contamos no repertório do álbum com Entertain Me, cujo o refrão resume todos os temas questionados ao longo do disco, a banda decide colocar esse fato de que as pessoas satirizadas da música e do álbum não se importam com introspecção profunda ou apreciação de arte e que existem ali para comprarem, consumir coisas que não precisam muito, sem esquecer a explicação de que estas pessoas constantemente desejam atenção e exigem entretenimento - coisa que não mudou na sociedade de uns tempos pra cá e soa atual isto; no encerramento deste disco ainda temos também o tema que acaba tendo um pouco mais de elementos eletrônicos que ajudam a construir algo mais diferente apresentado em Yuko and Hiro, a história do modus operandi e do convívio de trabalho com um casal japonês, com direito a versos entoados no idioma nipônico por uma cantora, que ajuda a encerrar o álbum com uma sequência de acorde sintetizadores, e depois de alguns segundos, uma reprise instrumental de Ernold Same ajuda a terminar com um toque retrô, com aquele acordeon soando em poucos minutos.
Bom, nem é preciso explicar que, menos de um mês depois - no dia 2 de outubro, o Oasis acaba por lançar seu segundo trabalho, intitulado (What's The Story) Morning Glory? e a banda desfilou sucessos atrás de sucessos como Wonderwall, Don't Look Back in Anger, Champagne Supernova e Roll With It - o que já fez a banda conquistar mais fãs ao redor do mundo, e em 10 de agosto de 1996 a banda dos irmãos Gallagher lotou o parque de Knebworth em Stevenage, na Inglaterra, atingindo o status de maior show já feito pela banda ao longo da história. Enquanto o Blur, bem, o Blur não tinha muito do que reclamar em meio a toda aquela histeria promovida pela batalha do britpop, que na minha sincera opinião, os dois empataram, mesmo que o vencedor, o que levou a melhor foi o Oasis, até que o álbum ajudou e muito com que o Blur acabasse tomando rumos diferentes, assumindo uma sonoridade mais diferente nos seus próximos trabalhos, e isso se pode notar muito da música lo-fi e do rock alternativo no disco seguinte, intitulado Blur, editado em 1997, mas aí já é uma outra história. 
Set do disco: 
1 - Stereotypes (Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree)
2 - Country House (Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree)
3 - Best Days (Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree)
4 - Charmless Man (Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree)
5 - Fade Away (Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree)
6 - Top Man (Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree)
7 - The Universal (Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree)
8 - Mr. Robinson's Quango (Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree)
9 - He Thought of Cars (Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree)
10 - It Could Be You (Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree)
11 - Ernold Same (Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree)
12 - Globe Alone (Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree)
13 - Dan Abnormal (Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree)
14 - Entertain Me (Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree)
15 - Yuko and Hiro (Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree)
16* - Ernold Same - Reprise (Instrumental)(Damon Albarn/Alex James/Graham Coxon/Dave Rowntree) * faixa escondida

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