Pink Moon - Nick Drake (Island Records, 1972)

Tá bom, a gente já sabe muito bem que com o fim do sonho, da era flower power e do auge do movimento hippie, a contracultura ainda ditaria modas, porém, a geração que ficou no caminho teria que se readaptar. Com o final da década de 1960 e o início dos 1970, vimos perder muitos ídolos aclamados, alguns deles em seu gigantesco auge da carreira - basta lembrarmos de Brian Jones que havia sido posto pra fora dos Rolling Stones, banda que ele criou, e morto de forma até hoje cheia de teorias, aos 27 em 1969, e as tristes e abaláveis perdas de nomes e em 1970 perdemos num intervalo de um mês Alan Wilson da banda Canned Heat, Janis Joplin e Jimi Hendrix de formas trágicas. E no mesmo 1970, depois de discordâncias e problemas internos, logo após uma entrevista de Paul McCartney dizer que estava deixando os Beatles, a banda deixava de existir mesmo com um disco e filme prontos a serem lançados, cada um dos 4 integrantes decidia fazer suas vidas independente do que falassem sobre. Alguns rostos do final dos anos 60 começaram a ganhar um determinado culto, alguns deles ficaram conhecidos para sempre, outros já estavam trilhando seus caminhos de forma própria. Uma dessas figuras que transitou por esse período era um cantor de folk inglês chamado Nicholas Rodeney Drake, ou simplesmente Nick Drake. Filho de um engenheiro e de uma poetisa e dona de casa, Nick nasceu na Birmânia (atual Myanmar) e herdou da mãe o talento para a poesia e a música a ponto de aprender piano assim como sua irmã que também viria a ser conhecida no meio artístico, Gabrielle Drake se tornaria uma atriz conhecida nos anos 1960. Nick havia se mudado para a Inglaterra com a família aos quatro anos, já era um precoce na música, aprendendo a tocar piano, e na adolescência jogou rugby na escola, e ainda montou uma banda entre 1964 e 65 com o rock da época, no piano, uma vez que já estava se aprimorando também no saxofone. Logo, decide partir para cursar Literatura em Marseille (França) na Universidade de Aix, e logo descobre a maconha e o LSD a ponto de fazer uma viagem pelo Marrocos e em seguida opta deixar Marseilles e volta para a Inglaterra onde cursar Literatura Inglesa em Cambridge, uma das faculdades mais desejadas do mundo.
Em 1968 ele começava a ser notado no cenário, já que se apresentava em clubes e cafés em Londres e conheceria seu parceiro musical, um estudante chamado Robert Kirby, cursando música e com ele descobriu não somente o folk inglês, mas também por nomes como Bob Dylan que estava em ascensão ainda, Jackson C. Frank e Phil Ochs. Ao mesmo tempo, Drake, que estava aos poucos desinteressado da carreira universitária, e preferia ficar tocando violão e consumir maconha e LSD, acabou tendo a chance vista por outro músico, desta vez por Ashley Hutchings, da banda Fairport Convention que deu o toque sobre o rapaz do violão e da voz suave para o produtor Joe Boyd, e foi preciso esse o sinal para que os dois levassem Nick para a gravadora Island Records, selo de um jovem criado na Jamaica chamado Chris Blackwell que estava administrando o selo na Inglaterra onde nasceu e trazendo artistas como Traffic, King Crimson, Toots and The Maytals e Cat Stevens, ou seja: estava em boa companhia. Em 1969, com o acompanhamento instrumental do Fairport Convention, a orquestração feita por Kirby e a produção de Boyd, foi lançado seu primeiro LP intitulado Five Leaves Left, que mostrava uma voz intimista e letras melancólicas, cheias de narrativas tristes e amargas. A fórmula ainda se repetiria no álbum seguinte, Bryter Later (1970) e mesmo assim seus discos não vendiam o suficiente, não tinham nada de comercial que atraísse o público para a época, embora houvesse repercussão com um público determinado. Drake estava atormentado com seus fantasmas ao redor de si, parecia que nada estava do jeito que ele queria - era um artista difícil de conseguir fazer shows, e a Island Records já não botava mais confiança em um próximo disco dele, e ele estava indo a um psiquiatra que lhe prescrevera antidepressivos - e misturava com os consumos de maconha, que fumava regularmente. Nick parecia não se sentir bem, ainda estava se encontrando no caminho, seguia a recusar propostas de shows o que transformava ainda mais a sua imagem mística, e o caminho só foi se aprofundando quando decidiu gravar seu próximo LP mesmo que não estivesse nos planos da Island de forma clara, pois os dois álbuns não haviam tido o feedback que esperavam. Nas noites dos dias 30 e 31 de outubro (sábado e domingo) de 1971, entrou com seu violão no Sound Technique Studios em Londres onde o produtor John Wood ligou os gravadores e pilotou a mesa de som sem saber que estava produzindo o último trabalho de Drake em vida no qual somente ele canta e toca violão e piano. Após a finalização das sessões, as fitas foram entregues na recepção da gravadora, onde só foi notado na segunda-feira do dia 1º de novembro, pelos executivos da gravadora que não perceberam no começo que tinham uma obra-prima em mãos. 
Decididos a lançarem daquele jeito íntimo, cru e somente voz-e-violão - bem intimista por demais, puseram na praça por conta e risco o tal LP intitulado Pink Moon, editado em 25 de fevereiro de 1972 com uma capa pra lá de psicodélica onde havia uma lua que parece um queijo ou uma laranja (embora há cortes mostrando como se fosse queijo) mais um selo dos Estados Unidos com um foguete, uma xícara, uma folha, uma corda ou raiz da tal "lua" e uma espécie de dente com rosto, além de ser gatefold pois na contracapa aparece uma flor, um sapato e um bilhete - criação de Michael Trevithick, que ficou conhecido por fazer uma arte surrealista que Nick descobriu através da capa da banda Spooky Tooth que ele mesmo criou. O álbum já começa com uma música que carrega o peso de ser o carro-chefe, e estou falando justamente de Pink Moon - uma letra amarga, melancólica que expunha sua solidão de forma única - aqui, além da voz suave e do violão bem arranhado, ele manda ver no piano durante uma parte da música; em seguida, ele ainda oferece para a gente a puramente folky Place To Be que fala de um homem que olha para trás sua juventude e os dias do passado, sobre como a gente vai evoluindo com a mudança dos tempos e é onde Drake se confessa não se encontrava num lugar para existir de forma confortável ao seu ver, o violão se torna um destaque de primeira aqui com sua sequência afinada de melodias; adiante, o trovador amargo da lua rosa ainda traz para a gente Road que busca a metáfora de como ele observa a fama e se sente esquecido quando veem alguns se tornando estrelas (uma metáfora que fala tanto de virar um famoso quanto a de partir deste plano) e sobre não se sentir à vontade fazendo diversos shows ou entrevistas buscando assim seguir o seu próprio caminho de forma discreta, a voz baixinha deixa mais intimista a canção; na próxima canção, ele continua mantendo a fórmula sem adicionar outros instrumentos ao cantar em Which Will seus tormentos e se aprofunda não somente nos seus mais sombrios sentimentos, mas também nas situações difíceis quando percorre pela sociedade, o violão dá aquela atmosfera que lembra muito o country americano raiz e soa bonito de ouvir; fugindo da poética melancólica e cheia de narrativas que parecem ser correntes que Nick prefere arrastar junto, temos um instrumental que serve como um intervalo para sua voz - Horn parece soar como um lamento em que ele deixa claro que não está bem contente, o solo de violão faz ele mostrar que nada parece estar ótimo e deixa essa impressão para quem ouve - é a faixa mais curta do álbum, com apenas um minuto e 23 segundos de duração; o long-play prossegue com um repertório incrível e de primeira, sem muito brilho nas mensagens deixadas nas canções, é o caso de 
Things Behind the Sun mostra um relato como que autobiográfico de quando se busca a felicidade e sobre as coisas atrás do sol, e decide ser bem cauteloso que qualquer sabedoria adquirida deve ser mantida em segredo e a sonoridade fria da música permanece como no restante, apesar de aqui termos um violão mais rocker e numa faixa que dura quase 4 minutos de duração; a seguir, Drake ainda continua oferecendo canções que nos confundem e nos deixam sem entender de princípio, como no caso de Know onde ele parece abordar sua psíque perturbada tendo duas conotações positivas e duas negativas numa música curta com quatro frases e durando mais de 2 minutos com uma pegada pra lá de psicodélica no violão que faz a gente viajar; a próxima faixa do álbum também transita por esse clima psicodélico, doidão na sonoridade, mas sem fugir da sua narrativa triste e dolorosa - Parasite faz uma narração descritiva das atividades diárias do ponto de vista de um parasita com o qual se compara - somente rastejando pelo chão sem que ninguém o note, o violão lembra muito Bob Dylan dos primeiros anos quando ainda não assumira a guitarra elétrica e ainda consegue passar dos mais de 3 minutos de duração no álbum; sem muito enrolar, vamos a mais outra faixa que faz um bom trabalho neste repertório, que é Free Ride - baseado num conceito de falar sobre a necessidade supérflua e superficialidades espalhadas por todos os cantos e da necessidade de um artista simples como Drake implorar ajuda das pessoas bem mais afortunadas que ele em eventos cheios de luxo, apesar de se colocar em dúvida do ser desejado ou assistido mesmo que para ser superficial ou quiçá se exibir, o violão soa um pouco mais nervoso pelos acordes, como se soasse forte pra quem se acostuma com a suavidade; quem esperava que o disco não ia ter mais pérolas com seus lamentos depressivos, engane-se pois Nick ainda nos traz Harvest Breed usando nos versos a metáfora da impolinização das flores - de que um pólen entra na vida das flores e cria vida nova enquanto outro vai para o chão morrendo, é como na vida em que tentamos nos apegar ou acabamos no chão morrendo só, uma canção que lembra bem a vibe bossa nova na batida do violão com quase um minuto e 40 segundos de música - a segunda mais curta do álbum; para fecharmos de vez, o disco aqui encerra com um tema bem simples, mas que permanece com o jeito intimista - From The Morning busca falar que a vida soa como um jogo comparado com a verdadeira e desenfreada beleza natural, e temos de vez o seu último fio de voz antes de se calar de vez seguido dos últimos acordes de violão.
Logo após o lançamento de Pink Moon, cada dia mais ficou difícil procurar o músico para falar sobre gravar ou fazer shows, a presença de Nick Drake ficou mais restrita às pessoas íntimas e ele havia decidido sumir aos poucos, se reservando, há quem diga que aos poucos estava até tentando retomar à vida artística chegando a gravar uma demo com quatro músicas novas, até estava melhorando o seu humor, porém, no dia 25 de novembro de 1974, ele não acordou mais, havia acordado na madrugada para tomar medicamentos a fim de dormir melhor, mas partiu de forma precoce aos 26 anos. Sua obra começaria a ganhar um devido culto a partir do momento em que a Island decide relançar seus álbuns num box chamado Fruit Tree e aos poucos surgem entusiastas de sua obra que vão de Michael Stipe e Robert Smith ao galã de cinema Brad Pitt, ele mesmo. Esse tesouro do folk rock britânico acabou sendo uma prova de que o tempo estatria a favor de sua obra em todo, visto que nos anos 2000 ganhou posições importantes em listas como a da Rolling Stone dos 500 Maiores Álbuns de Todos os Tempos ostentando o 321º lugar em 2012 e nove anos depois ocupando o 201º lugar e também figurando a lista dos 1001 Álbuns Para Ouvir Antes de Morrer, fazendo com que não ficasse esquecido para sempre.
Set do disco:
1 - Pink Moon (Nick Drake)
2 - Place To Be (Nick Drake)
3 - Road (Nick Drake)
4 - Which Will (Nick Drake)
5 - Horn (Nick Drake)
6 - Things Behind the Sun (Nick Drake)
7 - Know (Nick Drake)
8 - Parasite (Nick Drake)
9 - Free Ride (Nick Drake)
10 - Harvest Breed (Nick Drake)
11 - From The Morning (Nick Drake)

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