Um disco indispensável: A Night at the Opera - Queen (EMI Music/Elektra Records, 1975)

Nunca foi muito difícil ter a sensação de poder ouvir um disco e se surpreender com tantos elementos misturados em um só material, agora imagine a sensação quando se ouve um álbum de rock dos anos 70 em que misturam não somente rock progressivo, hard rock, heavy metal, pop com music hall, ópera, vaudeville e coisas mais aproximadas do clássico? Imaginou? Agora, imagine que este álbum com tantos elementos, feito por quatro pessoas tenha se tornado um clássico e que estes quatro caras sejam membros de uma das bandas mais importantes do rock, e esta banda é o Queen! Sim, meus caros leitores, minhas caras leitoras deste blog que vocês tanto amam! O quarteto mais fodástico do rock and roll criou em 1975 um álbum que marcaria pra sempre a história da música e que soasse ousado, autêntico e marcante, aonde juntavam ópera com rock. Mas, vamos voltar no tempo, bem antes de acontecer este disco, quando eles tinham feito até então dois álbuns, em 1973 estreou com o Queen - de sucesso relativo, tendo algumas músicas relevantes na época, e no ano seguinte veio o Queen II, que apresentava alguns temas mais destacáveis como Father to Son, Seven Seas of Rhye e também The March of the Black Queen, que merece um valor enorme pelo seu arranjo, e isso é o resultado do espírito coletivo que rolava na banda: Brian May na guitarra, John Deacon no baixo, Roger Taylor na bateria e o irreverente e brilhante Freddie Mercury na voz e no piano lideravam junto a banda e faziam coisas incríveis: desde os próprios coros até o uso de outros instrumentos, exceção de sintetizadores. O grande boom mesmo na história da banda foi através do terceiro álbum, intitulado Sheer Heart Attack, editado 9 meses depois de Queen II, em novembro. E com este disco eles seguiram provando ser insuperáveis na arte de criarem peças sonoras dentro de suas canções, vale ouvir temas como Stone Cold Crazy ou o caso de Now I'm Here, também Killer Queen e Dear Friends, e esse disco quase não acontece devido à baixa de May, que estava doente  quando iniciaram as gravações deste álbum, e a banda só esperou ele se recuperar para que ele pudesse botar seus overdubs de vocais e de guitarra, e na época em que ele estava enfermo, ele sonhou com uma enchente devastando a Inglaterra, e o sonho virou uma realidade: foi apenas uma pequena enchente ocorrida em Londres, dezenas de pessoas perderam suas vidas e o tal sonho fez com que May compusesse People of the Earth, que seria utilizada no sucessor de Sheer Heart Attack, só que com um outro nome. Só que, a partir de 1975, os rumos que a banda teria em sua carreira seriam outros: primeiro o rompimento com o empresário Norman Sheffielfd e eles decidiram assumir as rédeas de seus trabalhos, o que rendeu a eles um excesso de liberdade maior, e a partir de agosto, eles iniciariam o processo de criação de um dos seus melhores álbuns já feitos e que marcou para sempre a história do rock and roll, estamos falando de A Night at the Opera, o quarto álbum e uma das magnus opum da música em geral. A partir de agosto, a banda iniciaria as gravações daquele álbum, cada um em estúdios separados, e depois terminariam o projeto todo no estúdio Rockfield na cidade de Monmouthsire, no País de Gales - embora tenham produzido materiais nos estúdios SARM Studios, os lendários Trident, Roundhouse e Olympic Studios mais Scorpio e Lansdowne, estes já tudo em Londres, e tudo com a ajuda de Roy Thomas Baker na coprodução, aliás, Baker trabalhava com a banda desde o primeiro álbum, a engenharia de gravação ficou por conta de Mike Stone e de Gary Lyons, o primeiro um outro cara que trabalhou muito com o Queen também desde o primeiro LP dos quatro. A capa e o restante da arte gráfica ficou por conta de David Costa, que colocou na capa o símbolo da banda: um Q em um raio de sol onde trazem os signos de cada membro: dois leões (John e Roger) representando o signo de Leão, as fadinhas são o signo de Virgem (Freddie) e o caranguejo em cima do Q da banda representa o signo de Câncer (Brian) e no topo uma ave, mais precisamente uma fênix - esse símbolo já foi reproduzido em um outro álbum mais adiante. Houve-se uma grande expectativa sobre este trabalho, já que o Queen planejava fazer algo mais brilhante e usar mais recursos do que nos álbuns anteriores, experimentando até outros instrumentos, como o banjo, o koto - instrumento de corda japonês, a harpa e o ukulele, além de acrescentarem diversas camadas vocais em várias faixas do disco.
Em 1975, o Queen dominava o mundo com sua
união de rock com ópera proporcionada
em "Bohemian Rhapsody" uma das melhores músicas
já feitas na história do rock
No começo do álbum, já ouvimos acordes de piano como se fossem parte de um tema clássico de Mozart ou até de Bach, mas chega a guitarra de May gritando e dando a deixa para Death on Two Legs (Dedicated to....) uma afronta de Mercury, que acabou deixando marcas entre a banda e os empresários e donos dos estúdios Trident, aonde eles gravaram seus primeiros trabalhos - os irmãos Norman e Barry Sheffield mais Jack Nelson, muito se especulou mais sobre Norman ser o motivo de Freddie descontar tanta raiva num tema tão pesado, chegou até a processar eles, mas não havia nenhuma comprovação e ficou por isso mesmo; na sequência surge um tema bem simples, com cara de canção dos anos 20/30 com uma atmosfera toda doce até vir um finalzinho mais pesado - esta é Lazing on a Sunday Afternoon, contando a história de alguém que conta o dia-a-dia, envolvendo trabalho, lua de mel até dizer que descansa no domingo de tarde, e dá a deixa para a próxima música, um hard rock bem porraloca, cantado pelo próprio Roger Taylor, chamada I'm in Love With My Car, tratando a história de um amor sobre quatro rodas e na qual ele dedica no encarte a canção para um dos roadies, Jonathan Harris, e o considerou corredor de carros até o fim, e a faixa termina com um ruído de carro em alta velocidade para complementar; já em diante, temos uma baladinha soft, de autoria de Deacon, mas cantada por Mercury e que teve êxito até, You're my Best Friend: uma declaração de amor do próprio Deacon para Veronica Tezlaff, sua esposa, e aqui o baixista toca um piano elétrico Wurlitzer, o que deixou Mercury p... da vida, o próprio cantor descreveu o piano como um instrumento horrível em uma entrevista; ainda podemos ter nesta obra de arte que é o disco, um skiffle com toques de ficção científica escrito e cantado por May, intitulada '39, contando a história de um grupo de exploradores espaciais que decidem fazer uma viagem de longos anos, e descobrem que já se passou um milênio, destaco aqui o violão suingado e a percussão marcada que fazem toda a diferença; em seguida, mais um rockão aqui pesado complementando o repertório, também de May - Sweet Lady, carregando um riff bem marcante para os fãs da banda, e não passa despercebido para nós; fechando o lado A deste álbum nós temos aqui a faixa Seaside Rendezvous, um tema bem fim do século XIX, um honky tonk com toques de cabaret e uma das poucas faixas da banda em que May não participa tocando, e aqui conta com instrumentos de sopro, em especial a tuba e um kazoo - muito usado em desenhos e filmes de comédia dos princípios do século XX, e apesar de ser bem um tema que pareça bobo, é divertido de se ouvir até; abrindo já o lado B do álbum temos a canção nascida originalmente como People of the Earth, nascida após May ter sonhado que uma grande enchente devastava a Inglaterra, aqui virou The Prophet's Song e seus oito minutos de duração onde ganha atmosferas sonoras que vão da psicodelia ao metal e traz mais de dois minutos e vinte segundos com Freddie Mercury dando um show à capella, e que show, leitores e leitoras, a partir de 3:23 até 5:50 é algo incrível, e no final May e Taylor também participam e depois volta aquele peso sonoro da banda com um solo de guitarra incrível tocado por May, sem sombra de dúvidas; já em diante, temos um grande tema de destaque e que marcou os diversos shows que a banda fez, aqui com um toque romântico mezzo clássico mezzo contemporâneo nos arranjos, que é Love of My Life, que apesar de parecer triste, foi feita como uma declaração de amor à sua então namorada Mary Austin, agradecendo ela por tudo, e mesmo depois de terem rompido o namoro, eles seguiram amigos até Freddie nos deixar em 1991, e a música nos shows - diferente da versão estúdio onde havia desde piano até guitarra e harpa orquestral tocada por Brian - o guitarrista no palco arranhava um violão de 12 cordas e Freddie deixava a plateia cantando nas apresentações, e esse típico momento marcou uma das apresentações da banda realizada quase dez anos depois no primeiro festival Rock in Rio em janeiro de 1985, no lento processo de renascer da democracia brasileira, com uma multidão cantando em uníssono no Rio de Janeiro, mas não vamos desconsiderar a versão estúdio como uma das coisas mais bonitas que o grupo já fez; recriando em suas canções sempre uma atmosfera mais antiga, May decidiu trazer uma pegada jazzística para sua Good Company, um tema que também soa bobinha, mas não perde sua essência e também dá realmente pro gasto, lembra um pouco as músicas feitas antes de 1950 quando ouvimos; na sequência temos o que realmente é considerado o ponto extremamente alto do disco, aonde Mercury comprovou que se podia misturar rock com ópera, só para se ter uma noção - os 180 overdubs vocais feitos pela banda para que soasse como um grande coral operístico foram feitos em 70 horas, e Mercury conseguiu revolucionar mesmo com Bohemian Rhapsody, que tem uma parte balada, seguida de ópera, depois migra para o rock e, por fim, volta ao que era antes, uma balada, e ganhou um clipe promocional (até então uma forma pouco utilizada) para divulgarem em diversos veículos televisivos do mundo - simplesmente um tema ousado, brilhante e original mesmo; e para terminar, temos uma adaptação roqueira e instrumental ao tema que nada mais é do que o hino nacional da Inglaterra, a própria God Save the Queen, uma digna homenagem à Família Real britânica, e esta versão foi reproduzida pelo próprio Brian no Jubileu de Ouro da Rainha Elizabeth no ano de 2002, dá para ser também uma música digna de encerrar o álbum.
Passados os anos, fica aqui uma explicação sincera sobre este álbum e sobre a revolução que impactou, de como a banda podia fazer de tudo dentro dos estúdios com as próprias mãos, um exemplo fictício do tipo botarem até uma torcida do Chelsea ou do Arsenal para fazerem um coro ou gravarem no meio do mato (imaginem só), que acabaria fazendo a cabeça de muita gente e se tornando um ponto de impacto enorme na carreira do grupo comprovando que podiam ir além com as ideias que captavam para seus sons. Figurando em diversas listas importantes, como por exemplo, a dos 1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer, aonde destacam boa parte do processo de criação de Bohemian Rhapsody, além de estampar diversas listas de álbuns dos anos 70, ela aparece na lista dos 500 Maiores Álbuns de Todos os Tempos, organizado pela Rolling Stone, na posição de número 231, enquanto a New Musical Express elegeu nos 100 Greatest Albums of All Time como o 19º melhor álbum, e que Deus siga salvando a nossa Queen suprema do rock and roll sempre.
Set do disco:
1 - Death on Two Legs (Dedicated to....) (Freddie Mercury)
2 - Lazing on a Sunday Afternoon (Freddie Mercury)
3 - I'm in Love With My Car (Roger Taylor)
4 - You're my Best Friend (John Deacon)
5 - '39 (Brian May)
6 - Sweet Lady (Brian May)
7 - Seaside Rendezvous (Freddie Mercury)
8 - The Prophet's Song (Brian May)
9 - Love of My Life(Freddie Mercury)
10 - Good Company (Brian May)
11 - Bohemian Rhapsody (Freddie Mercury)
12 - God Save the Queen (tema tradicional, adaptação e arranjo de Brian May)

Comentários

Mais vistos no blog