Um disco indispensável: Time Out - The Dave Brubeck Quartet (Columbia Records, 1959)

Água. Terra. Fogo. Ar. Este são quatro elementos que compõem a natureza da nossa Terra, quatro pilares que conseguem unir-se em um momento e captar uma energia que pode mudar o rumo às vezes. E por que não dizermos que na música? No caso do jazz, tudo é possível, e com o quarteto do pianista Dave Brubeck, que surgiu na década de 1940 como um trio, enquanto um jovem como ele servia o Exército e se encontrara com Paul Desmond, saxofonista e futuro parceiro musical ao longo da carreira, e na época lançara dois discos como trio ao lado de Cal Tjader pelo selo Fantasy Records, e assim Brubeck se tornaria um dos músicos mais importantes do jazz, junto de Monk, Miles, Coltrane dentre outros. No decorrer dos anos 1950, o grupo dele já foi octeto, tendo Cal Tjader e Desmond, William O. Smith, Dick Collins, Bull Ruther, Bob Bates dentre outros. Da Fantasy para a Columbia, o músico já trazia uma experiência enorme e seu nome era consagrado de vez no Olimpo da música jazz e discos como Jazz Goes to College (1954), Jazz: Red, Hot and Cool (1955) e Brubeck Plays Brubeck (1956) eram vistos como um novo jeito de fazer música e com seu quarteto transformando uma cozinha em uma excelente peça musical cheia de melodias e improvisos. Com várias mudanças de formação, embora estivessem ainda Desmond e o baterista Joe Morello, o músico seguia a transformar qualquer tipo de canção em obra de arte, e no caso de álbuns como Dave Digs Disney (1957) - o pianista e seu conjunto constroem belos arranjos em cima de temas feitos para filmes da Disney, e em seguida saíram lançando uma dobradinha de Jazz Impressions, o primeiro foi USA e na sequência foi o Eurasia, e a partir desses dois discos uma nova forma de impressionarem os ouvidos até dos mais puristas fãs de jazz. Sem deixarem o lado virtuoso e a essência, Dave e Desmond mais Morello e o baixista Eugene Wright acabaram trabalhando brevemente em um excelente disco, mas antes uma paradinha na Turquia aonde se impressionaram com os músicos de rua locais executando uma música tradicional do folclore turco em um tempo de 9/8 com subdivisões de 2+2+2+3, um ritmo muito raro de se usar na música do Oeste estadunidense. Para isso, o grupo teve de aceitar a condição de gravar temas do Sul norte-americano no começo e lançarem o disco, que saiu como Gone With the Wind (que leva o mesmo nome do filme E O Vento Levou, de 1937) para que, em seguida, o presidente Goddard Liberson, da Columbia Records, tivesse de liberar o aval para que eles pudessem entrar novamente nos estúdios da casa, em New York para poderem gravar aquele que seria o maior álbum de jazz já feito por eles, e um dos clássicos: logo estamos falando de Time Out, produzido por Teo Macero e considerado um dos trabalhos mais importantes do gênero lançado em 14 de dezembro de 1959, e sabe aqueles quatro elementos que falamos no começo? Então, cada um representa esses elementos da natureza:  Brubeck é Água - transborda pingos atrvés das melodias, Desmond é Fogo - seus solos de saxofone soam como labaredas, Wright é o Ar - que pode passar despercebido, mas traz uma pegada boa no baixo, e Morello é Terra - sua levada rítmica soam como se estivesse um terremoto, e quando esses quatro elementos se unem: se pode esperar de absolutamente tudo na música.
E para falarmos de Time Out, que apesar das críticas negativas à época de seu lançamento, tornara-se um exemplo de vendagens no jazz e tendo uma proposta que já está no título: sem muita pausa, as ideias sobre os compassos são muito exploradas a fundo no deste trabalho. O álbum inicia-se com Blue Rondo à la Turk, que abre o disco em um ritmo de compasso 9/8 - o ritmo da marcha turca ou o zeybek, o equivalente ao ritmo zeibekiko grego, e ainda se alterna com o compasso 4/4 do jazz tradicional e o título remete à marcha Rondo Alla Turca, derivada originalmente da Piano Sonata Nº 11, de Wolfgang Amadeus Mozart - agora entendemos a referência do título; na sequência, o quarteto nos apresenta Strange Meadow Lark, que entra com um solo de piano onde não se apresenta um compasso definido bem 4/4 e depois que o resto do quarteto surge para complementar a canção; a faixa seguinte que fecha o lado A seria um dos clássicos do disco e também o hit do conjunto: Take Five, que não é de Brubeck e sim de Desmond, aqui é o melhor conjunto de melodias instrumentais que foram feitas para o disco: a bateria de Joe Morello e seu solo maravilhoso serviu como um pontapé definitivo para o tema e se tornara um sucesso mundial de cara; o lado B do disco já nos oferece de cara Three to Get Ready, que inicia-se com um tempo de valsa, numa levada de 4/4 que se alterna em certos momentos da música e que apesar dos momentos de improvisação, a mesma ainda segue; já na próxima faixa, intitulada Kathy's Waltz, que traz uma excelente levada do baixo de Wright e a polirritmia são essenciais para os ouvidos que manjam do bom e velho jazz movido a improvisações e muita virtuosidade; com a próxima faixa, Everybody's Jumpin', sentimos ainda mais esse gosto do quarteto fazendo um jazz de qualidade, com uma rítmica indefinida numa marcação que soa como um 6/4, totalmente isso; e o disco fecha com Pick Up Sticks, que mostrava a banda indo além e mantendo essa coisa de ir além do 4/4, e num tom de seis templos simples, esencial para os músicos de jazz. Tendo uma grande influência na música, o disco conseguiu não só sair da cadência melódica tradicional, conseguiu incorporar elementos da música oriental e fez com que vários músicos buscassem uma forma de unir elementos sonoros e até na capa, feita por Neil Fujita (1921-2010) pioneiro em levar o conceito de arte gráfica do disco mais a sério e com uma boa forma de chamar a atenção de quem compra, por isso que álbuns de jazz começaram a ganhar atenção pelo seu conteúdo, e esta levou a melhor em uma escolha feita pela revista BIZZ em 2005 na lista das 100 Maiores Capas de Álbuns de Todos os Tempos, levando o 22º lugar, e a famosinha lista dos 1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer, organizada por Robert Dimery, traz esse disco entre outros tantos. É o mais onipresente nas listas dos melhores álbuns de jazz e não há como negar a importância de Time Out dentro do circuito musical contemporâneo e um marco dentro do gênero, onde enfim, se pôde notar que o jazz era muito mais do que conjuntos de melodias tocadas em compassos de 4/4 e com uma linguagem verdadeiramente universal que segue influenciando músicos ao redor do mundo. 
Set do disco: 
1 - Blue Rondo à la Turk (Dave Brubeck)
2 - Strange Meadow Lark (Dave Brubeck)
3 - Take Five (Paul Desmond)
4 - Three to Get Ready (Dave Brubeck)
5 - Kathy's Waltz (Dave Brubeck)
6 - Everybody's Jumpin' (Dave Brubeck)
7 - Pick Up Sticks (Dave Brubeck)

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