Um disco indispensável: Songs for Swingin' Lovers - Frank Sinatra (Capitol Records, 1956)

Os anos 1950 começaram muito mal para o nosso queridíssimo Frank Sinatra, que, surgido em meados dos anos 1930 na orquestra de Harry James e depois entrando em carreira solo, tornando-se popular mesmo a partir de 1942 - quando torna-se artista individual definitivo e um dos grandes nomes do cast da Columbia Records, e logo de cara um fenômeno mundial assim como Bing Crosby, inspirando diversos cantores mundo afora e vendendo disco feito água. Mesmo com tanta coisa importante,a carreira dele vinha colhendo diversos frutos até no cinema, mas seu casamento com Nancy Barbatos - mãe dos 3 filhos que ele teve - estava em uma crise,o que levou à separação e já em um romance com Ava Gardner, mas o auge como cantor na Columbia havia acabado, o jazz começaria a tomar outros rumos - os anos 40 já tinham terminado, o mundo não precisaria mais sentir o temor de uma nova ameaça que pretendia com a ambição de um líder de Estado supremo, a tecnologia sofria avanços tão rápidos e inovadores, mesmo que com passos tímidos. O medo de uma volta do nazismo e do fascismo já passara, mesmo que a II Guerra Mundial acabara mesmo com a explosão das bombas atômicas no Japão, mais precisamente nas cidades de Hiroshima e Nagazaki, e fora que Hitler e Mussolini haviam morrido para o bem do mundo. O mundo da música também começara a sofrer mudanças, os compactos de 78rpm já deixariam de se destacar, e os long-plays (LPs) com rotação de 33rpm começariam a unir todas as canções feitas em dias e/ou meses num registro só - o country mantinha-se fiel ao público das regiões do Tennessee e do Sul dos EUA, o blues e o jazz consolidavam nomes como Billie Holiday, Nat King Cole, Nina Simone, Etta James, Mel Tormé, Dean Martin - amigo de Sinatra e membro do chamado Rat Pack. O começo de uma nova reviravolta na carreira do Ol' Blue Eyes começa em 1953 quando, após participar do filme A Um Passo da Eternidade (From Here to Eternity - título original) na qual contou com a presença do arranjador e futuro parceiro de trabalhos musicais Nelson Riddle (1921-1985) presente a partir desta nova fase ao ser contratado pela Capitol Records, gravadora onde lança seus melhores trabalhos. Com o álbum Song for Young Lovers, ele volta às paradas e mantêm-se em seu status que sempre teve, emplacando diversas canções e vendendo feito água. Mas, em 1955, enquanto lançava seu LP de grande consagração total como cantor In The Wee Small Hours, a sua célebre magnum opus que definiria a estética de um disco conceitual, ele via seu reinado ameaçado por um gênero e por diversos nomes: o rock and roll, ou simplesmente o rock, que com suas guitarras elétricas agitadas e seu ritmo tão frenético quanto as canções de jazz embalantes como os de swing, tinham uma linha de frente pra botar respeito: Fats Domino, Chuck Berry, os Comets liderados pelo Bill Haley, Little Richard, Jerry Lee Lewis, Buddy Holly e um jovem rapaz nascido em Tupelo no Mississippi visto como um branco com a voz de negro, Elvis Presley - o responsável (ou irresponsável?) por querer tentar destronar Sinatra e seu reinado soberano. Mas, mesmo assim, o Rei do Rock não seria uma pedra no caminho - mas sim, um contraponto marcado pela rebeldia e pela forma de se libertar de um comportamento muito comum até o fim da primeira metade do século XX, e não vamos esquecer do principal ícone desta fase - James Dean, que morre em julho de 1955 antes de ver uma de suas últimas produções ganhar corpo, Juventude Transviada (Rebel Without a Cause - título original) mantê-lo para sempre imortalizado nas telas do cinema.
Com a orquestra sob a regência de Riddle e a produção do brilhante Voyle Gilmore, e tendo como QG das gravações os estúdios da Capitol de outubro de 1955 a janeiro de 1956, o seu próximo disco era tão esperado quanto uma novidade sobre as últimas da Manchete ou dO Cruzeiro, e foi no dia 5 de março era lançado seu 10º álbum intitulado Songs For Swingin' Lovers! e acabou sendo um excelente presente atrasado para os casais no dia de São Valentim/Dia dos Namorados (14 de fevereiro). O repertório do álbum é um banquete cheio para uma incrível degustação sonora, e isso é comprovado através da faixa que abre de cara este disco You Make Me Feel So Young, a orquestra soa totalmente afinada e a voz de Sinatra pleníssima e sofisticada, obrigado, falando sobre alguém que o faz se sentir rejuvenescido como se fossem um par de tudo; a próxima faixa é sobre uma história de amor em um lugar do México, e It Hapened in Monterey consegue manter o equilíbrio canções brilhantes + arranjos fascinantes, a aventura mexicana de quem encontrou uma mulher que partira o coração de alguém e Sinatra temia dele ser o próximo, se tivesse um arranjo diferente, a rancheira melódica caberia bem com esta canção com um perfeito acompanhamento de mariachi - o que seria uma BOA ideia; com a pretensão de agradar gregos e troianos, ocidentais e orientais, Sinatra ainda apresenta neste LP a faixa You're Getting To Be a Habit With Me não é só uma canção qualquer, é um hino e um hino de responsa e os metais aqui dão um toque na canção sobre alguém viciado por cada beijo, abraço que faz se viciar pela amada, de uma forma rotineira; seguindo o baile, ainda contamos com You Brought a New Kind of Love to Me - que fala no começo que se os rouxinois cantassem como a pessoa amada, eles cantariam mais doces que eles podiam fazer, e ainda se vê como um escravo desta amada que trouxe um novo tipo de amor a ele; em seguida, ele faz uma espécie de confissão sobre ser muito maravilhoso para palavras, isto é Too Marvelous for Words - criação de Richard Armstrong Whiting com letra de Johnny Mercer, co-fundador da Capitol Records, para o filme Ready, Willing and Able (1937) e aparece no momento em que Ruby Keeler, Lee Dixon e um grupo de moças dançam sobre um aparelho de escrever gigante - com a versão de Sinatra, o arranjo mantêm-se fiel ao estilo dos anos 30, e Riddle consegue fazer mágicas com a orquestra; mostrando mais uma vez que seu repertório está sempre afinado, Sinatra ainda apresenta várias cartas na manga, uma delas é a próxima canção Old Devil Moon, outra brilhante criação para musicais dos anos 40, esta foi para o de 1947 Finian's Rainbow, e aqui a passagem de flautas e harpa soa como o nascer de um dia novo, mas fala de alguém que ao olhar para sua amada, logo sente a tal velha maldita Lua nos seus olhos; a seguir, o velho dos olhos azuis ainda nos proporciona momentos reflexivos e nos deixa a encantar com a metáfora comparativa das chuvas com os maus momentos e contratempos em Pennies From Heaven, mas ao invés de ficar de mau humor, ele incentiva a olhar para o lado positivo da questão e retrata nossas falhas como presentes instrucionais, necessário para aprender caminho para o sucesso, a canção de 1936 ainda conserva seu primor com a orquestra dando cor a esta versão; sem perdermos o rumo, ele ainda nos oferece Love Is Here to Stay uma das célebres criações dos irmãos Gershwin, e ele não desafina nessa interpretação soberba; mas, o grande destaque no repertório deste trabalho é a faixa que vêm a seguir - do genialíssimo Cole Porter (1891-1964) surge I've Got You Under My Skin, aquela que se tornaria uma das melhores interpretações da carreira dele, e, Riddle teria criado o arranjo com influência do célebre Bolero de Ravel - o que é bem notável na primeira audição desta versão imortalizada por ele; mais adiante, o repertório mantém a fineza e o primor deste songbook em forma de disco é I Thought About You, que não entrega pro alto e aqui ele fala que por onde ele estiver, sempre pensa sobre alguém que ele ama muito - é uma das tantas canções de Mercer, seu então patrão (aqui com Jimmy Van Heusen) que ele interpreta; continuando, ainda temos muito a desfrutar de sua voz neste LP através de mais belas obras do cancioneiro americano, We'll Be Together Again trata sobre a distância que separa dois amantes e o eu-lírico trata de dizer que ainda se encontrarão outra vez, Riddle mantêm o toque de Midas na orquestração; sem perder o brilho e o primor, Sinatra emposta na sua voz o primor de Makin' Whoopee, conhecida por ter sido criada para o espetáculo da Broadway de 1928 Whoopee!, e constrói uma atmosfera alegre e que remete muito à América pré-crise de 29, e fala sobre as coisas que ele sente que alguém precisa ter para fazer diversão (ou folia); mais adiante, temos aqui uma das composições mais antigas do repertório deste LP é Swingin' Down The Lane, criação de Isham Jones e Gus Kahn, carrega a beleza sonora vinda de 1923 revivida em pleno 1956 onde o eu-lírico se sente falta da felicidade quando estava com a amada e olhando os casais dançando na pista, e com uma sensação de melancolia profunda que podemos notar; não fazendo feio até aqui, ele ainda põe do cancioneiro célebre do American Songbook outra das mais conhecidas criações de Porter, desta vez é Anything Goes que fora feita para o musical homônimo de 1934 com uma sátira envolvendo o mundo da fofoca e escândalo da alta sociedade na época da Grande Depressão, e aqui vai mais outra prova de que a união Sinatra & Riddle funcionou muito bem em muitos trabalhos feito juntos; encerrando com chave de ouro, temos aqui uma pepita preciosa que soa como o crepúsculo do disco, How About You? fala com primor sobre os gostos do eu-lírico e pergunta se a pessoa amada a quem deseja ser correspondido gosta também, com um piano que ainda ajuda a dar um brilho a mais, e A Voz ainda mostra soberanamente porque foi considerado um dos maiores intérpretes do século XX, a orquestra então, novamente fazendo um belíssimo trabalho de acompanhamento musical dele.
Esse disco mostrou que, assim como uma goiabeira no meio do campo, Sinatra pode colher os frutos da goiaba e fazer destes uns bons doces de goiabada, suco, até licor... resumindo: de cada clássico do American Songbook extraído para formar o repertório deste disco, conseguiu um resultado agradável que fez novamente o manter no topo das paradas e entre os artistas mais vendidos daquele 1956. No ano seguinte, manteria a fórmula que o consolidou dentro da Capitol: arranjos espetaculares de Riddle com o pessoal da Hollywood String Quartet nas cordas e com Voyle Gilmore na produção do décimo-primeiro LP intitulado Close to You, mas aí já é uma outra história. O culto em torno desta obra deve-se ao jeito como Sinatra trata criações de Mercer, Porter, Gershwin dentre outros com tamanho respeito e primor como é visto a sua voz, e isto rendeu destaques honoráveis em listas como a da revista Rolling Stone, que deu o 306° lugar na nossa velha conhecida lista dos 500 Maiores Álbuns de Todos os Tempos, além de estar na outra famosinha deste blog 1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer, os amantes do swing e da voz de Sinatra garantem: cada gravação dele é como um vinho, quanto mais duradouras, melhor, e Songs For Swingin' Lovers! é uma prova disto.
Set do disco:
1 - You Make Me Feel So Young (Josef Myrow/Mack Gordon)
2 -  It Hapened in Monterey (Mabel Wayne/Billy Rose)
3 - You're Getting To Be a Habit With Me (Harry Warren/Al Dublin)
4 - You Brought a New Kind of Love to Me (Sammy Fain/Irving Kahal/Pierre Norman)
5 - Too Marvelous for Words (Richard Armstrong Whiting/Johnny Mercer)
6 - Old Devil Moon (Burton Lane/Edgar Yipsel Harburg)
7 - Pennies From Heaven (Arthur Johnson/Johnny Burke)
8 - Love Is Here to Stay (George Gershwin/Ira Gershwin)
9 - I've Got You Under My Skin (Cole Porter)
10 - I Thought About You (Jimmy Van Heusen/Johnny Mercer)
11 - We'll Be Together Again (Carl T. Fisher/Frankie Laine)
12 - Makin' Whoopee(Walter Donaldson/Gus Kahn)
13 - Swingin' Down The Lane (Isham Jones/Gus Kahn)
14 - Anything Goes (Cole Porter)
15 - How About You? (Burton Lane/Ralph Freed)

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